A nova chefe do serviço de inteligência do Reino Unido, o MI6, planeja lançar um alerta sobre a crescente ameaça que a Rússia representa em seu primeiro pronunciamento oficial, nesta segunda-feira, 15. Segundo informações divulgadas pelo jornal britânico The Guardian, a diretora-geral Blaise Matreweli vai declarar que “a linha de frente está em toda parte” devido às ações promovidas por Moscou.
O discurso de Matreweli denuncia a Rússia como uma ameaça aguda, que promove planos de assassinato, manipulação de informações, sabotagem e ataques cibernéticos, tudo isso orientado pela mentalidade “agressiva, expansionista e revisionista” do presidente Vladimir Putin, cuja consequência mais palpável é a invasão da Ucrânia.
“A exportação do caos é uma característica, e não um defeito, da abordagem russa em sua atuação internacional”, diz o discurso, de acordo com as declarações obtidas antecipadamente. Na visão de “C” — letra atribuída ao líder do MI6 —, Londres enfrenta uma “era de incertezas” em que as regras em torno de conflitos estão sendo reescritas.
Em sua declaração, a líder da inteligência britânica deve reconhecer as táticas agressivas promovidas pelo presidente russo, e argumentar que isso continuará “até que Putin seja forçado a mudar”. Matreweli também pretende reiterar o apoio do Reino Unido a Ucrânia, afirmando que a ajuda de Londres é “duradoura”. “A pressão que exercemos em nome da Ucrânia será mantida”, diz o texto, segundo o Guardian.
O chefe do Estado-Maior da Defesa britânica, o Marechal do Ar Richard Kinghton, deve fazer comentários semelhantes durante sua primeira palestra anual no think tank Royal United Service Institute (RUSI). “A situação é mais perigosa do que qualquer outra que eu tenha visto durante minha carreira”, diz sua declaração, que apela ainda para que o Reino Unido “intensifique seus esforços”.
“A guerra na Ucrânia demonstra a disposição de Putin em atacar os estados vizinhos, incluindo suas populações civis”, continua o discurso do chefe do Estado-Maior, segundo visto pelo Guardian, que também argumenta que a Rússia deseja “desafiar, limitar, dividir e, em última instância, destruir a Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte)“. Na visão de Kinghton, o sucesso da retomada militar britânica depende da reconexão entre defesa e sociedade, para que o tema se torne “uma prioridade nacional”.
Os discursos ocorrerão às vésperas de uma viagem do primeiro-ministro do Reino Unido, Keir Starmer, a Berlim, onde realizará uma cúpula emergencial com diversos líderes europeus, incluindo o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, e o enviado especial dos Estados Unidos, Steve Witkoff.
A reunião deve marcar um esforço para persuadir Washington a aceitar um plano de paz alternativo para a Ucrânia, uma vez que o presidente americano, Donald Trump, vem pressionando Kiev a assinar um acordo que prevê a concessão de territórios a Moscou — algo que Zelensky já disse ser uma “linha vermelha”, embora mais recentemente tenha acenado para a possibilidade de levar o tema a consulta pública por meio de um referendo.
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Tensão crescente
As tensões entre Reino Unido e Rússia vêm escalando lentamente ao longo dos últimos anos. Londres entende que Moscou promove um grande esforço para utilizar inteligência artificial como uma ferramenta de desinformação em larga escala contra o território britânico, divulgando vídeos nas redes sociais para minar o apoio público à Ucrânia ou espalhar boatos falsos sobre a saúde da Princesa de Gales, Kate Middleton, que se encontra em remissão após tratar um câncer.
Episódios fora da esfera online também agravam a preocupação do Reino Unido. Em 2018, o ex-espião russo Sergei Skripal e sua filha, Yulia, foram alvo de uma tentativa de assassinato por envenenamento em Salisbury. O agente tóxico utilizado por Moscou no caso foi o novichok, que levou à morte de uma inglesa de 44 anos chamada Dawn Sturgess, que teria sido exposta ao veneno após ser descartado.
Outra ação do Kremlin ocorreu em maio, quando a justiça britânica determinou a prisão de seis búlgaros acusados de envolvimento em um plano de espionagem que incluía a vigilância de um jornalista investigativo conhecido por produzir matérias sobre a Rússia, e uma tentativa de obter o número telefônico de soldados ucranianos que estariam realizando treinamento na Alemanha.
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Nomeação histórica
Aos 47 anos de idade, Blaise Metreweli é a primeira mulher a ocupar o cargo de chefe do MI6. Ela foi efetivada em outubro, substituindo o ex-diretor-geral Richard Moore. Anteriormente responsável por liderar o departamento de tecnologia e inovação do serviço de inteligência, Metreweli passou a maior parte de sua carreira no Oriente Médio e na Europa, e sua gestão deve centrar-se em capacidades tecnológicas.
“O domínio da tecnologia deve permear tudo o que fazemos. Não apenas em nossos laboratórios, mas também em campo, em nossas práticas e, ainda mais importante, na mentalidade de cada policial. Devemos ter a mesma familiaridade com linhas de código que temos com fontes humanas, a mesma fluência em Python que temos em vários outros idiomas”, deverá afirmar a nova líder durante seu discurso inicial.
Metreweli pretende dar ênfase à importância do MI6 se manter atualizado no que diz respeito às tendências em computação, ao mesmo tempo em que mantém sua especialidade tradicional: o uso eficaz de fontes humanas. Ela também fará referência à dimensão moral do poder da alta tecnologia, afirmando que utilizá-la com sabedoria é o “grande desafio do século XXI”.