O Nepal anunciou nesta sexta-feira, 12, a nomeação de Sushila Karki como primeira-ministra interina, em uma tentativa de conter os explosivos protestos anticorrupção no país. Até o momento, ao menos 51 pessoas foram mortas e mais de 1.300 feridas nas manifestações, cujo estopim foi a proibição generalizada de redes sociais no território nepalês. Em meio ao caos, 12 mil detentos conseguiram fugir de prisões ao redor do país — alguns deles, contudo, foram presos enquanto tentavam entrar na Índia.
Karki, de 73 anos, foi a única mulher a ter presidido a Suprema Corte do Nepal e, agora, torna-se a primeira premiê da história do país. Sua escolha é vista como símbolo de combate à corrupção — principal bandeira da juventude, que lidera os protestos contra o governo deposto de KP Sharma Oli. A posse de Karki, realizada na residência presidencial e transmitida pela TV estatal, foi um gesto de apaziguamento após uma semana marcada por confrontos, incêndio no Parlamento e toque de recolher em várias cidades.
O Parlamento foi dissolvido para viabilizar a posse de Karki, que não é deputada, e novas eleições deverão ser convocadas. Considerada uma figura de consenso, ela conta com apoio dos movimentos juvenis, mas enfrenta resistência de grupos ligados à antiga elite política. Desde a queda da monarquia, o Nepal enfrenta sucessivas trocas de governo e crise econômica, o que empurra milhões de jovens para o trabalho precário no exterior.
+ Mais de 50 pessoas morreram e centenas ficaram feridas em protestos no Nepal
Revolta e insatisfação
A crise começou na segunda-feira, 8, quando a repressão a protestos contra corrupção e censura deixou mais de 20 mortos. No dia seguinte, manifestantes incendiaram prédios públicos e o então premiê Oli renunciou, abrindo caminho para que os militares assumissem o controle da segurança. O Exército afirma ter recuperado mais de 100 armas saqueadas durante a onda de violência.
O estopim da revolta foi a decisão do governo de bloquear 26 plataformas de redes sociais, mas a medida rapidamente desencadeou uma onda de insatisfação contra corrupção endêmica, desigualdade econômica e a concentração de poder nas mãos de uma elite política envelhecida. Os protestos expõem a frustração da Geração Z, que denuncia o abismo entre a vida luxuosa dos filhos da elite política, apelidados de “nepo kids”, e a realidade de um país em que o desemprego atinge sobretudo os jovens.
Nas semanas que antecederam os violentos atos, vídeos e fotografias que pretendiam denunciar o estilo de vida opulento desfrutado pelos filhos dos governantes do país inundaram as redes sociais. As imagens que viralizaram mostram herdeiros de ex-primeiros-ministros ostentando bolsas de grife e carros importados, relógios de milhões de dólares em uma pilha de presentes de Natal, embarcando em viagens luxuosas, ou jantando em restaurantes caros.
Cerca de 25% da população vive abaixo da linha de pobreza nacional, proporção alta mesmo para os padrões da região. Palco de constantes escândalos, o Nepal é classificado pela Transparência Internacional como um dos países mais corruptos da Ásia. Recentemente, investigações revelaram o desvio de US$ 71 milhões na construção de um aeroporto na cidade de Pokhara, bem como um esquema de venda de vistos para jovens buscarem emprego nos Estados Unidos sob a falsa identidade de refugiados. Em ambos casos, ninguém foi indiciado.