Esperava-se mais da Câmara dos Deputados, em especial nessa semana que começou com a execução do delegado aposentado da Polícia Civil (PC) de São Paulo Ruy Ferraz Fontes – a tiros de fuzil, numa rua de Praia Grande, no litoral paulista. Bom lembrar que o delegado Fontes foi o chefe da PC paulista e, no início de sua carreira, investigou a cúpula da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC).
Como muito bem colocou o senador Alessandro Vieira em sua manifestação de ontem no Senado Federal, “nada pode ser mais urgente do que resgatar nosso país do crime organizado”.
Contudo, no dia seguinte à execução de Fontes, a Câmara dos Deputados aprovou a chamada PEC da Blindagem – que dá poderes ao Congresso para barrar ações penais contra os próprios congressistas, e, um dia depois (ontem), praticamente em sequência, aprovou urgência para a anistia aos golpistas – condenados pela tentativa de golpe de estado contra o resultado das eleições de 2022, incluindo os atos de destruição e vandalismo de 8 de Janeiro de 2023.
Esse dois verdadeiros pacotões da impunidade – se ultimadas suas respectivas tramitações – estarão a contemplar uma enorme gama de criminosos… de ontem, de hoje e de amanhã.
Com a aprovação da anistia, estarão contemplados os vândalos que depredaram o patrimônio público no 8 de Janeiro, o ex-presidente Jair Bolsonaro e seu staff de golpistas; e com a PEC da Blindagem, estarão contemplados – principalmente – os congressistas que estão desviando centenas de milhões de reais em recursos via emendas parlamentares. E é exatamente aí, nesse ponto, que a PEC da Blindagem quer chegar.
Inacreditáveis essas duas aprovações, mormente se considerarmos a existência de matérias importantes a serem votadas ou deliberadas, como a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar os avanços do crime organizado no país – pendente de instalação até hoje, e como o Pacote Anticrime do Ministério da Justiça e Segurança Pública, também aguardando decisões e ultimações do Parlamento.
A cara de pau e a desfaçatez da classe política brasileira – com algumas poucas exceções – não têm mais limites.
E não é mais novidade para ninguém que as organizações criminosas já se encontram financiando campanhas eleitorais para cadeiras na Câmara dos Deputados. O que nos faz concluir que desgraçadamente também estarão contemplados com essa PEC da Blindagem os parlamentares que atuam no Congresso pelos interesses dessas facções e grupos criminosos.
Esse, por si só, já era um motivo e tanto para que essa PEC da Blindagem não fosse sequer cogitada.
E, por fim, querem recriar, no Brasil, a figura dos “intocáveis”, só que nessa versão – ao contrário da célebre equipe da Polícia do Tesouro dos EUA dos anos 1930 – os “intocáveis” serão criminosos de terno e gravata, escolhidos e mantidos por nós, para conspirarem contra nossos interesses e desviarem recursos públicos.