Deputados do PL na Câmara passaram a divulgar uma das versões do chamado PL da Anistia. Elaborada por professores ligados ao bolsonarismo, a minuta é ampla: não se limita ao perdão dos envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023 e alcança o ex-presidente Jair Bolsonaro, alvo de investigações e hoje inelegível por decisão da Justiça Eleitoral.
O projeto estabelece como marco o início do governo Bolsonaro, em março de 2019, quando o inquérito das fake news foi aberto pelo Supremo Tribunal Federal. A anistia seria concedida a todos que tenham sido ou possam vir a ser investigados, processados ou condenados por condutas que vão de ataques a instituições públicas até a incitação de crime, passando por descrédito ao processo eleitoral e disseminação de animosidade política. A proposta ainda prevê o arquivamento de investigações em curso e o cancelamento de multas, indenizações e restrições de direitos impostas por decisões judiciais ou administrativas.
O texto dedica atenção específica aos participantes dos atos golpistas em Brasília. Garante perdão a quem prestou apoio administrativo, logístico ou financeiro às mobilizações e a quem praticou depredação de prédios públicos, deterioração de patrimônio tombado, organização ou associação criminosa e até constituição de milícia privada. O benefício se estende também a ilícitos civis, administrativos e eleitorais, afastando inelegibilidades já decretadas ou que venham a ser estabelecidas pela Justiça Eleitoral. Na prática, a medida restabeleceria a possibilidade de candidatura de Bolsonaro em 2026.
Segundo apuração do Radar, circulam outras duas versões do PL da Anistia. Uma é de autoria do deputado Rodrigo Valadares, que chegou a ser relator da matéria na Câmara. A outra foi elaborada pelo deputado Eduardo Bolsonaro em parceria com o jornalista Paulo Figueiredo, atualmente nos Estados Unidos, onde articulam com aliados a imposição de sanções internacionais contra o governo Lula e contra o Supremo Tribunal Federal. Nos bastidores, a avaliação entre bolsonaristas é de que a versão de Eduardo e Figueiredo é ainda mais irrestrita, o que reduziria as chances de prosperar no Congresso.
Leia a minuta na íntegra:
O CONGRESSO NACIONAL decreta:
Art. 1º. Fica concedida anistia a todos aqueles que, no período compreendido entre 14 de março de 2019 e a data de entrada em vigor desta Lei, tenham sido ou estejam sendo ou, ainda, eventualmente, possam vir a ser investigados, processados ou condenados em razão de condutas:
I – que constituam manifestações verbais ou escritas, inclusive as proferidas em vias públicas, páginas da internet, redes sociais, órgãos públicos, meios de comunicação ou quaisquer outros canais, que tenham sido ou possam ser consideradas como:
a) ofensa ou ataque a instituições públicas ou seus integrantes;
b) descrédito ao processo eleitoral ou aos Poderes da República;
c) reforço à polarização política;
d) geração de animosidade na sociedade brasileira;
e) situações de natureza assemelhada às anteriores.
II – qualificadas como crime no Título XII do Decreto-Lei nº 2.868, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal.
III – associadas, de qualquer modo, àquelas mencionadas nos incisos I e II, incluindo:
a) a prestação de apoio administrativo, logístico ou financeiro, bem assim qualquer outra forma de contribuição, estímulo ou incentivo;
b) dano contra o patrimônio da União, deterioração de patrimônio tombado, incitação ao crime, apologia de crime ou criminoso, organização criminosa, associação criminosa ou constituição de milícia privada.
IV – apuradas:
a) em inquéritos instaurados com base no art. 43 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal;
b) com o apoio de informações, notícias ou relatórios produzidos com a colaboração da Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação do Tribunal Superior Eleitoral ou órgão integrante da Justiça Eleitoral que exerça ou tenha exercido funções semelhantes.
V – consideradas como manifestações voltadas à produção ou veiculação de desinformação ou dados inverídicos em relação a partidos, candidatos, governos, eleições ou agentes políticos.
§ 1º. A anistia a que se refere esta Lei afasta automaticamente quaisquer efeitos da condenação penal, bem como determina o arquivamento de inquéritos, investigações e processos criminais em curso.
§ 2º. A anistia alcança, ainda:
I – os efeitos decorrentes de medidas cautelares e liminares em vigor, multas e indenizações, inclusive por danos morais, bem como quaisquer restrições de direitos impostas, judicial ou administrativamente, em razão das condutas de que trata o caput;
II – procedimentos a serem instaurados com o objetivo de responsabilizar pessoas por condutas praticadas no período referido no caput, desde que enquadradas nas hipóteses desta Lei;
III – ilícitos civis, administrativos e eleitorais vinculados ou associados às condutas referidas no caput, afastando-se, inclusive, todas as inelegibilidades já declaradas ou que venham a ser declaradas pela Justiça Eleitoral contra os beneficiários desta Lei;
IV – os crimes políticos ou conexos, eleitorais e aqueles que tiveram seus direitos sociais e políticos violados.
§ 3º. Para os fins do inciso I do caput, a noção de manifestações de rua alcança também as movimentações e acampamentos ocorridos em frente a prédios, sedes e equipamentos administrados por instituições militares, bem como os protestos ocorridos na capital federal em 8 de janeiro de 2023.