Na mesma semana em que pulou dos cadernos de entretenimento para os de política, Virginia Fonseca, ao dar depoimento numa CPI que investigava a participação de famosos influencers na jogatina online sem fiscalização, foi anunciada rainha de bateria de uma escola de samba, a Grande Rio, outrora conhecida por ser a “Projac da Avenida” – por sua atração de famosos como destaques.
A Grande Rio “limpou” sua barra nos últimos anos ao trazer enredos sérios, com menos cara de serem patrocinados e com forte engajamento nas mensagens. Muito em parte pelo trabalho bem feito de Leonardo Bora e Gabriel Hadad, que levaram o primeiro título à agremiação, em 2023, sobre Exu. O problema atual passa longe de escolha de enredos ou de carnavalescos – a dupla mudou de lado, agora assina o desfile da Vila Isabel. A questão é mesmo a escolha de Virginia. Um tema que tem digital dos diretores nessa escolha polêmica ainda a meses do desfile oficial.
E essa provocação nem passa pela ausência de samba no pé da influenciadora. Afinal, atire a primeira pedra a rainha de bateria que sabe sambar nos dias de hoje, sem que seja fruto do próprio universo do carnaval. Poucas, quase nenhuma. A Grande Rio optou em 2026 pelo enredo sobre o manguebeat, movimento cultural que surgiu em Recife (PE) no início dos anos 1990, misturando ritmos regionais como o maracatu com rock, hip-hop, e música eletrônica.
A mensagem principal do Movimento Manguebeat é o protesto contra a desigualdade social e a miséria, buscando conscientizar a população para a precariedade da situação do Nordeste, ao mesmo tempo em que defende a renovação cultural através da mistura de ritmos regionais com música pop. Também uma rainha nem deve ser cobrada de ser relacionada diretamente a um enredo. Mas é muita incoerência que justamente Virginia seja escolhida para defender um enredo tão sério, com uma mensagem de forte apelo cultural e de razões sociais que a própria em nada se adequa na sua realidade.
Substituta de Paolla Oliveira no midiático cargo, ela, que não é boba, já correu para montar uma quitanda de seus produtos de maquiagem e beleza, os mesmos que anuncia em lives desde a época da pandemia, agora para as frequentadoras da quadra da Baixada Fluminense. A fantasia de Virginia no carnaval será fingir ser aliada contra a desigualdade social e a miséria, enquanto lucra na “tela da TV e no meio desse povo”.
O movimento cantado no enredo da escola, simbolizado pela antena parabólica enfiada na lama, promove a união entre tecnologia e natureza, defendendo a ideia de que “o homem que sai do mangue torna-se aratu, um crustáceo que não tem casulo para se esconder e vira presa fácil dos predadores”, e que o despertar artístico é a forma de “deslobotomizar” as mentes. Em tempos de celebridades surgidas não por antenas parabólicas, mas via telas de celulares, a Grande Rio só tem uma saída: tornar à lama os predadores de seus holofotes.