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Os bastidores da vitória do Flamengo na Libertadores

Se Nelson Rodrigues estivesse vivo, certamente escreveria que o Estádio Monumental U e Lima se tornaram o segundo estádio e a segunda cidade do Flamengo. Sim, nossa casa. Agora e para sempre.

As emoções de 2019 e de 2025 foram diferentes, complementares, inesquecíveis.

Quem esteve presente nas duas finais da Libertadores no Peru sabe que aquela arquibancada de cimento carrega hoje uma magia nossa, a magnética rubro e negra (especialmente as traves entre as quais foram feitos os três gols…)

Assim como o calor, o pó suspenso no ar e o difícil acesso a água ou comida, o sofrimento para chegar até o estádio é tão real quanto o encantamento daquele campo.

Entre 2019 e 2025 havia uma pedra. Havia uma pedra no meio do caminho chamado Andreas Pereira. Nem dá para chamar de Palmeiras. O jogador que entregou o jogo numa final de Libertadores, o campeonato mais difícil do mundo, aceitou jogar no time para quem deu uma copa às avessas. Esse era um dos dramas do jogo.

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Os outros passavam justamente pela importância do estádio de 2019, pelo fato de quem vencesse se tornaria o maior da Libertadores no Brasil, pela vaga no Mundial e no Supermundial e pela constatação de que o Palmeiras foi para o all in em Lima — pôs a temporada inteira no jogo que perdeu, praticamente desistindo do Brasileiro.

Aos dez minutos do primeiro tempo, como faz em todos os jogos desde a tragédia, o Monumental parou para cantar pelos Garotos do Ninho. No meio da tensão da final, aquela melodia conhecida atravessou o estádio como um lamento e uma afirmação de memória. Foi impossível não sentir o peso da ausência. O Flamengo que empilha taças também carrega cicatrizes e promessas interrompidas. Lima, de repente, virou memorial.

Torcedores abraçaram desconhecidos, levantaram os braços e cantaram mais alto. Um minuto de lembrança que atravessou a montanha e voltou como um aviso: nenhum título apaga o que aconteceu. Mas cada vitória é também por eles.

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E havia também o lado íntimo, o humano, o que a gente leva para sempre. Em 2019, vivi aquela final com um grupo de amigos que se eternizou: André Castro, Diego Abreu, Fernando Teixeirense, Gustavo Tourinho, Rodrigo Ledo, Rodrigo Rangel e Felipe Ledo – verdadeiros heróis de Lima. Agora, em 2025, a composição era em parte igual, em parte diferente.

Eu, Bianca, a Júlia Lorencini Rangel e o Rodrigo Rangel nos perdemos na confusão da entrada do Fernando Teixeirense e do Rodrigo Ledo, num fiasco da Commebol que não conseguiu nem checar os ingressos de todos. Mas seguimos juntos em grande parte da aventura.

Bianca, jornalista e corintiana de nascença, atravessou um continente por amor, para estar ao meu lado e dividir aquele momento. Estar com ela ali, sentir seu carinho e sua companhia, tornou a experiência ainda mais intensa e próxima, um pedaço da vida que se eterniza junto com a memória do estádio — deu outra luz a tudo.

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O segundo tempo foi de romance, mas policial: tensão crescente, temor de tragédia, suor frio. O Flamengo soube sofrer. Soube respirar. Soube se defender como quem sabe o preço pago para chegar até ali.

E então veio o gol da vitória, marcado por Danilo, homem negro, flamenguista, que aos 34 anos colocou o nome dele na história do clube. Um gol que não foi apenas decisivo, mas simbólico: a experiência, a raça, a paixão e a trajetória de um jogador que se eterniza junto com o Flamengo. A arquibancada explodiu. Rangel e Julia choraram. Eu e Bianca nos beijávamos, todos abraçados. Naquele instante, parecia que o Monumental respirava com o time, reconhecendo cada esforço, cada suor derramado, cada memória que se cruzava ali.

Andreas Pereira abaixou a cabeça. Uma imagem forte: o protagonista involuntário de uma dor antiga assistindo o Flamengo reescrever sua própria história — e ele, agora adversário, obrigado a olhar. O resto da história vocês sabem.

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Quando o árbitro apitou o fim, o Monumental virou um mar vermelho. Gente chorando, desmaiando, ajoelhando, abraçando desconhecidos. Um ritual coletivo de alívio e glória. Ali o Flamengo se tornou tetracampeão. Ali o estádio se tornou parte do clube e da nossa história. Ainda mais. Ali completamos o que Lima começou em 2019.

E, no meio daquela celebração quase religiosa, lembrei da profecia de Nelson Rodrigues: “Há de chegar talvez o dia em que o Flamengo não precisará de jogadores, nem de técnicos, nem de nada. Bastará à camisa, aberta no arco. E diante do furor impotente do adversário, a camisa rubro-negra será uma bastilha inexpugnável”.

No fundo, no fundo, é isso: a torcida e a camisa do Flamengo são místicas. E Lima, com seu Monumental, se transformou em extensão da Gávea. Como se cada tijolo do estádio carregasse um pedaço da história do clube, igual às paredes do Museu do Flamengo, que guardam memórias de glórias e dores. Ali, em meio à explosão de cor e voz, senti que a memória, a paixão e a história do Flamengo não cabem em um só lugar. Naquele instante, o Monumental U era nosso lar, nossa casa, parte importantíssima de uma glória eterna.

PS – Por agendas de trabalho, tive que mudar o voo de ida com a Latam que, mesmo eu tendo comprado há meses a tarifa cheia, cobrou os olhos da minha cara. É um absurdo como as empresas aéreas assaltam os brasileiros. Procurada pela coluna, a assessoria de imprensa da companhia não comentou. Nada tira o brilho da festa, mas a Latam tentou fortemente…

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