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Primeiro balanço: dois lados comemoram, ganha-ganha para Israel e Gaza

O acordo de cessar-fogo, o início da retirada israelense e a iminente libertação dos reféns estão criando um clima de alegria e comemoração quase sem precedentes no Oriente Médio. Ninguém ignora as complicações que ainda virão, mas é emocionante ver judeus e árabes com o mesmo sentimento de alegria.

Coincidentemente, o acordo de paz acontece quando os judeus comemoram o Sucot, a Festa dos Tabernáculos no calendário cristão, um raro feriado judeu em que só há motivos para regozijar, sem escaoacar um passado de milênios de perseguições. Os tabernáculos são uma referência às tendas em que os israelitas viviam quando enfrentaram a travessia do deserto – daí as pequenas cabanas que os religiosos montam durante o Sucot. O próprio templo do Deus de Israel era assim improvisado, com lonas montadas em caibros de madeira, num sinal de como seu povo tinha tão pouco – e conseguiu fazer tanto, em termos de influência sobre a futura sociedade ocidental.

No Evangelho segundo João, diz Jesus durante a Festa dos Tabernáculos: “Quem tem sede, venha a mim e beba! Pois as Escrituras declaram: Rios de água viva brotarão do interior de quem crer em mim”.

Peregrinos cristãos comemoraram estas palavras em Israel, saudando também o acordo de paz. Os que se alegram estarão decepcionados muito em breve, como tantas vezes aconteceu antes?

Um balanço dos principais desdobramentos dá motivos para as duas visões, a otimista e a pessimista. Alguns de seus pontos principais:

  • Vinte reféns vivos serão libertados até segunda=feira. Em que estado chegarão? Vídeos de propaganda do Hamas mostram que vários deles estão ainda mais devastados do que os libertados anteriormente, muito tendo perdido quase a metade do peso corporal e a capacidade emocional de suportar o tormento.
  • Apesar da experiência inenarrável, de modo geral o estado dos ex-reféns é bom, com uma notável capacidade de resistência interior. O caso mais impressionante talvez seja o de Eli Sharabi, que escreveu um livro sobre seu período em cativeiro e como viveu com horror o que deveria ter sido o melhor momento de sua vida: assim que foi libertado, uma assistente social da equipe de recepção disse que a mãe e a irmã o esperavam. E a mulher e as duas filhas adolescentes? Tão logo fez a pergunta, Sharabi intuiu a resposta. Tendo sobrevivido em nome da família, entendeu que as três haviam sido assassinadas – seu irmão também foi morto. Posteriormente, Sharabi concluiu que não adiantaria nada ficar em casa chorando a perda.
  • Os futuros libertados estão nos túneis de Gaza há mais de 730 dias. É quase impossível imaginar sua condição.
  • Sua famílias e amigos lutaram por eles a cada minuto desses dois anos. Algumas vezes, perderam a mão, como ao culpar inteiramente Benjamin Netanyahu pela persistência do inferno exatamente o que o Hamas queria. Mas a força de seus protestos foi um fator fundamental para que a questão permanecesse, em carne viva, no centro dos debates. Os rios de água viva, as lágrimas de alegria vertidas na Praça dos Reféns, atestam o estado de alta comoção nacional em Israel.
  • Netanyahu será o herói que redime seu passado – a inconcebível falta de preparo de Israel no ataque de 7 de outubro de 2023? Ou o vilão a ser investigado e condenado pelos próprios cidadãos? As duas hipóteses, no momento, estão em aberto. “O trabalho pesado foi do primeiro-ministro”, elogiou o extremamente bem sucedido negociador de Trump, Steve Witkoff. “Teve que proteger o país e decidir quando ser duro com o Hamas, quando ser flexível”. O investidor imobiliário por quem ninguém dava nada disse que, em certas ocasiões, desejou mais flexibilidade. Mas tudo acabou dando certo.
  • ”No mundo dos imóveis de Nova York, você está sempre negociando”, disse, modestamente, ao New York Times, o genro que Trump deslocou para fazer dobradinha com Witkoff, Jared Kushner. “Estamos acostumados com acordos complexos que são muito dinâmicos, com personagens complexos também”. Uma definição tão boa quanto qualquer outra para uma negociação que envolveu israelenses, palestinos, egípcios, catarianos, só para ficar nas principais complexidades.
  • Israel conseguiu feitos inacreditáveis, dos pagers que explodiram nas mãos do Hezbollah à destruição das defesas antiaéreas do Irã. Mas foi um raro fracasso, a explosão no Catar da qual escapou toda a cúpula do Hamas no exterior, que empurrou a solução definitiva. Netanyahu perdeu uma chance vital, mas acabou sendo arrastado para o acordo por um Trump furioso. São estranhos os caminhos que levaram à paz.
  • Quem perdeu e quem ganhou? São indagações com respostas múltiplas. Ao não ser totalmente eliminado por uma potência militar superior, e com sede de vingança, a mera sobrevivência mesmo que apenas do escalão médio é uma vitória. Irão eles usar isso para torpedear a parte do plano de paz que prevê sua renúncia ao poder? Com toda certeza. Israel demonstrou um extraordinário poder tático e estratégico. Absolutamente.
  • Tem a Autoridade Palestina condições de assumir, com apoio internacional, inclusive de países árabes importantes, a administração de Gaza? É quase absurdamente impossível – mas o espírito do momento é de dobrar os limites das impossibilidades.
  • Irão a Autoridade Palestina e o Hamas se reconciliar e criar uma frente unida contra Israel, não a favor da paz e da convivência? Os pessimistas acham que sim, malgrado o ódio recíproco entre as duas principais correntes de representação, sejam quais forem os métodos usados, dos palestinos.
  • E estão os palestinos preparados para um reset, uma mudança estrutural em suas instituições e em seu modo de pensar, voltado totalmente ao ódio aos judeus? Esta é uma das partes mais difíceis do arcabouço de paz. Único motivo para um pequeno grão de otimismo: no passado, quando o conflito refluía e parecia haver possibilidade de um acordo, também diminuía o culto ao ódio e à erradicação do estado judeu.
  • Conseguirá Israel recuperar a imagem entre países e povos amigos? O estrago foi grande. As autoridades israelenses concordaram tacitamente que o tamanho e a barbárie da violência praticada pelo Hamas em 7 de outubro justificavam uma luta existencial, incluindo nela um número enorme de vítimas entre a população civil, na casa dos 40 mil, considerando-se a hipótese de que outros vinte mil ou trinta eram militantes armados. Para a maioria dos israelenses, não havia outra opção: era atingir brutalmente o Hamas, mesmo ao preço de tantas vidas inocentes, ou caminhar para a própria erradicação. Mas a visão do sofrimento dos habitantes de Gaza mudou até o mais sólido bastião de apoio a Israel, a opinião pública americana. Pesquisas indicam que chegam a 59% os americanos com uma opinião desfavorável a Israel. Isso sim é ameaça existencial.
  • Os mecanismos que unem hoje as esquerdas em escala mundial e os propagadores do mais radical islamismo mostraram um poder enorme, emplacando mentiras como o “genocídio”e outras palavras de ordem que se disseminaram nas universidades, esferas culturais, governos de esquerda e instituições mundiais. É uma associação maligna e perversa cujos resultados ainda reverberarão por muito tempo.
  • Apenas uma parte da direita ficou do lado de Israel – um setor conservador inteiro também foi devorado pelo antissemitismo disfarçado de críticas legítimas ao estado judeu. Nessa direita pró-Israel, para a qual é inquebrantável o compromisso com a sobrevivência do estado judeu como garantia de que não veremos o mal absoluto de novo recair sobre a Terra, às vezes alguém repete uma pergunta: quem são os mocinhos e quem são os bandidos no confronto entre Israel e Hamas? Na vida real, o mocinho pode até agir como bandido, mas todo mundo tem que responder honestamente: sob qual deles você preferiria viver?
  • O trecho de João sobre Jesus na Festa dos Tabernáculos é um dos mais misteriosos do Novo Testamento pois trata da sua natureza como Messias, nem sempre correspondente às expectativas despertadas por um homem aparentemente comum, ou não incomum o suficiente para ser o salvador. Sobre os “rios de água”, diz João que é uma referência ao Espírito Santo que seria dado a todos quantos cressem neles”. No entanto, o Espírito Santo ainda não fora dado, porque Jesus não voltara ainda a sua glória no céu”.
  • Se até Jesus provocava dúvidas, imaginem se Donald Trump vai receber o Nobel da Paz… Nem sequer um editorial elogioso ele recebeu do New York Times.
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