Após o cessar-fogo com Israel entrar em vigor, na última sexta-feira, o grupo militante palestino Hamas mobilizou suas forças para retomar o controle das ruas de Gaza, enfrentando grupos armados rivais em diferentes partes do enclave palestino e milícias locais acusadas de colaboração com serviços israelenses. Muitas das execuções de rivais foram feitas publicamente, gravadas em vídeo e divulgadas nas redes sociais.
Em meio ao frágil acordo de trégua, a operação busca restaurar a lei e a ordem em áreas onde a presença militar israelense diminuiu.
Segundo o Ministério do Interior palestino, o grupo abriu uma anistia de uma semana para membros de gangues não envolvidos em assassinatos, que podem se apresentar e ter seus antecedentes apagados. Aqueles que não cumprirem a determinação enfrentarão prisão e processos judiciais.
Nos últimos dias, confrontos violentos ocorreram na Cidade de Gaza, incluindo ataques contra membros da poderosa família Doghmush, conhecida por saques a casas e comboios de ajuda humanitária. Entre os mortos estão combatentes de ambos os lados e um jornalista local. Canais ligados ao Hamas divulgaram vídeos mostrando a execução de oito suspeitos, acusados de crimes e colaboração com Israel, o que gerou protestos de organizações de direitos humanos palestinas.
O retorno do Hamas às ruas foi visto por alguns moradores como um passo para restaurar “normalidade e segurança” após dois anos de guerra devastadora. Ainda assim, a presença de grupos armados rivais e milícias apoiadas por Israel, como as Forças Populares de Yasser Abu Shabab, mantém o território em alerta.
O presidente dos EUA, Donald Trump, comentou sobre os confrontos na terça-feira, 14, afirmando que o Hamas “eliminou algumas gangues muito ruins”, mas reiterou que o grupo deve se desarmar completamente, sob risco de ação rápida e violenta por parte de Israel.
Autoridades palestinas e observadores internacionais alertam que o aumento das hostilidades internas pode dificultar o desarmamento do Hamas, previsto no plano de cessar-fogo de 20 pontos proposto por Trump. O grupo afirma estar disposto a entregar armas ofensivas, como foguetes, mas pretende manter armamento leve para se proteger durante a transição de poder.
Hamas desafiado
Na disputa por poder, está Hossam al-Astal, líder de uma milícia alinhada a Israel, que desafiou o Hamas no fim de semana. Em publicação nas redes sociais, ele mandou uma mensagem “a todos os ratos do Hamas”, escrevendo: “Seus túneis foram destruídos, seus direitos não existem mais. Arrependam-se antes que seja tarde demais – não há Hamas a partir de hoje”. Ele está na mira dos combatentes do Hamas, assim como Yasser Abu Shabab, à frente das Forças Populares.
Um oficial de segurança do Hamas disse ao jornal britânico The Guardian que há uma caçada humana contra Abu Shabab, acrescentando que um dos seus assessores havia sido “liquidado” nos últimos dias. A fonte, sob condição de anonimato, também alertou que “a campanha de segurança continua e se intensifica até que essa questão esteja completamente resolvida, e nenhuma parte poderá violar a lei”.
Em comunicado, o Ministério do Interior de Gaza, controlado pelo Hamas desde 2007, disse que os esforços estavam voltados para garantir a “segurança e a estabilidade” no território, mas que “a porta para o arrependimento e a anistia geral” estava aberta para membros de “gangues” que não cometeram assassinatos.
“Todos os indivíduos envolvidos devem se entregar aos serviços de segurança dentro de uma semana para resolver sua situação legal e de segurança e encerrar permanentemente seus arquivos”, advertiu o ministério.
+ Israel abre fogo contra suspeitos em Gaza e autoridades locais dizem que seis morreram
E o desarmamento do Hamas?
Não é provável que os conflitos internos ameacem o cessar-fogo entre Israel e Hamas. Há preocupações, no entanto, de que o aumento das hostilidades crie mais um obstáculo para o desarmamento do grupo radical, previsto no plano de 20 pontos do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. A proposta, aceita pelo primeiro-ministro Benjamin Netanyahu e pelos combatentes na semana passada, não estabelece um cronograma para que os combatentes entreguem as armas — uma ideia rejeitada, a princípio, por eles.
Questionado sobre as disputas entre o Hamas e os rivais por poder em Gaza, Trump ponderou que o grupo estava agindo dentro dos parâmetros do acordo, afirmando: “Eles querem acabar com os problemas e têm sido abertos sobre isso, e nós lhes demos aprovação por um período de tempo… Temos quase 2 milhões de pessoas voltando para prédios que foram demolidos, e muitas coisas ruins podem acontecer. Então, queremos que seja – queremos que seja seguro. Acho que vai ficar tudo bem. Quem sabe ao certo.”