Ex-assessor de Jair Bolsonaro e réu na trama golpista sob a acusação de ter monitorado clandestinamente o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, o coronel do Exército Marcelo Câmara pretende bater às portas da Corte na próxima segunda-feira, 23, com um recurso que tentará recolocá-lo em liberdade.
Entre os argumentos para a ordem de prisão, Moraes considerou que Câmara descumpriu medidas determinadas pelo Supremo, como a proibição de usar redes sociais e de se comunicar com outros investigados, inclusive por meio de intermediários, como o advogado. Neste caso, a defesa do militar pretende alegar que as restrições a redes sociais e a proibição de conversa entre investigados datam de maio de 2024, meses depois das conversas entre Cid e Kuntz, que ocorreram entre janeiro e março daquele ano.
Por esta lógica, na época dos diálogos revelados por VEJA, não haveria impedimento de que Câmara, ainda que por interpostas pessoas, conversasse com o delator. No recurso, dois argumentos extras serão usados para pedir que Moraes reconsidere a ordem de prisão: o de que foi Mauro Cid quem procurou Kuntz para conversar, e não o contrário; e o de que Marcelo Câmara não poderia ser punido com a prisão por atos de terceiros.
A suposta tentativa de acessar o conteúdo da delação premiada de Cid já havia levado outro réu da trama golpista para atrás das grades. Ex-candidato a vice de Bolsonaro, Walter Braga Netto está preso desde o final do ano passado após investigadores apontarem que ele tentou conseguir informações sigilosas sobre os depoimentos do delator e combinar versões com aliados.
No auge da Operação Lava-Jato, um lobista ligado ao ex-ministro José Dirceu perdeu os benefícios de sua delação por ter mentido nas investigações, mas o caso mais escabroso de burla a um acordo de colaboração com a Justiça não levou a grandes punições ao colaborador. Em 2017, VEJA revelou que o empresário Joesley Batista omitiu do Ministério Público dezenas de áudios em que confessava propina a políticos. Mesmo diante de sucessivos pedidos de anulação, a delação premiada foi mantida.
Alexandre de Moraes já negou um pedido dos advogados de Jair Bolsonaro para derrubar o acordo de colaboração de Cid, mas a negativa neste caso, avaliam juristas e interlocutores do STF, embute um misto de jurisprudência e estratégia. Moraes aguardaria a produção de provas extras para definir, no momento da sentença, o futuro do delator.