Sob incursões de drones, líderes da Europa têm acusado a Rússia de liderar uma guerra híbrida, uma estratégia que combina tática militares com outras variadas, como campanhas de desinformação e ciberataques. Nas últimas semanas, o cenário de tensão tornou-se ainda mais palpável: navios russos abordados por países europeus, que suspeitavam de que eram usados como plataformas de lançamento de drones; medo crescente da população frente à invasão do espaço aéreo de várias cidades; e episódios de invasão de softwares.
Na seara dos recentes alertas europeus, o chanceler da Alemanha, Friedrich Merz, disse que o presidente russo, Vladimir Putin, está “travando uma guerra híbrida contra nós” e ampliou o leque das acusações: “Ele está travando uma guerra de informação contra nós. Ele está travando uma guerra militar contra a Ucrânia e essa guerra é dirigida contra todos nós”, bradou à emissora NTV no início deste semana. O coro foi endossado pela presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, nesta quarta-feira, 8.
“Algo novo e perigoso está acontecendo em nossos céus… Isso não é assédio aleatório. É uma campanha coerente e crescente para perturbar nossos cidadãos, testar nossa determinação, dividir nossa União e enfraquecer nosso apoio à Ucrânia”, afirmou von der Leyen em um discurso no Parlamento Europeu em Estrasburgo. “E é hora de chamá-lo pelo nome. Isso é guerra híbrida.”
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Drones pela Europa
A preocupação crescente com a ameaça russa ganhou terreno em setembro, quando uma série de países da Europa relataram a violação de seus espaços aéreos por drones atrelados a Moscou. Polônia, Romênia, Alemanha, Noruega e Dinamarca — membros da Otan, principal aliança militar ocidental, convém lembrar — registraram veículos aéreos não tripulados nos seus territórios — apenas Varsóvia e Bucareste, contudo, conseguiram confirmar que os dispositivos eram, de fato, russos. No caso de Copenhague, os drones forçaram o fechamento de aeroportos pelo país por duas vezes, levando a advertências da premiê.
“Temos que analisar o padrão (de ameaças) e abandonar a perspectiva nacional ao falar sobre segurança na Europa. Com a guerra híbrida em andamento (incursões de drones), temos que olhar para a guerra na Ucrânia não como uma guerra em um país específico, mas como uma tentativa russa de ameaçar a todos nós”, completou. “A guerra híbrida, um dia é na Polônia, no outro, na Dinamarca, e na próxima semana provavelmente será em outro lugar. Então, vejo isso de uma perspectiva europeia. Há apenas um país disposto a nos ameaçar, e é a Rússia, e, portanto, precisamos de uma resposta muito forte.”
A percepção compartilhada, então, é de que um conflito com o país de Vladimir Putin já é uma realidade. No final de setembro, Eliza Manningham-Buller, ex-chefe do MI5, advertiu que o Reino Unido pode já estar em guerra com a Rússia. Em entrevista ao podcast do governo Lord Speaker’s Corner, ela afirmou que o conflito seria caracterizado pelos profundos e intensos ataques cibernéticos, sabotagens e outras atividades hostis orquestradas por Moscou contra a Grã-Bretanha.
Durante a entrevista, Manningham-Buller disse concordar com avaliações de Fiona Hill, reitora da Universidade de Durham e pesquisadora sênior do Brookings Institution. A especialista em Rússia, que atuou no Conselho de Segurança Nacional no primeiro mandato de Donald Trump como presidente dos Estados Unidos, vem argumentando que Moscou já está em guerra com o Ocidente por conta da extensão das operações de sabotagem.
“Acho que ela (Fiona Hill) pode estar certa ao dizer que já estamos em guerra com a Rússia. É um tipo diferente de guerra, mas a hostilidade, os ataques cibernéticos, os ataques físicos e o trabalho de inteligência são extensos”, disse Manningham-Buller.
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Navios na mira
Um navio que se acredita ser parte da “frota sombra” da Rússia, o Boracay, foi abordado pela Marinha Francesa em Saint-Nazaire no último sábado de setembro. A suspeita era de que o petroleiro teria sido usado como plataforma de lançamento de drones contra o espaço aéreo dinamarquês e norueguês. Mas, apesar da progressiva apreensão, a embarcação voltou a navegar rumo ao Canal de Suez poucos dias mais tarde, mostraram dados de sites marítimos.
A desconfiança também fez com que dois outros navios de carga vistos nas proximidades do aeroporto de Copenhague entrassem na lista de embarcações suspeitas. A presença de um submarino russo na costa de Gibraltar, por sua vez, aumentou o nervosismo europeu sobre a intimidação russa. Em paralelo, desde o início da guerra na Ucrânia, o governo de Putin tem sido acusado de sabotar cabos submarinos de internet, seja no Mar Báltico ou na costa do Reino Unido.
“Cerca de 97% da nossa comunicação pela internet passa por cabos submarinos, que são cada vez mais alvos de agentes hostis”, observou Basil Germond, especialista em questões de segurança marítima na Universidade de Lancaster, à emissora francesa France 24.
No contexto de uma guerra híbrida, navios podem conseguir “objetivos práticos” como “mapear a infraestrutura submarina”, explicou Germond, mas também “podem escutar comunicações militares”, coletar informações sobre “linhas de fornecimento de armas” ou sobre a “prontidão de defesa de um país”, como alertou Christian Kaunert, especialista em segurança internacional da Universidade de South Wales, à France 24. De drones a barcos obscuros, passando pela sabotagem, o perigo parece ser iminente para os europeus.