Considerados baratos, palatáveis e práticos, os alimentos ultraprocessados logo ocuparam espaço na despensa das famílias. Mesmo já cientificamente classificados como perigosos para a saúde, relacionados com a obesidade, doenças cardiovasculares e alguns tipos de câncer, eles continuam sendo o centro da dieta de muitas pessoas. Uma prova disso é uma recente pesquisa que indicou que os ultraprocessados representam quase metade das compras dos brasileiros em supermercados.
O levantamento foi feito pela empresa Rock Encantech, especializada em ciência do consumo e comportamento de clientes no varejo, que avaliou 770 milhões de transações e 44 milhões de domicílios em todo o país durante o primeiro semestre deste ano. Dos 25 produtos mais consumidos no período, 48% eram dessa categoria, caso dos biscoitos industrializados, refresco em pó, macarrão instantâneo, pães industrializados, suco de caixinha e salgadinhos.
“Esse dado reflete um conjunto de fatores que vão além da simples preferência alimentar. Os ultraprocessados são mais baratos, têm longa validade e são encontrados em todos os supermercados, assim, são mais acessíveis que os alimentos in natura“, explica Danielle Toledo, curadora e responsável pela área de nutrição da plataforma de saúde Conexa. “Além disso, são formulados para serem viciantes, práticos, algo que se encaixa perfeitamente no ritmo de vida que as pessoas estão vivendo. As frutas, verduras e proteínas magras exigem mais tempo de preparo. São barreiras econômicas, sociais e culturais”, completa.
Segundo Danielle, arroz e feijão, por exemplo, estão perdendo espaço no dia a dia dos brasileiros e isso é um problema, considerando que eles fornecem nutrientes essenciais.
“O impacto é grande tanto na saúde quanto na cultura alimentar do nosso país, por isso, é fundamental termos políticas públicas que retomem esse padrão alimentar com subsídios, incentivo à produção local e educação.”
A análise comparou ainda a variação de preço desses produtos em relação ao primeiro semestre de 2024 e comparou aos valores de alimentos saudáveis, mostrando que, mesmo com alta, eles continuam dominando os carrinhos. Foi registrado aumento no preço de salgadinhos (+18,3%), macarrão instantâneo (+8,3%), biscoitos industrializados (+6,5%) e refrescos em pó (+5,2%), e queda em itens como feijão (-20,9%), arroz (-14,8%) e frutas, legumes e verduras (-12,5%).
Mais cerveja do que leite
O levantamento acabou mostrando não só que os ultraprocessados andam tomando muito espaço na dieta dos brasileiros, mas que escolhas pouco saudáveis se destacam em relação a itens básicos. Um exemplo que chamou atenção foi o fato de que consumidor prioriza a cerveja ao leite. A questão aqui é que, em termos de saúde, há um consenso de que não existe dose segura de consumo de bebidas alcoólicas e o hábito está ligado a doenças, acidentes e situações de risco, como sexo sem camisinha e episódios de violência.
“A cerveja e os produtos ultraprocessados exploram gatilhos sensoriais e emocionais muito fortes enquanto os alimentos saudáveis dependem unicamente de uma decisão racional. A cerveja é fortemente associada a lazer, eventos e status social enquanto o leite é visto como um produto cotidiano e tem pouco apelo emocional. O investimento que a indústria da cerveja para criar esse espectro de relevância social é infinitamente maior”, avalia Fernando Gibotti, vice-presidente de Varejo e Indústria da Rock Encantech.
Ele explica que, de forma geral, o consumidor prioriza o lazer e a conveniência em momentos de decisão rápida e as lojas acabam entregando isso na disposição dos produtos, optando por colocar os mais atraentes à mostra. Segundo Gibotti, apesar disso, há um movimento de dar mais destaque a produtos saudáveis, inclusive com estratégias de disposição e iluminação, como ocorre com frutas, legumes e verduras, que já têm um apelo visual natural por suas formas e cores.
Riscos dos ultraprocessados para a saúde
Os alimentos ultraprocessados oferecem risco à saúde por serem ricos em aditivos artificiais e componentes que estão relacionados a problemas como hipertensão, diabetes tipo 2 e obesidade, caso do sódio, açúcares adicionados e gorduras.
Há uma vasta literatura científica que aponta os impactos negativos do consumo em excesso desses produtos. Pelo alto teor de sódio, açúcar, gordura e aditivos artificiais, os alimentos industrializados e ultraprocessados são conhecidos por impactarem o organismo de forma negativa quando consumidos em excesso.
Dentre os riscos, estão aumento da obesidade, hipertensão, diabetes tipo 2, doenças cardiovasculares e até certos tipos de câncer, como o colorretal e até o de pulmão.
Um estudo brasileiro publicado no American Journal of Preventive Medicine apontou que o aumento do consumo de alimentos ultraprocessados está associado a um maior risco de morte prematura.
De acordo com os dados obtidos por pesquisadores do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde da Universidade de São Paulo (Nupens) cada 10% de aumento na ingestão de ultraprocessados faz crescer em 3% o risco de óbito na faixa etária de 30 e 69 anos.
Como se alimentar melhor?
- Mude uma escolha por semana, apostando em trocas simples e consistentes
- Vá ao mercado com intenção, não com pressa
- Saia de casa com uma lista e pense em refeições completas
- Priorize alimentos com poucos ingredientes, frescos e versáteis, como mandioca, frango e peixe
- Evite corredores de ultraprocessados
- Aproveite os dias com promoções
- Troque refresco em pó por suco natural com frutas da estação
- Substitua salgadinhos por pipoca feita em casa com pouco óleo
- Substitua macarrão instantâneo por macarrão comum com legumes refogados e ovo
- Leia os rótulos
- Invista em feiras, produtos a granel e aproveitamento integral dos alimentos
- Prepare as refeições em casa
- Planeje cardápios