O Teatro Baccarelli, em Heliópolis, na Zona Sul de São Paulo, abriu oficialmente a primeira sala de concertos construída dentro de uma no mundo. O espaço passa a ser a nova casa da Orquestra do Instituto Baccarelli, que oferece aulas de música a 1.650 crianças e jovens da periferia. Heliópolis, a maior favela de São Paulo, tem números impressionantes: cerca de 125 mil a 200 mil habitantes, divididos em 14 glebas, ocupando quase 1 milhão de metros quadrados, sendo uma das maiores comunidades urbanizadas da América Latina e uma das favelas com mais domicílios no Brasil (mais de 20 mil). Para a coluna GENTE, Edilson Venturelli, 61, CEO do Instituto Baccarelli, falou sobre os desafios do processo.
Construir um teatro dentro de uma favela é algo inédito. Qual foi o maior desafio dessa jornada? Foi nunca perder de vista o motivo pelo qual o teatro existe. Nesse período de obra, a gente lidou com tudo: falta de recurso, burocracia, paralização, retomada, ajuste de projeto, mas, no fundo, o mais difícil era não deixar que o desafio transformasse esse sonho em só mais um prédio bonito. Desde o começo, a pergunta era: o teatro vai mudar a vida das crianças de Heliópolis? Cada decisão, do tipo de poltrona ao desenho da acústica, tinha que responder a isso. E fazer isso dentro de uma favela, com todas as urgências do território, exige resiliência.
Como o senhor descreve o impacto dessa inauguração em Heliópolis? O Teatro Baccarelli veio para ser um foco de luz muito forte em Heliópolis. Quando você abre as portas da primeira sala de concertos construída em uma favela, mexe com o imaginário de todo mundo. O lugar que aparecia nos jornais com notícias negativas, passa a ser destino de gente que vem ouvir música, assistir a espetáculos, encontrar beleza.
O que muda na formação desses jovens com um palco desse nível dentro de casa? Muda tudo. A partir de agora, o aluno passa a ter um palco para desenvolver seus estudos. Uma pessoa que se apresenta em um teatro de excelência melhora sua comunicação, sua escuta, aumenta sua autoconfiança, sua postura perante ao público. Esses ensinamentos podem ser aplicados em qualquer área profissional que escolherem. E isso tudo será feito em um espaço com a melhor estrutura oferecida atualmente, e de forma gratuita.
Como a comunidade recebeu a ideia de ter uma sala de concertos na própria vizinhança? A comunidade viu a obra subir tijolo por tijolo, viu moradores trabalhando na construção, viu nossos alunos ensaiando e, principalmente, se reconheceu no palco. Quando o povo de Heliópolis entra e encontra seus filhos, seus vizinhos, seus amigos se apresentando, a chave vira. Hoje escuto frases que me emocionam, como: ‘Esse teatro é nosso’, ‘A cultura está chegando cada vez mais na favela’. É isso que a gente queria desde o começo: que o Teatro Baccarelli fosse, antes de tudo, uma casa.
