Um antigo provérbio persa diz que, quando a romã abre seus grãos, os corações se aproximam. É um pensamento adequado a esta época de reunião, ampliando os sentidos em torno desse fruto meio exótico que associamos aos desejos de prosperidade típicos de dezembro.
Não é à toa que os persas olham para a romã com tanta poesia. Do seu antigo território, hoje Irã, vieram alguns dos primeiros vestígios de sua domesticação, datados de cinco mil anos antes de Cristo.
É ainda uma das frutas cultivadas há mais tempo no Mediterrâneo, para onde se espalhou a bordo de navios mercantes. Restos arqueológicos de romã, encontrados em um naufrágio ocorrido no século 14 a.C. na costa da Turquia, mostram que ela já era valorizada comercialmente há muitas eras. Essa disseminação ancestral também contribui para a mística em torno da romã, vista sempre como talismã.
Em casamentos mediterrâneos, quebra-se a fruta no chão para espalhar fertilidade. Em casas turcas, coloca-se uma romã na porta na noite de 31 de dezembro, para atrair prosperidade. Em Portugal como aqui, guardamos suas sementes na carteira.
É uma espécie tão antiga que alguns pensavam ser a árvore do conhecimento do Éden. Aliás, enquanto o nome latino “malum granum” é descritivo e significa “pomo com grãos” – derivando em “melagrana”, no italiano, “pomegranate” em inglês e “granada”, em espanhol –, o nome árabe “rummân” quer dizer “fruto do Paraíso”.
A hipótese de ela ser o signo da tentação foi refutada, mas a romã figura na Bíblia, no Corão e em textos sagrados egípcios. Neles, não só simboliza a abundância que ainda celebramos, mas também sabedoria, imortalidade, renascimento e fertilidade.
Suas características naturais explicam o porquê. Ela suporta severas secas e grandes variações de temperatura. Sua casca resistente protege bem seus grãos numerosos, e por isso era vista como uma fonte de hidratação duradoura em viagens por terras desérticas.
Permanece muito presente nas culinárias do Oriente Médio e também mediterrâneas, que se valem do seu sabor agridoce. Não pode faltar na salada “fatouche” sírio-libanesa e em outras, de ervas e nozes, na Turquia. Seus arilos, as bolsas de suco que revestem cada semente e estalam na boca, dão frescor a essas combinações.
A fruta chegou ao Novo Mundo levada pelos espanhóis, que a valorizavam desde a invasão árabe. A capital desse reino, Granada, deve seu nome à fruta. Por causa disso que há outras cidades assim batizadas do lado de cá do oceano.
Nas Américas, tornou-se ingrediente do prato comemorativo da independência mexicana, os “chiles en nogada”. As pimentas verdes cobertas com um creme de nozes branco e rubras sementes de romã espelham as cores da bandeira.
Além de serem consumidos “in natura”, os grãos rendem o vinagre e o melaço, usados em várias receitas. Além, é claro, do suco. Eu o emprego, ao lado das sementes, num gelado light ótimo para esta época de festas. A grenadine, xarope de coquetelaria, era feito com ela. Mas obtê-lo era custoso, e hoje se usam insumos artificiais e outras frutas.
Isso nos leva ao maior segredo (e à maior lição) da romã: ela nos lembra que a fartura não é dada.
Abrir a romã exige paciência; separar seus grãos requer cuidado; e, para extrair seu suco, é preciso técnica. Os antigos já sabiam: bonança não é sinônimo de excesso, mas conquista do trabalho. Lembremos disso ao expressar nossos desejos.