A Suprema Corte dos Estados Unidos começou a julgar nesta quarta-feira, 15, um caso da Louisiana que envolve uma disputa sobre o uso da raça para desenhar dos distritos eleitorais no estado. Caso o tribunal decida de forma a permitir que raça seja um elemento considerado no processo, pode alterar profundamente a Lei dos Direitos de Voto, promulgada em 1965 para prevenir discriminação racial no processo eleitoral. Seria uma vitória para o presidente Donald Trump, cujo Partido Republicano, no controle do Congresso, poderá atuar para redesenhar distritos de maneira favorável à legenda.
A Lei dos Direitos de Voto, assinada pelo então presidente Lyndon Johnson no contexto do movimento de direitos civis no país, liderado por Martin Luther King Jr., tornou ilegal a discriminação por raça nos processos eleitorais. Alguns estados, em particular no sul do país, tinham criado uma série de obstáculos para dificultar o acesso de pessoas negras ao voto. A seção 2 do texto proíbe a distinção por raça no desenho de mapas eleitorais que dilua a influência de grupos minoritários, mesmo que não exista prova de que isso tenha sido intencional.
O caso da Louisiana remonta a 2020, quando dados do Censo nacional abriram discussões sobre o redesenho distrital com base na nova composição populacional do estado. Na época, a pesquisa mostrou que negros compunham um terço da população total por lá. Porém, o legislativo, ao repensar o mapa eleitoral, manteve apenas um dos seis distritos eleitorais com maioria negra. Então, dois grupos de eleitores negros abriram processos em 2022, alegando que os deputados haviam violado a Lei dos Direitos de Voto ao concentrar eleitores daquela raça em um único distrito e diluir seu poder de voto.
Posteriormente, um redesenho do mapa que incluiu um segundo distrito de maioria negra no estado foi alvo de outro processo, desta vez de um grupo de eleitores brancos. Eles argumentaram a versão foi resultado de gerrymandering ilegal com base em raça. Uma corte inferior concordou com esta interpretação, mas foi alvo de recurso. Agora, o caso parou na Suprema Corte.
Gerrymandering
Nos Estados Unidos, deputados da Câmara são escolhidos para representar distritos específicos. Os limites territoriais de cada um deles são definidos pelo legislativo de cada estado com o objetivo, em teoria, de dividir a unidade da Federação em blocos com o mesmo número de eleitores. Mas nesse processo ocorre o chamado “gerrymandering” — a manipulação das fronteiras de distritos eleitorais para criar maiorias artificiais e favorecer um partido político ou deputado específico que, do contrário, não venceria a eleição.
A técnica tornou-se comum porque, no sistema bipartidário americano, eleitores raramente mudam de voto ao longo dos anos. Quem muda é o distrito. E como o eleitorado negro tem identificação majoritariamente com o Partido Democrata, a raça tornou-se um dos fatores considerados no redesenho de fronteiras distritais — tanto pelos republicanos, para tentar diluir os eleitores da sigla rival, quanto pelos democratas, para tentar criar aquelas maiorias artificiais.
A questão amplamente debatida ganhou contornos mais explosivos neste ano, depois de Trump demandar que os republicanos do Texas “encontrassem cinco assentos” para que o partido aumente sua presença na Câmara nas próximas eleições de meio de mandato, em 2026, que podem consolidar ou derrubar a maioria republicana no Senado e na Câmara. Depois disso, a Califórnia apresentou seu próprio projeto de redistritamento, que deve passar por referendo, com o governador democrata Gavin Newsom defendendo o uso de “fogo contra fogo”.
Hoje, o Partido Republicano detém uma maioria apertada na Câmara dos Estados Unidos. Uma decisão invalidando a seção 2 da Lei dos Direitos de Voto poderia permitir que os republicanos reconfigurem até 19 distritos pelo país, de acordo com um relatório dos grupos de defesa de direitos Fair Fight Action e Black Voters Matter Fund, com inclinação democrata. Trump é favorável a uma reavaliação da legislação.