“Eu respeito a independência dele; no entanto, espero que ele conclua independentemente que são as minhas opiniões que devem ser seguidas”. Quem disse isso não foi Donald Trump ou Lula da Silva, ambos eventualmente em guerra com presidentes do Banco Central. A posição politizada foi dita, em tom jocoso, por Richard Nixon.
Um dos motivos pelos quais seu nomeado, Arthur Burns, é considerado um dos piores, talvez o pior, presidentes do Federal Reserve decorre justamente do suas concessões à política num momento em que os Estados Unidos precisavam do remédio amargo dos juros altos.
Hoje todos se lembram de Nixon pela renúncia decorrente do escândalo de Watergate, mas seu governo, para os cidadãos da época, ficou marcado pelos problemas econômicos – e talvez a precariedade política tenha decorrido também disso. É difícil acreditar, mas Nixon congelou preços e salários (além de suspender a convertibilidade do dólar). Nem assim impediu uma inflação de 12,2%.
A inflação hoje é de 2,4% e as previsões catastrofistas de uma forte acelerada nos preços por causa do aumento das tarifas sobre produtos importados não se confirmaram. Mesmo assim o presidente do Fed, Jerome Powell, se mantém na faixa de juros de 4,25%-4,50%.
VENENO DA QUIMIOTERAPIA
Parece uma maravilha pelos padrões brasileiros, mas pesa em tudo, desde os gastos com rotativo dos cartões de crédito, um vício americano insuperável, até novos investimentos na economia, sem contar os efeitos sobre os juros da dívida. Trump, que cresceu como incorporador tomando empréstimos para empreendimentos imobiliários, é um inimigo existencial dos juros altos.
Aliás, como todo mundo. Ninguém gosta de dinheiro caro, que já foi definido como uma quimioterapia que envenena o paciente para salvá-lo.
Trump faz campanha pesada, inclusive inventando um apelido, “Too Late” ou “Atrasadão”, para o advogado que fez carreira no mercado financeiro, onde todo mundo o chama de Jay Powell. “O Atrasadão deveria pedir demissão imediatamente”, postou ele. O mercado sempre reage mal a estes ataques, como já vimos, inclusive, no Brasil, porque sinalizam um afrouxamento inflacionário.
Mas o presidente precisa de resultados rápidos – ou pelo menos de boas desculpas. O crescimento do PIB este ano foi fraco, justamente por causa das tarifas que assombraram tantos negócios, e a queda de popularidade de Trump está se acelerando – 46,4% de aprovação 50,2% de desaprovação, pela média das pesquisas do RealClear.
CURTO PRAZO
Powell tem que manter a cabeça fria e o estoicismo ativado. “Não é permitido por lei”, filosofou quando perguntado se o presidente poderia forçá-lo a pedir demissão. Um atalho seria atacá-lo por causa dos custos de reformas na sede do Fed, mas isso demoraria um tempo enorme, sem garantia de que funcionaria.
Ele já disse que toda a estrutura de funcionamento do Fed foi desenvolvida para “atender a um desejo de longo prazo da história americana para garantir que o poder sobre nossa política monetária e nosso sistema financeiro não esteja concentrado em poucas mãos, seja em Washington ou nas altas finanças ou em qualquer grupo individual”.
O problema é aguentar o desejo de curto prazo de um presidente que joga pesado. Trump e Powell não são de partidos ou ideias opostos, como Lula e Roberto Campos Neto. Tecnicamente, ambos são republicanos. Foi o próprio Trump quem nomeou Powell para o Fed, em seu primeiro mandato.
Alguns especialistas concordam que Powell está sendo cauteloso demais com a taxa de juros. Mas certamente já tem um lugar no altar dedicado pelas forças da racionalidade aos presidentes de bancos centrais que não cedem a investidas políticas.
Não há espaço nele a Arthur Burns, o presidente do Fed de Nixon. Mesmo tendo sido um economista conservador, professor de nomes como Alan Greenspan e Milton Friedman, ele ficou com a fama indelével de fraco e suscetível a pressões. Também é considerado o segundo pior presidente do Fed entre os quinze homens e uma mulher (Janet Yellen) que já ocuparam o cargo pelo critério de rendimentos do mercado de ações (-5,6%). O mercado não perdoa, mas vai dar uma folguinha. Hoje é feriado nos Estados Unidos e Trump está comemorando a aprovação de seu pacotão de benefícios fiscais, com alguns cortezinhos aqui e ali. Quando passar o foguetório, voltam as pressões.