Jeannette Jara, ex-ministra do Trabalho do Chile, venceu no domingo 29 as eleições primárias dos partidos de esquerda com surpreendente facilidade, superando um rival mais moderado e conquistando 60,2% dos votos. A reviravolta alçou Jara, uma comunista de 51 anos, a representante de um combalido governo de Gabriel Boric nas eleições presidenciais de novembro, quando deve enfrentar rivais de centro-direita e extrema direita mais populares.
De acordo com a lei do país, o esquerdista Boric, de 39 anos, não pode concorrer a um segundo mandato presidencial consecutivo. Jara, advogada e membro do Partido Comunista do Chile, foi sua ministra do Trabalho antes de renunciar ao cargo para concorrer nas eleições. Nas primárias de domingo, ela superou a ex-ministra do Interior Carolina Toha, do tradicional Partido Socialista Democrático, antes considerada favorita – mas obteve 28,3% dos votos, nem metade dos de Jara.
Os outros candidatos, Gonzalo Winter, da Frente Ampla (do atual presidente), e Jaime Mulet, da Federação Social Regionalista Verde, ficaram com 9% e 2,9% dos votos, respectivamente.
“Hoje se inicia um novo caminho que trilharemos juntos, com a convicção de construir um Chile mais justo e democrático”, escreveu a vencedora nas redes sociais. “Diante da ameaça da extrema direita, respondemos com união, diálogo e esperança.”
Uma candidata fora da caixa em eleições imprevisíveis
Após a eleição de Boric em 2022, o voto tornou-se obrigatório no Chile, adicionando imprevisibilidade à disputa deste ano.
Dados preliminares de comparecimento às urnas, divulgados pelas autoridades eleitorais, mostraram que a participação foi muito menor do que o esperado: apenas 1,4 milhão de pessoas foram votar. O país tem cerca de 15,4 milhões de eleitores aptos.
Embora a vitória esmagadora de Jara represente uma ascensão do extremo mais à esquerda dentro da coalizão de Boric (foi a primeira vez desde 1990 que o Partido Comunista venceu uma indicação unificada para a Presidência), analistas a consideram menos dogmática e mais diplomática do que alguns de seus pares comunistas. Como ministra do Trabalho, ela foi elogiada por um programa que aumentou o salário mínimo e reduziu a semana de trabalho para 40 horas.
Ela costuma ser comparada a Michelle Bachelet, ex-presidente de centro-esquerda do Chile e um ícone do empoderamento feminino, que governou o país de 2006 a 2010 e, depois, de 2014 a 2018.
Prestando homenagem a Bachelet em seu discurso de vitória, Jara disse: “Foi ela quem nos mostrou o caminho de que nada é impossível.”
Mas a candidata enfrentará um caminho difícil no percurso eleitoral. Pesquisas de opinião recentes mostram pintam a seguinte imagem: um governo de esquerda cuja popularidade declina vagarosa mas constantemente, num momento de crescimento econômico lento e aumento da preocupação com a segurança pública (especialmente devido ao crime organizado) e com imigração.
Ambos os temas tendem a favorecer figuras mais à direita no espectro político e já ajudaram a mobilizar apoio para os candidatos dessa ala, particularmente o advogado e ex-deputado ultraconservador José Antonio Kast. Outra favorita da direita é Evelyn Matthei, ex-ministra do Trabalho, cujas propostas de políticas favoráveis aos negócios encantaram os investidores.
O cenário que se desenha é o de uma eleição profundamente polarizada. Os chilenos irão às urnas em 16 de novembro para eleger um presidente para o mandato de 2026 a 2030.