O governo do primeiro-ministro da França, François Bayrou, perdeu um voto de desconfiança na Assembleia Nacional nesta segunda-feira, 8, em um novo abalo na política do país. O presidente francês, Emmanuel Macron, deve apontar um novo nome ao cargo ou chamar novas eleições, em meio a uma série de crises institucionais que fizeram ir e vir quatro primeiros-ministros em menos de dois anos.
Sem maioria na casa legislativa, Bayrou viu um total de 364 parlamentares votarem contra a moção de confiança que ele convocou há duas semanas. Entre os que decidiram derrubar o governo estão a aliança esquerdista Nova Frente Popular (NFP) e o partido de extrema direita Reagrupamento Nacional, de Marine Le Pen. Eram precisos 288 votos para tirá-lo do cargo.
Propostas polêmicas
Bayrou sabia que convocar tal votação era uma manobra arriscada. Seu objetivo era testar o apoio a seu plano para o orçamento de 2026, no qual propôs um corte de 44 bilhões de euros. A reforma é avançada num contexto em que a França atinge níveis inéditos no seu crônico endividamento: o déficit anual está em 168,6 bilhões de euros e corresponde a preocupantes 5,4% do PIB, o dobro do permitido pelas regras da União Europeia. Para piorar, projeções indicam que a economia francesa deve crescer apenas 0,8% neste ano, e o PIB per capita será ultrapassado pela primeira vez na história pelo da Itália.
Os valores que ele propôs passar a tesoura são até modestos diante do cenário, mas mexeram com o vespeiro: congelamento de aposentadorias e salários de funcionários públicos; flexibilização das leis de seguro-desemprego; freio ao programa de subsídios a medicamentos; e, a mais impopular de todas, abolir dois dos onze feriados anuais, de modo a aumentar a produtividade. “Nosso país está em perigo, estamos à beira do superendividamento”, justificou Bayrou, lembrando que a França gasta mais com os juros da dívida do que com investimentos em educação e defesa militar.
Em um discurso de 40 minutos ao parlamento antes do voto de confiança, o premiê afirmou que este era um “momento da verdade” e pediu que os deputados encontrassem uma maneira de enfrentar a iminente crise da dívida do país. Apesar das discussões frenéticas de última hora, ficou claro que Bayrou simplesmente não tinha os votos necessários para vencer.
Crise política
Pressionado dentro e fora do país, Macron precisará decidir agora se indica um substituto para chefiar o governo ou se convoca novas eleições parlamentares, em busca de maioria.
Não é escolha trivial. Um quinto premiê do segundo mandato do presidente francês, iniciado em 2022, enfrentaria resistência no Legislativo — e a convocação às urnas não aplacaria os humores.
Ele recorreu à cartada em 2024 e viu o Reagrupamento Nacional, de Le Pen, avançar sobre o eleitorado no primeiro turno. Só foi contido porque a esquerda lançou mão de um raro esforço de união, na etapa final, em uma coalizão que lhe rendeu a maior fatia da Assembleia: 193 dos 577 deputados. O centrista Renascimento, de Macron, ficou com 159, graças a uma relutante aliança com os rivais de centro-esquerda para conter o avanço da direita radical, que acabou em terceiro, com 143 assentos. O frágil equilíbrio de forças resultou no primeiro governo minoritário da França desde 1958.
Enquanto isso, a questão do orçamento segue sem solução. Bayrou usou duas vezes a expressão “tohu-bohu”, que descreve a Terra antes da criação, significando “vazio e sem forma”, ou “caos” e “confusão”, para descrever a turbulência que a França enfrenta. Ele pode ter perdido a votação desta segunda, mas a enorme dívida que ele destacou e tentou resolver continua a mesma — e cai novamente no colo de Macron.