Penalizado no mês passado com sanções do governo Donald Trump que podem levar instituições bancárias a bloquear valores e ficarem impedidas de se relacionar com qualquer empresa com relações comerciais com os Estados Unidos, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes é o pivô de um imbróglio político e comercial desde que, sob a falsa alegação de que atua como um contumaz violador de direitos humanos, foi incluído entre os penalizados da Lei Magnitsky.
Como se sabe, a tensão foi elevada a novo patamar depois que o também ministro do STF Flávio Dino decidiu que nenhuma ordem executiva ou judicial estrangeira, como as relacionadas à Magnitsky, pode ser cumprida de forma imediata no Brasil. O veredicto de Dino levou as ações de bancos a quedas expressivas e a perdas que ultrapassaram 41 bilhões de reais em valor de mercado num único dia, mas a saída para as instituições financeiras e companhias que pensam em respeitar no Brasil as sanções da Casa Branca pode passar por um único homem: o presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Herman Benjamin.
Para evitar que as empresas possam ter de decidir entre desobedecer a Dino e serem processadas no Brasil ou afrontar a Magnitsky e colocar em risco todas as suas operações no exterior, uma saída jurídica é pedir aval do STJ para validar a sentença estrangeira para aplicação no Brasil. Desde 2004, cabe à presidência do STJ, e não mais ao Supremo, o papel de homologar decisões tomadas fora do país para que tenham validade dentro das fronteiras brasileiras.
O STJ já autorizou, por exemplo, o confisco de bens por lavagem de dinheiro na Finlândia, uma condenação bilionária por exploração no Equador e mais recentemente a prisão do ex-jogador de futebol Robinho, sentenciado por estupro na Itália. No cabo de guerra com Alexandre de Moraes, já está na mesa de Benjamin um pedido das empresas americanas Rumble e Trump Media para que o juiz do STF seja notificado em uma ação em que é acusado de censura contra cidadãos e empresas americanas.
No caso de bancos brasileiros, que temem ser punidos em uma segunda fase da Magnitsky por terem vínculo com os Estados Unidos, uma saída jurídica é apresentar ao STJ o que se chama de exequatur, ou um pedido para executar uma sentença estrangeira no Brasil. Por essa lógica, explica o professor de Direito Internacional da Universidade de Brasília (UnB) Vladimir Aras, o Banco do Brasil, por exemplo, poderia cancelar o contrato de Alexandre como correntista desde que pedisse aval do STJ para isso — e ainda teria o direito de alegar que o está excluindo porque, ao se debruçar sobre o princípio da devida diligência sobre o cliente, no qual se aferem os antecedentes e riscos que o alvo representa, concluíram que Moraes foi penalizado pela Magnitsky e precisaria ser punido.
“A medida ativa seria pedir que a decisão americana seja reconhecida no Brasil. É exatamente o que a Rumble está fazendo, é exatamente o que aconteceu no caso Robinho, quando a sentença da Itália precisou ser homologada pelo STJ antes de ele ser levado para a cadeia”, diz Aras.
Para além da ação jurídica, a medida embute também um ardil. Ao bater às portas do STJ, o banco ganha junto ao Tesouro americano e à Ofac, o órgão responsável pelas sanções, o argumento de que está em trâmite para cumprir a decisão da Magnitsky. “Os bancos vão ganhando tempo, já que não são situações que se resolvem de imediato. É preciso fazer um jogo processual para ganhar tempo e as questões irem amadurecendo”, completa o professor.
Se o STJ autorizar, o dilema mais imediato está resolvido. Se Benjamin recusar o pedido por ofensa à soberania brasileira, por exemplo, Aras vê um outro caminho: entrar com um processo nos Estados Unidos, alegar que tentou cumprir a ordem de Donald Trump, mas que foi impedido e com isso obter alguma medida protetiva na jurisdição americana.