Com um documento embasado em evidências científicas e focado no combate à obesidade de forma equitativa, a Organização Mundial da Saúde (OMS) publicou a primeira diretriz sobre os medicamentos à base de agonistas do GLP-1, caso da semaglutida (Wegovy) e tirzepatida (Mounjaro), as canetas antiobesidade que se popularizaram ao redor do mundo. Na publicação, a entidade relembra que incluiu os remédios na Lista de Medicamentos Essenciais para o tratamento do diabetes tipo 2 em grupos de alto risco em setembro e, com a diretriz, coloca os fármacos como terapias de apoio na luta contra a obesidade, alertando para a necessidade de mais estudos sobre o uso em longo prazo.
Essas conclusões já constavam em análise publicada em outubro pela Cochrane, importante fonte no que diz respeito às evidências científicas, e feita a pedido da entidade. Foram revisados dados de mais de 44 mil participantes de ensaios clínicos randomizados que comprovaram os benefícios das medicações, no entanto, o levantamento alertou para a carência de estudos não financiados pelos próprios fabricantes e abordou os altos preços das medicações.
Na nova diretriz, a OMS recomenda as canetas antiobesidade como parte de um tratamento mais amplo, que engloba a prática de atividades físicas, a alimentação saudável e o acompanhamento médico.
“A obesidade é um grande desafio global de saúde que a OMS está empenhada em enfrentar, apoiando países e pessoas em todo o mundo para controlá-la de forma eficaz e equitativa. Nossas novas diretrizes reconhecem que a obesidade é uma doença crônica que pode ser tratada com cuidados abrangentes e ao longo da vida”, disse, em comunicado, Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da OMS. “Embora a medicação sozinha não resolva essa crise global de saúde, as terapias com GLP-1 podem ajudar milhões de pessoas a superar a obesidade e reduzir os danos associados a ela”, completa.
A entidade demonstra preocupação com o aumento da obesidade, considerando que a doença já atinge mais de 1 bilhão de pessoas e que, no ano passado, esteve ligada a 3,7 milhões de mortes em todo o mundo. Isso porque o excesso de peso está relacionado a doenças cardiovasculares, diabetes tipo 2 e alguns cânceres.
Ainda de acordo com a OMS, o custo econômico com a doença pode atingir 3 trilhões de dólares por ano até 2030. “Esta diretriz pode auxiliar nos esforços para reduzir os custos exorbitantes com saúde associados ao tratamento da obesidade e suas complicações”, diz, em nota, a entidade.
A diretriz foi elogiada por especialistas que acompanham os pacientes que vivem com obesidade, principalmente por estabelecer o uso condicional como parte de um tratamento que envolve mudanças no estilo de vida.
“É um marco, porque o reconhecimento da obesidade como doença aconteceu há pouco mais de uma década e trazer esse grupo de medicamentos como terapia de escolha demonstra o quanto avançamos no cuidado de pessoas que vivem com sobrepeso e obesidade. É também um reconhecimento de que a obesidade carrega situações de risco para a saúde, como a concomitância de diabetes, hipertensão, alteração de colesterol, risco de infarto e derrame”, diz o endocrinologista Alexandre Hohl, diretor da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica (Abeso).
Segundo Hohl, os demais benefícios dos remédios devem ser lembrados. “Esse grupo de medicamentos atua não só na redução do excesso de gordura da adiposidade, mas na melhora do controle metabólico, de glicose, colesterol, triglicérides e redução dos fatores de risco cardiovasculares.”
Ampliação do acesso aos tratamentos antiobesidade
A OMS destaca que esses medicamentos podem ser utilizados em adultos — menos em gestantes — em tratamentos de longo prazo. Porém, explica que a recomendação é condicional “devido aos dados limitados sobre sua eficácia e segurança a longo prazo, manutenção e descontinuação, custos atuais, preparo inadequado do sistema de saúde e potenciais implicações em termos de equidade”.
Neste cenário, orienta a união com intervenções comportamentais, ou seja, mudanças de hábitos dos pacientes, até porque a adoção de dieta saudável e prática de exercícios pode contribuir para os resultados positivos do tratamento.
Evitar disparidades é uma preocupação da entidade. “Mesmo com a rápida expansão da produção, prevê-se que as terapias com GLP-1 alcancem menos de 10% das pessoas que poderiam se beneficiar delas até 2030. A diretriz apela à comunidade global para que considere estratégias para ampliar o acesso, como aquisição conjunta, preços escalonados e licenciamento voluntário.”
Assim, a OMS estabelece três pilares na criação de estratégias:
- Criar ambientes mais saudáveis por meio de políticas robustas em nível populacional para promover a saúde e prevenir a obesidade
- Proteger indivíduos com alto risco de desenvolver obesidade e comorbidades relacionadas por meio de triagem direcionada e intervenções precoces estruturadas
- Garantir o acesso a cuidados centrados na pessoa e ao longo da vida