Após décadas de hostilidades, Ruanda e a República Democrática do Congo (RDC) assinaram, nesta sexta-feira, 27, em Washington, um acordo de paz mediado pelos Estados Unidos. Após a cerimônia no Departamento de Estado, sob a coordenação do secretário de Estado americano, Marco Rubio, os chanceleres dos dois países devem ser recebidos pelo presidente Donald Trump, na Casa Branca.
O tratado representa um avanço importante nas negociações entre dois rivais históricos, protagonistas de um dos conflitos mais complexos do continente africano. A guerra informal no leste congolês já matou milhares de pessoas, forçou o deslocamento de milhões e impediu o desenvolvimento econômico de uma região rica em recursos naturais.
Embora nenhum dos países tenha declarado guerra oficialmente, o governo congolês acusa Ruanda de apoiar o grupo rebelde M23, que mantém uma ofensiva armada no leste da RDC. Kigali nega a acusação e alega agir em autodefesa contra milícias hutus ligadas ao genocídio de Ruanda, em 1994.
Acordo de paz
O texto inicial, costurado na semana passada por autoridades de ambos os lados, prevê o respeito à soberania territorial, o fim das hostilidades e o desarmamento de milícias não estatais, com possibilidade de reintegração condicional a estruturas governamentais. Também ficou estabelecido que tropas ruandesas devem ser retiradas do território congolês num prazo de até três meses, com acompanhamento internacional.
Outro ponto-chave do compromisso envolve o encerramento, por parte da RDC, das operações militares contra as Forças Democráticas de Libertação de Ruanda (FDLR) — grupo formado por remanescentes do exército e milícias hutus envolvidos no genocídio de 1994, e que Kigali considera uma ameaça direta.
Nos bastidores, a principal barreira ao acordo vinha sendo justamente a presença militar de Ruanda no leste congolês. Analistas estimam que cerca de 7 mil soldados tenham sido enviados por Kigali à região, em apoio aos rebeldes do M23, que tomaram cidades estratégicas e zonas de mineração em uma ofensiva-relâmpago neste ano. Ruanda nega envolvimento direto.
No entanto, fontes próximas à negociação confirmaram à Reuters que a RDC abriu mão da exigência de retirada imediata das tropas ruandesas para viabilizar o avanço diplomático.
Apesar da assinatura em Washington, parte das negociações ainda ocorre em Doha, no Catar, onde representantes do governo congolês e do M23 buscam consenso sobre pontos sensíveis da implementação do tratado.
As raízes do conflito
O pano de fundo do conflito remonta ao genocídio de Ruanda, em 1994, quando o regime extremista hutu matou cerca de 800 mil tutsis e hutus moderados. Após a queda do governo genocida pelas Forças de Defesa de Ruanda, milhares de combatentes hutus fugiram para o leste do então Zaire, hoje República Democrática do Congo, onde se misturaram à população refugiada e continuaram a lançar ataques contra Ruanda.
Desde então, a presença desses grupos armados em território congolês alimenta ciclos de violência, instabilidade e acusações cruzadas entre os dois países.