Cresci às margens de um ribeirão em Santana da Vargem, um povoado do interior de Minas Gerais. Hoje, a cidade tem 5 000 habitantes, mas na minha época de criança era ainda menor. Era um lugar muito pacato, com poucos recursos. Fui criado ali. Aos 13 anos, comecei a trabalhar — e fazer tudo o que aparecia, porque as opções eram bastante escassas. Meu pai era militar. Eu queria continuar na escola, mas não tive outra opção. Como a vida era dura, ele me colocou na linha desde cedo.
Trabalhei como servente de pedreiro, balconista de bar, dirigi trator, furei fossa e ajudei até a carregar e descarregar mercadorias de caminhão. Fui fazendo tudo isso na minha juventude. Mas eu queria ter um trabalho mais tranquilo. Sempre tomei sol o dia inteiro e carreguei peso, mas chegou um momento em que não suportava mais aquela rotina. Foi só quando comecei a vender bijuteria de porta em porta que vi que dava para ganhar dinheiro sem carregar peso, ou seja, sem usar a força dos meus braços. Comecei a gostar daquilo.
Com o dia a dia mais leve, passava os fins de tarde na drogaria de um amigo batendo papo e via os representantes comerciais trabalhando por lá. Eles sempre apareciam bem arrumados e com bons carros. Eu ficava de olho e imaginava o que seria preciso fazer para ser como eles. O salário era muito melhor do que o que eu ganhava e não havia exigência de faculdade. Parecia perfeito para mim.
Acabei me aproximando dos representantes comerciais até conseguir uma vaga. Fui trabalhar numa distribuidora de medicamentos em Ribeirão Preto, no interior de São Paulo. Aquilo representou a realização de um sonho para mim. Eu tinha 25 anos e logo depois dei mais um passo importante. Entrei numa rede de drogarias e ali fiquei doze anos, aprendendo tudo o que sei. Foi a minha “faculdade”.
Descobri as fragilidades do negócio, rodando lojas por todo o Brasil. Estudei tanto que virei uma espécie de consultor para redes de farmácias independentes do interior mineiro. Um amigo então me convidou para ser gerente de duas lojas da drogaria Americana em Varginha, Minas Gerais. Quando cheguei, o faturamento combinado dessas duas lojas era de 750 000 reais. Em dois anos, saltou para 2 milhões de reais. Em três, me tornei o principal sócio do negócio, que viria a ser o Grupo AMR.
Comecei a investir em franquias. Fiz barulho com um programa de descontos agressivos e televendas, o que era uma novidade no começo dos anos 2000. Logo já tinha aberto cerca de cinquenta lojas. Uma farmácia levava à abertura de outra. Confesso que tudo aconteceu tão rápido que comecei a ter problemas para dar o apoio necessário aos franqueados. Tinha que ensinar tudo, desde a área contábil até a jurídica. O franqueado só tinha o dinheiro, mas a experiência era minha. Então, passei a tratá-los como uma rede. Hoje, o Grupo AMR tem 450 lojas e fatura 1,4 bilhão de reais por ano. Quero chegar aos 3 bilhões de reais em receitas até 2028 e dobrar o número de lojas que temos no Nordeste. Vamos chegar lá.
Foi difícil fazer as pessoas acreditarem no projeto. Os fornecedores estavam acostumados a fazer negócios com grandes redes. Hoje tenho vários parceiros que haviam fechado a porta para mim lá atrás. Vários deles chegaram a me desprezar, rir das minhas propostas. Ouvi que era louco, que não ia dar certo. Mas acho que a gente consegue o que quer quando corre atrás do nosso maior sonho. Na vida, tudo é possível. Nunca deixei os “nãos” que levei me barrarem. Muitas vezes, só ganhava o dinheiro para pagar a gasolina, mas nunca desanimei. Ter coragem foi minha opção de vida. Nunca vou falar “não” para mim.
Jefferson Reis em depoimento a Pedro Gil
Publicado em VEJA de 4 de julho de 2025, edição nº 2951