Estamos todos juntos em um hotel, perto do Mall of America, em Minneapolis.
Lugar neutro. Confortável. Sem a pressão da “casa cheia”.
Na teoria, tudo para dar certo.
Na prática, bastaram poucas horas para a tensão aparecer.
Eu queria descanso.
As crianças queriam correr.
Meu marido queria conversar.
Minha cunhada queria resolver pendências.
Minha sogra queria tranquilidade.
Ninguém estava errado.
Mas ninguém estava plenamente atendido.
E ali ficou claro algo que vejo todos os anos no consultório: o Natal não é difícil porque falta amor.
É difícil porque sobra expectativa.
O cérebro odeia incerteza, e o Natal amplifica isso
Do ponto de vista psicológico, o Natal ativa um mecanismo central do cérebro humano: a necessidade de prever.
O cérebro funciona como uma máquina de antecipação.
Ele tenta prever quem estará à mesa, como as pessoas vão se comportar, como você vai se sentir.
E, principalmente, tenta prever que tudo vai dar certo.
Expectativa é uma tentativa de controle.
Quando o cérebro imagina um Natal perfeito, ele não está sendo ingênuo, ele está tentando reduzir incerteza emocional.
O problema é que a realidade raramente obedece ao roteiro.
E quando a realidade não confirma a previsão, o cérebro interpreta isso como ameaça: frustração, irritação, culpa, ressentimento.
Dor é inevitável. Sofrimento é opcional.
Aqui entra uma distinção fundamental da psicologia, especialmente da Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT):
Dor é parte da condição humana.
Sofrimento é o resultado da luta contra aquilo que já está acontecendo.
A dor aparece quando percebemos que o Natal não será como imaginamos.
O sofrimento surge quando insistimos que deveria ser diferente.
“Isso não deveria estar acontecendo.”
“Era para ser mais fácil.”
“Era para estarmos mais felizes.”
Esses pensamentos não aliviam a dor.
Eles a intensificam.
Quando aceitar é mais saudável do que insistir
Aceitar não é concordar.
Não é gostar.
Não é desistir.
Aceitar é parar de gastar energia tentando forçar a realidade a se comportar como um ideal.
Naquela cena no hotel, o Natal ficou mais leve no momento em que algo simples aconteceu: cada um reconheceu seus próprios limites.
Não foi mágico.
Não foi harmônico.
Foi real.
E foi suficiente.
Um convite possível para este Natal
Talvez este Natal não seja sobre fazer dar certo.
Talvez seja sobre parar de exigir que ele confirme uma fantasia.
A pergunta mais útil não é: “Como faço para este Natal ser perfeito?”
Mas sim: “O que está acontecendo aqui, e como posso responder a isso com mais lucidez?”
Quando você solta a expectativa, algo muda.
Não porque a dor desaparece, mas porque ela deixa de virar sofrimento.
Para levar com você
O Natal não é um teste de felicidade.
É um treino de aceitação da realidade como ela é.
E isso, paradoxalmente, costuma ser o que mais aproxima as pessoas daquilo que realmente importa.
Se esse texto te fez pensar, a conversa continua fora do papel.
Estou no Instagram @luanamarques.phd, onde discuto ciência psicológica aplicada à vida real, sem atalhos e sem romantização.
Nos vemos lá. Feliz Natal!