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Getúlio Lula Vargas da Silva

Mais do que a constrangedora foto dos ministros com o boné azul escrito “O Brasil é dos brasileiros”, a reunião ministerial de terça-feira, dia 26, marca a transfiguração do presidente Lula da Silva no mito de Getúlio Vargas. 
 
No seu discurso, Lula leu uma carta de Getúlio Vargas escrita em julho de 1950, quando se preparava para disputar a eleição e voltar ao poder. Após governar com poderes ditatoriais entre 1930 e 1945, Vargas iniciava sua campanha sob forte resistência das elites política, econômica, midiática e militar.  Ao jornalista e professor Miguel Costa Filho, filho do general Miguel Costa, que publicou o texto na Folha da Noite, Vargas disse:
 
“Conheço meu povo e tenho confiança nele. Tenho plena certeza de que serei eleito, mas sei também que, pela segunda vez, não chegarei ao fim de meu governo. Os meus inimigos, que na realidade são mais inimigos do povo e da liberdade do que meus próprios, acusam-me de inúmeras coisas. Não lhes faço caso, porque tenho a consciência tranquila. (…) Eles, os grupos internacionais, não me atacarão de frente, porque não se arriscam a ferir os sentimentos de honra e civismo de nosso povo. Usarão outra tática, mais eficaz. Unir-se-ão com os descontentes daqui de dentro, os eternos inimigos do povo humilde, os que não desejam a valorização do homem assalariado, nem as leis trabalhistas, menos ainda a legislação sobre os lucros extraordinários. Subvencionarão brasileiros inescrupulosos, seduzirão ingênuos e inocentes. E em nome de um falso idealismo e de uma falsa moralização, dizendo atacar sórdido ambiente corrupto, que eles mesmos, de longa data, vem criando, procurarão, atingindo minha pessoa e o meu governo, evitar a libertação nacional e prejudicar a organização do nosso Povo. Terei que lutar. Até onde resistirei? Se não me matarem, até que ponto meus nervos poderão aguentar? Uma coisa lhe digo: Não poderei tolerar humilhações”.
 
Após ler o texto, Lula fez um paralelo do momento atual com o de 75 anos atrás, citou o apoio do governo americano ao bolsonarismo no Brasil, citando nominalmente o deputado federal Eduardo Bolsonaro a favor do tarifaço.

A comparação não é isolada. No ano passado, no aniversário do suicídio do ditador, Lula afirmou que “apenas dois presidentes cuidaram do social: Luiz Inácio Lula da Silva e Getúlio Vargas”.  No início do ano, num evento da Petrobras no Rio Grande do Sul, afirmou: “tem dois momentos na história desse país que o povo pobre foi tratado com dignidade, primeiro com Getúlio, com a CLT, com o salário mínimo e com a Petrobras. Segundo, no meu governo, colocando o pobre no Orçamento da União para que ele tivesse direito de tomar café, almoçar e jantar”.
 
Quando quer reforçar sua experiência, Lula diz com orgulho ser o terceiro homem com mais tempo no poder na história do Brasil, depois do imperador D. Pedro II, que reinou por 58 anos, e Getúlio, presidente por 18. Nos três mandatos, Lula já completou dez anos e oito meses no pode, com a diferença de ter sido eleito todas as vezes. 
 
Ironicamente, Lula começou sua carreira no sindicalismo nos anos 1970 criticando a herança varguista de limitar a criação de sindicatos. Ele chamava a herança sindical de “peleguismo” – e esse foi um dos motivos do seu conflito eterno com Leonel Brizola. 
 
Nos dois primeiros mandatos, Lula mantinha uma distância de Getúlio. Não há, por exemplo um verbete com o nome de Getúlio em “Dicionário Lula”, o excelente catálogo da retórica lulista publicado em 2010. Em 2006, prestes a se lançar à reeleição, Lula imitou a clássica imagem de Getúlio com as mãos sujas de petróleo quando o país chegou à autossuficiência de óleo. No seu discurso, no entanto, preferiu homenagear o escritor Monteiro Lobato como líder da campanha “o petróleo é nosso”.
 
 “Nasci na política criticando Getúlio”, contou o presidente, durante o encontro do PT no início do mês. A conversão de Lula veio com a leitura da monumental trilogia “Getúlio”, do jornalista Lira Neto, enquanto estava preso em Curitiba. “Mas hoje tenho compreensão da importância que Getúlio teve para este país. Após ter sido presidente da República, o melhor foi observar as lutas de Getúlio em sua volta ao governo pelo voto e o enfrentamento com as forças que atuam contra a soberania e o desenvolvimento do país. Muitas dessas forças são as mesmas que atuam hoje contra o Brasil, com o mesmo discurso e as mesmas táticas”.
 
Getúlio e Lula guardam semelhanças evidentes. Líderes carismáticos, ambos combinaram ações efetivas de melhorias nas condições de vida dos mais pobres com o discurso populista contra as elites. Contraditórios, montaram governos com alianças que iam da esquerda à direita. Ortodoxos, agiram com a crença de que o estado é o principal indutor do crescimento econômico. Pragmáticos, usaram a política externa como forma de obter vantagens das potências maiores. 
 
Tanto Getúlio quanto Lula são marcas divisórias na política. O getulismo e o antigetulismo foram os esquadros da polarização até o regime militar. Todas as eleições presidenciais desde 1989 foram, ao fim do dia, uma escolha entre o lulismo e o antipetismo. 
 
Ao escolher Getúlio Vargas como seu ícone, Lula reescreve sua história. Se nos dois primeiros mandatos Lula iniciava nove entre cada dez discursos com a frase “nunca antes na história desse país”, para reforçar o ineditismo de um operário chegar ao Palácio do Planalto, agora ele busca ser o herdeiro da linha política que criou o salário mínimo, o direito a férias remuneradas e a Petrobras e, sob seus governos, se prolongou com o Bolsa Família, as obras do PAC e a isenção do imposto de renda até 5 salários mínimos. O discurso para um quarto governo Lula _ como as promessas do fim da escala 6×1 e ônibus gratuitos aos domingos _ passa ser uma consequência natural desse getúlio-lulismo. A campanha para o quarto mandato será a do “nós”, dos direitos sociais e do Estado grande, contra o “eles”, do ajuste fiscal e do livre mercado.

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