Um dos objetos mais raros do sistema solar está no centro de uma polêmica internacional. O NWA 16788, maior meteorito marciano já encontrado na Terra, foi vendido no mês passado por US$ 5,3 milhões (cerca de R$ 29 milhões) em um leilão da Sotheby’s, em Nova York. O comprador não foi identificado — e, segundo o governo do Níger, país africano onde a rocha foi descoberta em novembro de 2023, a exportação pode ter sido ilegal.
A peça pesa 25 quilos e mede quase 38 centímetros, cerca de 70% maior que o segundo maior fragmento marciano já registrado. De acordo com especialistas, ela se formou a partir do resfriamento lento de magma em Marte e foi ejetada do planeta por um impacto de asteroide há milhões de anos, viajando cerca de 225 milhões de quilômetros até cair no deserto do Saara.
Como a rocha foi parar em Nova York
Segundo o catálogo da Sotheby’s, o meteorito foi encontrado na remota região de Agadez, no Níger, por um caçador de meteoritos, e depois vendido a um comerciante internacional. Antes de ir a leilão, passou por uma galeria privada na Itália e foi exibido na Agência Espacial Italiana, em Roma. Duas fatias foram preservadas na Universidade de Florença para pesquisa científica.
O governo do Níger afirma que não foi informado sobre a descoberta ou saída da rocha e abriu uma investigação com participação dos ministérios de Minas, Segurança, Justiça e Educação Superior. A administração local suspendeu temporariamente a exportação de meteoritos e pedras preciosas, alegando que o caso “tem todas as características de tráfico internacional ilícito”.
A Sotheby’s nega qualquer irregularidade e diz que “o NWA 16788 foi exportado do Níger e transportado de acordo com todos os procedimentos internacionais relevantes” e que a documentação estava em ordem em todas as etapas.
Quem é dono de um meteorito?
A disputa reacende um debate antigo: quem tem direito sobre meteoritos que caem na Terra? As regras variam de país para país. Nos Estados Unidos, por exemplo, se um meteorito cai em propriedade privada, ele pertence ao dono do terreno. No Marrocos — um dos principais exportadores de meteoritos —, caçadores precisam de licença e parte do material é destinada ao governo.
O Níger não possui lei específica sobre meteoritos, mas tem legislação de 1997 para proteger seu patrimônio cultural, que inclui “espécimes mineralógicos raros” — categoria que alguns juristas dizem poder abranger meteoritos.
Além da questão legal, há um lado científico. Apenas cerca de 400 meteoritos marcianos são conhecidos, e eles são a única forma de estudar fragmentos de Marte sem enviar missões tripuladas ao planeta. Muitos cientistas defendem que peças tão raras deveriam estar em museus e universidades, não em coleções privadas.
Enquanto o impasse segue, o NWA 16788 permanece como a maior peça de Marte conhecida no planeta Terra — e, agora, também como protagonista de uma disputa que pode redefinir as regras sobre tesouros vindos do espaço.