A corrupção infelizmente ainda permanece como um desafio latente no Brasil atualmente. Este tema preocupa fortemente os cidadãos e impacta negativamente a confiança nas instituições, prejudicando que o País siga o caminho da prosperidade com vistas a atingir alto grau de desenvolvimento. Indicadores internacionais, a exemplo do Índice de Percepção da Corrupção da Organização Transparência Internacional, refletem esta realidade, situando o país em uma posição crítica no cenário global. Essa situação evidencia a necessidade contínua por abordagens que sejam não apenas eficazes para controlar a corrupção, mas também sustentáveis a longo prazo.
Essa posição crítica não decorre da falta de tentativas de soluções, mas talvez de uma subestimação da complexidade do problema. A corrupção no Brasil não se manifesta apenas em atos isolados de desonestidade, mas frequentemente como um fenômeno sistêmico com múltiplos aspectos, que vão desde o desvio de recursos públicos e o suborno até práticas clientelistas arraigadas. Um problema com raízes tão diversas e profundas, que mina o desenvolvimento socioeconômico e a consolidação democrática, não pode ser combatido com uma única ferramenta ou lei, ou seja, isoladamente. A complexidade do fenômeno exige respostas igualmente integradas, que abordem suas várias dimensões de forma simultânea.
Historicamente, verifica-se a ocorrência de diversas iniciativas boas, porém notadamente isoladas, tais como: o endurecimento de leis, a criação de órgãos de controle ou a implementação de portais de transparência. Em que pese cada uma dessas ações ter seu valor, a experiência tem mostrado que, quando aplicadas de forma fragmentada, seus resultados podem ser limitados. A transparência, por exemplo, é uma ferramenta essencial, mas a simples disponibilização de um grande volume de dados não garante, por si só, uma mudança efetiva. É a partir desta constatação que surge uma nova perspectiva, fruto de décadas de experiência prática na gestão pública brasileira. A proposta é olhar para o problema de forma integrada, compreendendo que a solução não está na existência de soluções isoladas, mas sim na sinergia de iniciativas classificadas no âmbito de pilares teóricos: transparência fiscal efetiva; instituições democráticas robustas; e engajamento cidadão qualificado.
Assim, não se pode apenas pensar em publicar dados, buscando torná-los compreensíveis e acessíveis para todos os cidadãos. Ademais, os órgãos de controle (como o Judiciário e Legislativo) precisam atuar de forma independente e ser capazes de agir a partir das informações disponíveis. E, por fim, as pessoas devem agir de forma consciente e capaz visando analisar, questionar e cobrar ações, transformando dados em controle social real. Esses três pilares precisam ser complementares e reforçados entre si, de maneira sinérgica. Ou seja, o ponto central desta abordagem é que a defesa de iniciativas isoladas, focadas em apenas um dos pilares, é uma estratégia falha a longo prazo. O pulo do gato aqui está na força da interação dinâmica entre iniciativas presentes em diferentes pilares, pois isto sim cria um ciclo virtuoso e eficaz de forma a solapar a corrupção.
Buscando facilitar tal entendimento, apresenta-se a seguinte situação hipotética: Uma prefeitura, em vez de apenas publicar dados brutos, cria um mapa interativo online onde cada cidadão pode clicar na sua rua e ver detalhes sobre uma obra de recapeamento: o nome da empresa contratada, o valor exato do contrato, o prazo de entrega e um gráfico simples mostrando a divisão dos custos. Utilizando esta ferramenta, um grupo de moradores percebe que o valor pago pelo asfalto está 30% acima da média de mercado consultada em fontes abertas. Com base nestes dados claros, eles elaboram e protocolam uma denúncia formal junto ao Ministério Público. Assim, o Ministério Público, por sua vez, age de forma célere e técnica. Em poucas semanas, aciona o Tribunal de Contas, que suspende o pagamento e abre uma auditoria, evitando o prejuízo aos cofres públicos antes que ele se concretize. Ou seja, dados transparentes geram valores reais quando há cidadãos engajados analisá-los e instituições sólidas para processar as demandas e garantir a responsabilização, isso tudo de forma sistêmica e sinérgica.
Portanto, é a partir desta visão sistêmica, conectando a experiência prática a uma solução teoricamente validada na literatura, que se pode oferecer um caminho pragmático, seguro e fundamentado em evidências científicas. A ideia é mover o foco da simples atuação isolada com iniciativas meritórias, porém de baixo impacto ao longo do tempo para a criação de um verdadeiro ecossistema de integridade, onde o setor público controle a corrupção de forma eficaz e sólida de maneira a gerar confiança e possibilitar o alcance do desenvolvimento sustentável ao longo do tempo. Ao fortalecer de maneira conjunta e interdependente esses três pilares, abre-se um caminho promissor para a construção de uma sociedade mais íntegra e resiliente à corrupção rumo à prosperidade.
Welles Matias de Abreu é pós-doutor em Administração Pública e Governo pela FGV-EAESP, Doutor e Mestre em Administração pela UnB. Analista de Planejamento e Orçamento da Secretaria de Orçamento Federal (SOF) e Professor de Pós-Graduação do IBMEC.