Quase metade dos americanos se opõem aos ataques dos Estados Unidos a barcos no Caribe e no Pacífico, mostrou uma pesquisa da agência de notícias Reuters em parceria com a Ipsos nesta quarta-feira, 10. Cerca de 48% dos entrevistados foram contrários à realização de bombardeios, que já mataram ao menos 87 pessoas, sem autorização prévia de um juiz ou tribunal. Apenas 34% apoiaram. O levantamento é divulgado em meio à escalada das tensões entre EUA e Venezuela, reflexo do envio de tropas americanas à região.
Entre os republicanos, o apoio é naturalmente maior: 67% apoiaram e 19% se opuseram às explosões. Em contrapartida, 80% dos democratas rejeitaram os ataques, contra 9% que foram a favor. No geral, 45% dos americanos apoiaram o uso de força na Venezuela para reduzir o fluxo de drogas em direção aos EUA, enquanto 36% foram contrários. A pesquisa foi realizada ao longo de seis dias, sendo finalizada na segunda-feira, 8.
A sondagem ocorre em meio a críticas ao governo de Donald Trump pela condução de um segundo ataque para matar sobreviventes de um bombardeio anterior em 2 de setembro, informação que veio à tona no mês passado. A princípio, o mandatário da Casa Branca disse que não havia “desejado” a operação, mas logo assumiu um tom defensivo em relação à decisão do secretário de Defesa, Pete Hegseth. Na segunda, Trump ofendeu uma jornalista que o questionou sobre a possibilidade de divulgar o vídeo do momento do incidente.
“Você é a repórter mais irritante desse lugar. Deixa eu te dizer: você é uma repórter insuportável, realmente péssima. E é sempre a mesma coisa com você”, disparou o líder americano.
“Eu já te disse, qualquer coisa que o Pete Hegseth quiser fazer está bem para mim”, acrescentou.
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Tensão no Caribe
No final de outubro, o líder americano revelou que havia autorizado a CIA a conduzir operações secretas dentro da Venezuela, aumentando as especulações em Caracas de que Washington quer derrubar o ditador Nicolás Maduro. Fontes próximas à Casa Branca afirmam que o Pentágono apresentou a Trump diferentes opções, incluindo ataques a instalações militares venezuelanas — como pistas de pouso — sob a justificativa de vínculos entre setores das Forças Armadas e o narcotráfico.
Os EUA acusam Maduro de liderar o Cartel de los Soles — designado uma organização terrorista estrangeira no final de novembro — e oferecem uma recompensa de US$ 50 milhões por informações que levem à captura do chefe do regime chavista. O presidente da Colômbia, Gustavo Petro, também foi acusado por Trump de ser “líder do tráfico de drogas” e “bandido”. Em paralelo, intensificam-se os ataques a barcos de Organizações Terroristas Designadas, como define o governo americano, no Caribe e Pacífico.
Há poucas semanas, militares americanos de alto escalão apresentaram opções de operações contra Caracas a Trump. O secretário de Defesa, Pete Hegseth, o chefe do Estado-Maior Conjunto, Dan Caine, e outros oficiais entregaram planos atualizados, que incluíam ataques por terra. Segundo a emissora CBS News, a comunidade de Inteligência dos EUA contribuiu com o fornecimento de informações para as possíveis ofensivas na Venezuela, que variam em intensidade.
O planejamento militar ocorre em meio à crescente mobilização militar americana na América Latina e ao aumento das expectativas de uma possível ampliação das operações na região, em atos considerados como “execuções extrajudiciais” pela Organização das Nações Unidas (ONU). Além do porta-aviões, destróieres com mísseis guiados, caças F-35, um submarino nuclear e cerca de 6.500 soldados foram despachados para o Caribe, enquanto Trump intensifica o jogo de quem pisca primeiro com o governo venezuelano.
Os incidentes geraram alarme entre alguns juristas e legisladores democratas, que denunciaram os casos como violações do direito internacional. Em contrapartida, Trump argumentou que os EUA já estão envolvidos em uma guerra com grupos narcoterroristas da Venezuela, o que torna os ataques legítimos. Autoridades afirmaram ainda que disparos letais são necessários porque ações tradicionais para prender os tripulantes e apreender as cargas ilícitas falharam em conter o fluxo de narcóticos em direção ao país.
Dados das Nações Unidas enfraquecem o discurso de caça às drogas. O Relatório Mundial sobre Drogas de 2025 indica que o fentanil — principal responsável pelas overdoses nos EUA — tem origem no México, e não na Venezuela, que praticamente não participa da produção ou do contrabando do opioide para o país. O documento também aponta que as drogas mais usadas pelos americanos não têm origem na Venezuela — a cocaína, por exemplo, é consumida por cerca de 2% da população e vem majoritariamente de Colômbia, Bolívia e Peru.
Uma pesquisa Reuters/Ipsos divulgada na última sexta-feira, 14, revelou que apenas 29% dos americanos apoiam o uso das Forças Armadas dos Estados Unidos para matar suspeitos de narcotráfico, sem o devido processo judicial, uma crítica às ações de Trump. Em um sinal de divisão entre os apoiadores do presidente, 27% dos republicanos entrevistados se opuseram à prática, enquanto 58% a apoiaram e o restante não tinha opinião formada. No Partido Democrata, cerca de 75% dos eleitores são contra as operações, e 10% a favor.