O governo da Holanda anunciou que devolverá ao Egito uma escultura de 3.500 anos roubada durante o caos da Primavera Árabe, entre 2011 e 2012. A peça, que consiste em uma cabeça esculpida de um membro da corte da dinastia do faraó Tutmés III, foi reconhecida como patrimônio egípcio depois de reaparecer, uma década mais tarde, em uma feira de arte em Maastricht.
A devolução foi confirmada pelo primeiro-ministro interino Dick Schoof durante a cerimônia de inauguração do Grande Museu Egípcio, no Cairo, no último fim de semana. O gesto encerra anos de investigações conduzidas pela Inspetoria de Informação e Patrimônio da Holanda, que concluiu ser “altamente provável” que a escultura tenha sido retirada ilegalmente do Egito.
Segundo autoridades holandesas, o retorno da peça, previsto para ocorrer até o fim do ano, representa não apenas um gesto diplomático, mas também um compromisso com a restituição de bens culturais aos seus legítimos proprietários.
“A escultura é profundamente significativa para a identidade do Egito”, afirmou o governo em comunicado oficial.
Feita em pedra e datada do reinado de Tutmés III (1479 a 1425 a.C.), a escultura retrata um dignitário da corte com feições bem preservadas e traços típicos da arte do Império Novo. O governo holandês confirmou que o artefato será entregue oficialmente ao embaixador do Egito em Haia até o fim do ano.
O caso reacende o debate sobre o tráfico internacional de antiguidades, um mercado bilionário que floresceu com a instabilidade política no Oriente Médio. Durante a Primavera Árabe, entre 2011 e 2013, museus e sítios arqueológicos no Egito, na Líbia e na Síria foram saqueados, e milhares de artefatos acabaram vendidos em galerias e leilões na Europa e nos Estados Unidos. “A Holanda está comprometida, nacional e internacionalmente, em garantir que obras de valor histórico retornem aos seus legítimos proprietários”, reforçou o Ministério da Cultura em nota.
Nos últimos anos, o país já devolveu peças à Nigéria, Indonésia e Sri Lanka, em linha com um movimento global de reparação e devolução de patrimônios culturais a antigas colônias e nações de origem.
A repatriação da escultura coincide com a abertura do Grande Museu Egípcio, o mais ambicioso projeto cultural do Egito. Erguido ao lado das pirâmides de Gizé, o megacomplexo de US$ 1 bilhão abriga mais de 50 mil peças que contam cinco milênios de civilização, dos primeiros faraós à era romana.
Entre as principais atrações está a tumba completa de Tutancâmon, exibida integralmente pela primeira vez desde sua descoberta, em 1922, pelo arqueólogo britânico Howard Carter. São 5 mil artefatos — incluindo o sarcófago dourado, a máscara mortuária e objetos pessoais do “faraó menino” — reunidos em um mesmo espaço.
“O objetivo era recriar a experiência original de Carter, permitindo que o visitante sinta o mesmo deslumbramento de cem anos atrás”, disse o egiptólogo Tarek Tawfik, ex-diretor do museu.
Mais do que um símbolo de orgulho nacional, o novo museu é peça-chave na estratégia do governo para revitalizar o turismo, setor responsável por cerca de 12% do PIB egípcio. Com a inauguração, o país espera dobrar o número de visitantes até 2032.