A estratégia é conhecida. Condenado em definitivo pela Justiça brasileira, o político anuncia uma cruzada pessoal junto a tribunais estrangeiros a fim de tentar comprovar que é vítima de arbitrariedades, que o processo em que foi réu é viciado e que o Brasil precisa ser penalizado junto à comunidade jurídica internacional. Foi assim com o presidente Lula, que antes mesmo de sentenciado por corrupção na Operação Lava-Jato e preso por 580 dias, bateu às portas do Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) e acusou o então juiz Sergio Moro de ter promovido um julgamento parcial que o impediu que concorrer nas eleições de 2018. Será assim também com o ex-presidente Jair Bolsonaro e com os demais condenados no núcleo crucial da trama golpista. As bancas de defesa fizeram orçamentos com pareceristas para preparar as teses que devem utilizar junto a cortes internacionais. E a conta saiu salgada.
Advogados dos réus consultados por VEJA identificaram que, embora pareceres não sejam cruciais na argumentação junto ao Comitê de Direitos Humanos da ONU ou à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, documentos desta natureza podem dar robustez aos fundamentos e, por isso, devem ser utilizados pelos condenados. Um parecer sobre o tema específico de quebra da cadeia de custódia das provas, por exemplo, foi a encomenda de um militar sentenciado. O preço: 300.000 reais para contra-argumentar sobre episódios como o recolhimento de aparelhos celulares dos investigados e a apreensão de documentos, tablets e computadores do delator premiado Mauro Cid, utilizados para montar o quebra-cabeças da acusação. Confrontado com os valores, o condenado desistiu da contratação.
Um parecer de conteúdo mais global e que aborde diversos pontos da investigação da trama golpista, por exemplo, não sai por menos de 1 milhão de reais, segundo o orçamento feito pelos condenados. Se o parecerista for um figurão do mundo jurídico, a cifra salta para 2 milhões de reais por peça.
Além de discursos de aliados fora do Brasil, como o primeiro-ministro da Hungria Victor Orbán, que recentemente saiu em defesa do ex-presidente Bolsonaro e repetiu o discurso de Donald Trump segundo o qual o ex-mandatário brasileiro estaria sendo vítima de uma “caça às bruxas” judicial, uma das ideias dos sentenciados é recorrer à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, uma espécie de escala obrigatória antes de se acessar o tribunal com sede na Costa Rica que analisa pretensas violações de direitos humanos na região, e repisar argumentos de que o julgamento da trama golpista teria sido parcial e injusto.
Apesar de caro e demorado – estima-se ser necessário pelo menos cinco anos em média para uma primeira decisão –, recorrer a cortes internacionais tem como meta pavimentar o discurso político de perseguição, importante no ano eleitoral de 2026, e não exatamente reverter as condenações, já que tribunais desta natureza não têm ingerência sobre veredictos do Supremo Tribunal Federal (STF). Durante o provável recurso a cortes estrangeiras, Bolsonaro, por exemplo, continuaria inelegível e, como deve acontecer nas próximas semanas, já cumprindo a pena de quase 30 anos definida pelo STF.