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Os condomínios residenciais em que os vizinhos não vivem em pé de guerra

Mais uma modalidade de compartilhamento começa a ganhar espaço no mercado imobiliário e, mais do que um modelo construtivo, ela propõe uma mudança profunda de mentalidade sobre o que significa morar. O cohousing, nome técnico importado de experiências internacionais, pode ser traduzido de forma mais afetiva como um verdadeiro resgate da tribo. São pessoas que escolhem, conscientemente, dividir a vida cotidiana sem renunciar à individualidade. Amigos que desejam envelhecer juntos, familiares adultos que querem manter laços próximos ou até grupos formados por afinidade de valores encontram nessa proposta uma alternativa ao isolamento típico das grandes cidades.

O funcionamento é simples na forma e sofisticado na ideia. Um grupo se une para adquirir um terreno e construir casas ou unidades independentes. Cada família ou morador tem seu espaço privado garantido, com sala, quarto, cozinha e rotina própria. Ao mesmo tempo, existe o compartilhamento do que se pode chamar de quintal da vida: áreas de lazer, jardins, horta, lavanderia, espaços de convivência e até oficinas. É um equilíbrio delicado e desejado entre ter o seu canto e nunca estar verdadeiramente só.

Há uma dimensão humana poderosa por trás desse modelo. A conhecida frase de que é preciso uma aldeia para criar uma criança ganha contornos concretos quando se imagina filhos crescendo cercados por adultos de confiança, amigos próximos e relações contínuas. Da mesma forma, envelhecer deixa de ser um processo solitário e passa a ser acompanhado por apoio real, cotidiano e afetivo. Pesquisas acadêmicas, como estudos conduzidos pela Universidade de Stanford, apontam que viver em comunidade pode aumentar a longevidade e reduzir índices de depressão e solidão. Nesse sentido, o cohousing constrói saúde emocional com tijolos, concreto e relações.

Existe também um aspecto econômico e simbólico que atrai cada vez mais pessoas: o luxo compartilhado. Individualmente, poucos conseguem manter uma piscina de raia, uma horta orgânica produtiva, uma oficina equipada ou amplas áreas de lazer. Coletivamente, isso se torna possível. Ao dividir custos, amplia-se o acesso. A lógica deixa de ser a da posse individual e passa a ser a da abundância coletiva, em que menos coisas são exclusivamente suas, mas muito mais está disponível para todos.

Nada disso, porém, funciona sem encarar a vida real. A convivência não acontece apenas em fotos bonitas ou fins de semana ensolarados. Ela se revela nas noites de terça-feira, quando surgem conflitos aparentemente pequenos, mas carregados de significado. O cachorro que invadiu a horta alheia, o dilema entre uma festa animada e um bebê tentando dormir, a decisão sobre reformar a piscina quando uma das famílias atravessa dificuldades financeiras. Esses são os testes verdadeiros do modelo.

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É justamente por isso que o sucesso do cohousing depende menos de afinidade inicial e mais de gestão madura. Regras claras não afastam, elas protegem. Um estatuto de convivência que trate de barulho, visitas, uso das áreas comuns e contribuições financeiras não representa desconfiança, mas cuidado. Quando os combinados estão escritos, a convivência se torna mais leve e as amizades ficam blindadas contra os desgastes do cotidiano.

No fim das contas, o esforço vale a pena porque o ganho é maior. Trata-se de substituir o cumprimento formal do elevador por um café da manhã com quem se ama, de trocar o anonimato urbano por relações reais. Em um mundo cada vez mais individualista, escolher compartilhar a vida é um ato de coragem silenciosa e, de certa forma, revolucionária.

Há exemplos concretos que mostram como essa ideia pode sair do papel. Sete amigas decidiram levar essa lógica ao extremo na província de Guangdong, no sudeste da China. O que começou como uma brincadeira em 2008, quando ainda trabalhavam e sonhavam em envelhecer juntas, acabou se transformando em um projeto real anos depois. Ao encontrarem uma propriedade nos subúrbios de Guangzhou, decidiram transformá-la em uma espécie de casa de repouso escolhida, planejada por elas mesmas. Após uma reforma que custou cerca de 4 milhões de yuans, o equivalente a aproximadamente 2,7 milhões de reais, a mansão de 700 metros quadrados ganhou três andares, sete dormitórios, grandes janelas de vidro, salão de chá, amplas áreas de convivência, uma cozinha generosa e piscina. Mais do que uma casa, construíram um futuro compartilhado.

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Talvez o futuro da moradia não esteja apenas em plantas mais inteligentes ou acabamentos mais caros, mas em projetos que coloquem as relações no centro. A verdadeira casa dos sonhos pode ser aquela em que a campainha toca e, do outro lado da porta, está um amigo.

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