A política comercial do presidente Donald Trump entrou nesta quinta-feira (31) em uma fase decisiva, tanto no front diplomático quanto no judicial.
Enquanto o governo corre contra o tempo para firmar acordos com países antes do aumento generalizado de tarifas, um tribunal federal de apelações em Washington colocou em xeque a legalidade da medida, apontando possíveis abusos de autoridade por parte do Executivo.
Em meio à pressão, a Casa Branca já anunciou acordos com ao menos nove parceiros comerciais, incluindo União Europeia, Japão, Coreia do Sul, Vietnã, Tailândia e Reino Unido, que garantirão tarifas reduzidas, entre 10% e 25%.
Outros cerca de 50 países, porém, enfrentarão aumentos que variam entre 11% e 50%, com impacto previsto a partir da meia-noite de sexta-feira (1º).
As tarifas, justificadas por Trump como uma resposta ao que ele chama de práticas comerciais desleais, são aplicadas com base na Lei de Poderes Econômicos de Emergência Internacional (IEEPA), de 1977.
O problema, apontado por estados americanos e pequenas empresas que contestam a medida, é que não há uma emergência que justifique o uso dessa legislação, originalmente criada para lidar com ameaças externas urgentes.
Durante a audiência desta quinta, juízes da Corte de Apelações questionaram repetidamente os argumentos do governo, com um deles apontando que a palavra “tarifa” sequer aparece na redação da lei.
Enquanto isso, os efeitos econômicos da política tarifária já começam a ser sentidos. A inflação nos Estados Unidos permanece pressionada: em junho, os preços ao consumidor subiram 2,6% em relação ao ano anterior.
Empresas como a Apple alertam para prejuízos bilionários. Segundo Tim Cook, CEO da empresa, os custos com tarifas devem superar US$ 1,1 bilhão no trimestre encerrado em setembro, caso os atuais níveis se mantenham.
O presidente Trump, por sua vez, insiste que as tarifas são fundamentais para restaurar a competitividade industrial americana e combater déficits comerciais.
Segundo ele, países como China e México desestabilizam o setor produtivo dos EUA com práticas que exigem uma resposta “forte e patriótica”.
Na última hora, o governo norte-americano concedeu ao México um prazo adicional de 90 dias para concluir as negociações comerciais, enquanto a China já havia garantido um adiamento até 12 de agosto.
No entanto, o Canadá entrou em rota de colisão com Washington após declarar intenção de reconhecer formalmente o Estado Palestino — o que fez Trump ameaçar cancelar qualquer acordo comercial com o país vizinho.
Brasil na mira: tarifas sobem para até 50%, com reação firme de Brasília
No caso brasileiro, o impacto das novas tarifas será significativo. Estima-se que 36% das exportações do Brasil aos EUA serão atingidas por tarifas de 50% a partir de 6 de agosto.
Outros 44% já enfrentam alíquotas de 10%, enquanto o restante será taxado entre 25% e 50%, conforme a categoria do produto. A lista inclui bens como carne, café, celulose e calçados, setores estratégicos para a economia brasileira.
Produtos de maior valor agregado, como aeronaves da Embraer, conseguiram escapar das medidas punitivas. Graças ao lobby de companhias aéreas norte-americanas, aviões, suco de laranja e alguns minérios foram excluídos da tarifa de 50%.
Com isso, o impacto médio estimado da nova política tarifária sobre o Brasil deve ficar em torno de 30%, ainda assim superior à média global.
A justificativa da Casa Branca, segundo fontes ligadas à diplomacia americana, é que o Brasil estaria “politicamente instável” devido ao julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro por tentativa de golpe.
O governo dos EUA alega que isso compromete a previsibilidade institucional e afeta “o ambiente de negócios”.
A resposta de Brasília foi imediata. O governo Lula classificou a medida como uma retaliação política inaceitável e anunciou que vai recorrer à Organização Mundial do Comércio (OMC), além de adotar medidas de reciprocidade em setores estratégicos.
Em pronunciamento oficial, o presidente afirmou que o Brasil “não aceitará imposições unilaterais que prejudiquem nossa indústria e nossa soberania”.
O vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Geraldo Alckmin, também reagiu, prometendo articulações diplomáticas para defender o agronegócio. “O consumidor americano não planta café. Se continuar assim, o povo dos EUA vai pagar caro por esse protecionismo”, afirmou.
Negociações e futuro incerto
A administração Trump ainda tenta fechar acordos bilaterais com mais países até o fim do prazo. As negociações envolvem, além das tarifas, temas como presença militar americana em territórios aliados e cooperação tecnológica.
Fontes do governo americano confirmam que o presidente tem usado o acesso ao mercado dos EUA como moeda de troca, além de ameaçar a retirada de tropas de bases na Europa e na Ásia.
Enquanto isso, empresários e investidores seguem pressionando por mais previsibilidade. Para muitos, a falta de clareza sobre o que será mantido ou alterado cria insegurança jurídica e pode comprometer o comércio global no segundo semestre de 2025.
A disputa em curso entre Executivo e Judiciário nos Estados Unidos promete prolongar a instabilidade. Se a Corte declarar as tarifas ilegais, o governo terá que buscar outros mecanismos legais para sustentar sua política comercial, ou recuar parcialmente.
Caso contrário, o impacto pode ser profundo e duradouro não apenas para os parceiros afetados, mas para toda a economia global.