A economia circular é uma saída que já deveria ter passado da fase de debates e estar em implementação ou ampliação consistente. Diante da emergência climática e das consequências sociais e econômicas, não é possível mais trabalhar para que materiais e produtos terminem a existência após uso único. Ao contrário, qualquer estratégia empresarial tem de buscar vida longa, ou seja, circularidade no que produz e consome. Na indústria de alimentos e bebidas, essa é não apenas uma verdade, mas uma macrotendência. Do uso pleno das matérias-primas (renovabilidade e reciclagem de embalagens, por exemplo) ao upcycling de alimentos, a busca de valor superior se dá pelo entendimento da sustentabilidade como vantagem competitiva.
Se a circularidade se mostra um caminho sem volta nos negócios, é essencial reforçar ainda que falar em economia circular é tratar, obrigatoriamente, e em especial no Brasil, da esfera social: de cidadania a educação, além de remuneração adequada. Ao citar “fase de debates” da economia circular, vejo que ainda há espaço para mais trabalho entre agentes públicos e privados. Um dos sinais é a própria Política Nacional de Resíduos Sólidos. Depois de aprovada, ela demorou mais de dez anos para começar a ser implementada e continua patinando, apesar de importantíssima no combate ao aquecimento global porque impõe ações como reciclagem e uso de resíduos para a geração de energia.
“As cadeias de reciclagem podem transformar a vida de 1 milhão de catadores”
A reciclagem faz parte dessa roda sustentável que deve ser colocada para girar de forma urgente. Não faltam dados para embasar essa certeza: a cada ano, os materiais reciclados economizam 700 milhões de toneladas em emissões de CO2 e a projeção é de 1 bilhão de toneladas até 2030, segundo a Global Recycling Foundation. Mesmo assim, o mundo ainda toma caminhos contrários. Segundo o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, de 1970 para cá, o uso de recursos naturais cresceu de 30 bilhões para 106 bilhões de toneladas e estima-se que a geração de resíduos cresça 56% de 2023 até 2050. Mais: o manejo inadequado dos resíduos representa um custo anual de 361 bilhões de dólares, mas, eliminando o descarte inapropriado, minimizando a produção de resíduos e intensificando a reciclagem, é possível que os governos alcancem economia anual de 108 bilhões de dólares até 2050.
No Brasil, a taxa de reciclagem ainda é sofrível: 5% do que é descartado. Com vontade política e empresarial, esse cenário pode ser redesenhado para além de resultados ambientais, com ganhos sociais. Cadeias de reciclagem podem se tornar fonte potente de transformação na vida de 1 milhão de catadores e catadoras de material reciclável.
Em suma: há muito trabalho a ser feito e cabe ao setor privado assumir também o protagonismo para entender a economia circular muito além do simples compliance legal, mas como fundamental ferramenta de geração de valor e mudança estrutural que envolve também o poder público e a sociedade.
Marco Dorna é presidente da Tetra Pak
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Publicado em VEJA, agosto de 2025, edição VEJA Negócios nº 17