A economia brasileira cresceu acima do esperado nos últimos dois anos, mas começa a dar sinais claros de desaceleração — e o freio, segundo o economista-chefe da Warren Investimentos, Felipe Salto, não está no consumo, nem no agro, mas nas contas públicas desorganizadas. Em entrevista ao Mercado de Veja, Salto fez um diagnóstico didático e direto: o Brasil até consegue crescer, mas não sustenta o ritmo enquanto conviver com juros altos, dívida elevada e gasto público rígido.
Salto explicou que a inflação, embora ainda elevada, está em processo de desinflação — ou seja, os preços seguem subindo, mas em ritmo menor. Isso abre espaço para que o Banco Central comece a discutir cortes na Selic a partir de janeiro de 2026, desde que o cenário fiscal não piore. O problema é que inflação mais baixa não resolve tudo: alimentos ainda pesam mais no bolso das famílias de renda menor, e juros elevados aumentam a inadimplência, ao encarecer o crédito e comprometer uma fatia maior da renda com dívidas.
Do lado do crescimento, o retrato é claro. O setor de serviços segue como o maior peso do PIB, mas quem tem puxado o avanço recente é o agronegócio, impulsionado por volume físico de produção — e não necessariamente por margens de lucro. Já a indústria continua sendo o elo fraco, justamente o setor que mais agrega valor e que nenhum país desenvolvido conseguiu prescindir. “O Brasil cresceu bem em 2023 e 2024, acima do que os economistas projetavam, mas já entrou em desaceleração”, afirmou Salto.
No pano de fundo, o nó estrutural: o fiscal. Para o economista, o país só crescerá mais e de forma sustentável quando resolver o problema da dívida e recuperar credibilidade. Hoje, a dívida pública brasileira é cerca de 20 pontos percentuais do PIB maior do que a média dos países emergentes. Com 95% do Orçamento engessado, qualquer ajuste exige enfrentar temas impopulares — como subsídios, incentivos fiscais, gastos obrigatórios e benefícios que não entregam resultados claros. Sem isso, o ciclo se repete: gasto gera estímulo pontual, a inflação reage, os juros sobem e o crescimento evapora.