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Reconhecimento a estado palestino não muda nada, mas faz pressão

Israel chega hoje a seu ano 5786, pela contagem bíblica – pela histórica, são cerca de 3,5 mil anos de continuidade do povo judeu – com enormes contradições e um grande golpe diplomático, através do reconhecimento de um estado palestino por países importantes como Reino Unido, França, Canadá, Austrália, Bélgica e Portugal.

No campo de batalha, o país conseguiu feitos quase inacreditáveis, como eliminar o topo do Hamas em Gaza e do Hezbollah no Líbano, além de sobreviver com pouquíssimas baixas a 1,5 mísseis e drones lançados pelo Irã. Nem um único avião israelense foi atingido no bombardeio de junho a instalações nucleares de seu maior inimigo em que agentes israelenses penetraram em massa no país e instalaram em seudpróprio território os mísseis que atingiriam alvos iranianos. A Força Aérea havia calculado uma perda de até dez aviões na campanha contra o Irã – e todos voltaram a salvo. Dos 200 a 400 mortos previstos nas simulações, houve 28.

Um dos pilotos envolvidos falou, em sigilo, sobre a mistura de encantamento e senso histórico que sentiu ao sobrevoar durante horas, pela primeira vez, países tradicionalmente inimigos, como a Síria e o Iraque. “Nosso patriarca Abrãao veio de lá”, disse seu co-piloto quando passaram sobre a bíblica Ur, hoje um sítio arqueológico perto da cidade de Nassíria, no Iraque.

Também relatou ter constatado com os próprios olhos, ao voltar para a base perto de Telavive, como Israel tem dimensões diminutas e suas cidades “encolhem” quando comparadas a Bagdá ou Damasco.

GUERRA INSUPORTÁVEL

Essa é a realidade: Israel pode bombardear o Irã, 75 vezes maior, e reduzir à impotência um sofisticado sistema de defesa antiaérea, além de criar um escudo protetor em torno de seu território, mas não pode mudar a geografia: é um país pequeno, cercado por dezessete vizinhos com diferentes graus de hostilidade – para ficarmos apenas no Oriente Médio – com as limitações de uma população de dez milhões de habitantes, das quais dois milhões são árabes com cidadania. Fora mais três milhões na Cisjordânia e os infelizes dois milhões de Gaza.

É só olhar para esses números, e como se distribuem no mapa, e concluir que a maneira mais segura – ou menos arriscada – de garantir a sobrevivência e a segurança de Israel é ter dois países separados, um como existe hoje, menos os territórios ocupados, e outro para os árabes que que já morem em áreas que teria finalmente independência plena. É esse potencial estado que países ocidentais importantes estão reconhecendo hoje, numa espécie de recado bem forte a Israel e a seu grande patrono, os Estados Unidos. Na prática não muda nada, mas os antigos aliados inquebrantáveis estão dizendo que a guerra em Gaza é insuportável e mais medidas virão, inclusive uma possível ruptura da relação comercial especial de Israel com a União Europeia.

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Por que não fazer um grande acordo e aceitar um país palestino em troca de férreas garantias e do descarrego que seria se livrar de uma população extremamente hostil?

Esse, infelizmente, é o olhar de fora. Pelo lado de dentro, hoje, uma grande quantidade de israelenses só vê perigos num estado árabe encravado em seu espaço. Têm bons argumentos: líderes palestinos recusaram historicamente as melhores propostas possíveis para a independência, a autonomia dada à Cisjordânia turbinou os riscos de ataques terroristas para Israel e Gaza virou o que virou, o foco de um movimento armado islamista que conseguiu furar as legendárias defesas israelenses e matar 1,2 mil judeus e sequestrar 250 em um único dia.

ETERNO CICLO

O que fariam se tivessem a livre entrada de armamentos, que nem o bloqueio israelense conseguiu controlar? E aqui não está envolvido apenas o Hamas. Para dar uma ideia da mentalidade reinante: quase 90% dos palestinos de Gaza e da Cisjordânia não acreditam nas atrocidades cometidas em 7 de outubro de 2023, muitas delas transmitidas ao vivo por triunfantes e orgulhosos membros do Hamas e também da população comum. Quase 60% acham que o ataque de 7 de outubro foi certo.

Ficou tragicamente famoso o caso de Mahmoud Afana, cujo telefonema à família em 7 de outubro de 2023 foi interceptado pelos militares israelenses, deixando gravado: “Pai, eu matei dez judeus com as minhas mãos. Você ficaria orgulhoso de mim”. Ele também se orgulhou de estar ligando do telefone de “uma judia que matei”.

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Benjamin Netanyahu anunciou no começo do mês que Afana foi eliminado num bombardeio em Gaza. Militares israelenses ligaram aos pais dele para dar a notícia.

Existe um jeito de romper esse eterno ciclo de violência e vingança?

“Isso não vai acontecer. Não será estabelecido um estado palestino a oeste do rio Jordão”, reagiu Netanhyahu à onda de reconhecimento, recebida com elogios e proclamarações de vitória pelo Hamas.

UM ESTADO SÓ

Os idiotas provocadores aliados de seu governo, como os ministros Bezalel Smotich e Itamar Ben-Gvir, se comprazem em dizer que querem mandar israelenses judeus de volta ao território de onde saíram e sonham expulsar a população civil de Gaza, transformando o território num grande centro turístico ou em área de condomínios para policiais. Sabem muito bem que ias provocações desse tipo ajudam os partidários das acusações de genocídio contra Israel – que não são poucos. Os discursos na Assembleia Geral da ONU vão mostrar esse coro, lamentavelmente enganchado no antissemitismo.

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Restam questões monumentais: o que fazer de Gaza, o que fazer da Cisjordânia, o que fazer?

Muitos israelenses estão transtornados por ver que o reconhecimento de um estado palestino por países importantes equivale a “premiar”o terrorismo. Se não fosse o ataque de 7 de outubro e se não fosse a reação israelense, com a horrível quantidade de vítimas civis, a verdade é que o reconhecimento em massa da Palestina não estaria acontecendo. Uma ocupação que se eterniza só aumenta os defensores dos dois estados – uma ironia, considerando-se que os palestinos radicais, e também os que não parecem tão radicais assim quando falam ao público ocidental, querem um estado só, o deles, varrendo Israel do mapa.

Têm os judeus, de Israel e de outros países, motivos para comemorar seu ano novo? A resposta, como tudo envolvendo essa questão é positiva e ao mesmo tempo negativa. Os feitos quase inacreditáveis no Líbano e no Irã podem se esgotar no tempo, da mesma forma que muitos já estão conseguindo esquecer o que foi o grande massacre em que mais judeus foram mortos em um dia desde o tempo apocalíptico do Holocausto. Fica o crescente isolamento

Hoje, cerca de 80% dos israelenses são contra um estado palestino. Nem que quisesse, um futuro governo poderia fazer um acordo: foi aprovado em julho do ano passado um projeto que proíbe a declaração de um estado palestino. Votaram nele 68 deputados. Contra: nove. Os demais integrantes do Parlamento de 120 membros deixaram o plenário para não ter que votar. As belas declarações que serão ouvidas a partir de hoje na Assembleia Geral não mudarão isso.

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