“Bem-vindos ao futuro”, diz com seriedade Stella Bak, vivida por Greta Lee, na abertura da quarta temporada de The Morning Show, série da Apple TV+ que acaba de ganhar uma nova leva de episódios, lançados semanalmente às quartas-feiras na plataforma. A presidente do UBA, canal de TV americano fictício, apresenta à equipe uma ferramenta inovadora de inteligência artificial capaz de traduzir em tempo real a fala dos jornalistas, originalmente dita em inglês, para quarenta idiomas — isso, mantendo suas vozes e entonações originais. O programa servirá para expandir o alcance da cobertura dos Jogos Olímpicos de Paris de 2024, encabeçada pela âncora Alex Levy, vivida por Jennifer Aniston. A novidade causa receio e empolgação na mesma medida: alguns temem ser substituídos pela tecnologia, outros vislumbram o aumento de audiência — e o corte de custos, claro. Alex, que é do time dos otimistas, revê sua opinião quando é vítima de deepfake: um vídeo manipulado muda suas falas e a coloca na mira do governo americano. “O uso indevido da IA me assusta”, disse Jennifer, produtora-executiva da série, em entrevista a VEJA (leia mais abaixo).

The Morning Show — que também é o título do programa que está no centro da trama — narra histórias fictícias amparadas por eventos reais recentes e discussões atuais: a primeira temporada nasceu embalada pelo #MeToo, com um âncora demitido por assédio, enquanto a quarta explora a confiabilidade na era da desinformação e da IA. Há décadas a curiosidade sobre o trabalho jornalístico rende filmes e séries de sucesso. No cinema, dominam os casos reais de grande relevância, do clássico Todos os Homens do Presidente (1976), sobre a divulgação do caso Watergate, a Spotlight — Segredos Revelados (2015), que ganhou o Oscar de melhor filme ao retratar o trabalho dos repórteres que descobriram casos de abusos na Igreja Católica. Já as séries de TV costumam dar ao ofício ares folhetinescos: a própria The Morning Show oferece uma dose alta de melodrama. Em outro viés, a excelente The Newsroom (2012-2014), da HBO, do gabaritado roteirista Aaron Sorkin, ganhou cores de thriller ao observar a correria insana de um telejornal diário e os perigos da profissão. Já The Paper, derivada da sitcom The Office, que chega na quinta-feira 25 na HBO Max, ironiza um grupo desajustado tentando recuperar um jornal impresso falido.

Seja qual for o tom, em tempos de fake news abundantes, essas tramas se tornaram ainda uma espécie de serviço público ao mostrar o processo de checagem de uma notícia no jornalismo profissional, as diferenças entre fatos e opiniões, e as consequências da mentira. “Tem sido interessante aprender como funciona a investigação jornalística e a relação com fontes”, diz Reese Witherspoon, também produtora e coprotagonista ao lado de Jennifer na trama. Nessa nova temporada, sua personagem, Bradley, retorna ao posto de âncora e tenta se redimir após limar de uma reportagem a imagem de seu irmão no ataque de 6 de janeiro ao Capitólio. Instruída a ficar quieta na função de apresentadora de variedades, Bradley não aguenta e investiga uma denúncia anônima de crime ambiental. Enquanto isso, Alex é promovida a chefona da emissora e se vê dividida entre a veia de repórter e as obrigações administrativas e financeiras. Nos bastidores da notícia, a emoção é garantida.
“Admiro muito os jornalistas”
Jennifer Aniston e Reese Witherspoon falaram a VEJA sobre The Morning Show.

Após quatro temporadas, como veem o trabalho jornalístico?
Jennifer: Admiro muito os jornalistas. É um trabalho duro e perigoso.
Reese: E que ficou mais difícil num mundo cheio de distrações, onde é complicado manter a atenção das pessoas e dizer a verdade.
O que destacam como tema essencial dessa nova fase da série?
Jennifer: O uso indevido da IA é assustador. Palavras e imagens podem ser manipuladas para transmitir mensagens falsas como se fossem verdadeiras. Já aconteceu com a gente na vida real.
Reese: Minha personagem investiga um crime ambiental. Foi interessante aprender como funciona a investigação jornalística e a relação com fontes, e o que pode ou não ser revelado quando grandes corporações estão envolvidas.
Jornalistas estão sempre conectados aos acontecimentos diários, o que pode ser uma fonte de ansiedade. Sentiram isso na série ao retratar o dia a dia de um jornal?
Reese: Nós conversamos muito sobre as notícias, mas eu tento não me deixar ser bombardeada por elas. Sou uma pessoa muito emotiva, então tomo cuidado ao decidir o que vou internalizar.
Jennifer: Sim, especialmente notícias sobre as quais não temos nenhum poder para mudá-las. Eu realmente acho que não fomos programados para receber tanta informação diária como temos hoje. Então, é preciso ser consciente e não exagerar nesse consumo.
Como atrizes, vocês também são notícia. Costumam ler o noticiário de celebridades?
Jennifer: Não, nunca. Acho que, de tudo que é publicado, no máximo 1% é verdade. Mas a maior parte não é. Exceto se for uma entrevista.
Reese: Eu realmente não leio nada porque, como disse, sou emotiva e, se o texto tiver 100 elogios e uma crítica, vou focar isso e ficar chateada. Aprendi que não é bom para mim, então é melhor ignorar.
Publicado em VEJA de 19 de setembro de 2025, edição nº 2962