A ideia nasceu em 2017, durante uma conversa com o pai. Marcelo Grasti, então executivo na área de tecnologia, ouvia o relato sobre a rotina de quem convive com o diabetes tipo 2 há mais de três décadas. “Ele me contou que furava os dedos seis vezes por dia, todos os dias, há mais de 30 anos”, lembra. Disso, surgiu o questionamento: por que, com tantos avanços tecnológicos, ainda é preciso viver sob o desconforto e o peso financeiro da monitorização da glicose?
Na tentativa de mudar o cenário, Grasti decidiu reunir uma equipe técnica multidisciplinar, que inclui engenheiro de telecomunicações, médico pesquisador, professor de química e o oncologista Antônio Carlos Buzaid como conselheiro e investidor-anjo, para pensar em uma alternativa. E da colaboração, nasceu o Glucopatch, um dispositivo vestível, não invasivo, capaz de medir os níveis de glicose continuamente, sem furos, sem agulhas, e com preço abaixo do habitual.
Vale lembrar que, no Brasil, o cenário do diabetes – doença crônica caracterizada pelo aumento dos níveis de glicose (açúcar) no sangue – é uma espécie de epidemia. Em abril deste ano, a Federação Internacional de Diabetes (IDF, na sigla em inglês), divulgou o atlas global da doença. O levantamento revela que 589 milhões de pessoas de 20 a 79 anos apresentam o problema de saúde no mundo, sendo 16,6 milhões delas no Brasil. Com esse montante, o país ocupa a sexta posição no ranking mundial de números de casos, atrás apenas de China, Índia, China, EUA, Paquistão e Indonésia.
“É muita gente”, diz Marcelo. “Queremos levar ao mercado uma solução humanizada e acessível para o controle glicêmico, tanto na rede pública quanto privada”. O custo atual de um sensor contínuo de glicose (CGMs) gira em torno de R$ 600 por mês. Já o modelo tradicional, com glicosímetro, tiras reagentes e lancetas, custa em média R$400,00. “Nosso objetivo é oferecer a tecnologia por cerca de R$ 250, e sem necessidade de perfuração”, diz o CEO da Glucopatch e da empresa de tecnologia SE7EDIGITAL.
O mecanismo por trás envolve processos eletroquímicos combinados para atrair a glicose do tecido da pele para uma camada sensora, onde a concentração é medida em tempo real. De maneira prática, a pessoa encosta o aparelho, que tem cerca de 2,5 centímetros, em áreas livres de pelos, como braço e abdômen. A leitura é feita por um aplicativo no celular, com histórico de medições, gráficos de tendência, alertas personalizados e relatórios que podem ser compartilhados com profissionais de saúde. “O kit será composto por quatro sensores descartáveis e uma unidade eletrônica reutilizável com vida útil estimada de até 24 meses”, explica Grasti.
Ainda em fase inicial de desenvolvimento, o dispositivo alcançou o nível 6 de maturidade tecnológica (TRL 6), com resultados laboratoriais positivos em acurácia e segurança, demonstrando eficácia em situações próximas às reais. Agora, a equipe se prepara para iniciar os testes em humanos, em condições de uso diário, e busca financiamento para avançar nas próximas etapas, incluindo os estudos clínicos e o registro nas agências reguladoras como Anvisa, FDA e EMA.
O desenvolvimento conta com parcerias relevantes. Nos Estados Unidos, o projeto está vinculado ao Centro de Pesquisa e Desenvolvimento da Universidade de Binghamton. E, por aqui, o Laboratório Nacional de Nanotecnologia (LNNano) do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), oferece suporte técnico-científico para o avanço do protótipo.
Enquanto os testes clínicos não começam, o foco é atrair investidores para viabilizar os próximos passos. “Além de aumentar a acessibilidade, a ideia é que o Brasil produza internamente um CGM competitivo, capaz de atender ao SUS e ao mercado privado, além de exportar para outros países, elevando o patamar da indústria nacional de tecnologia em saúde”, diz Grasti.