Depois de tomar a cidade de El Fasher, no oeste do Sudão, as Forças de Apoio Rápido (RSF), grupo paramilitar que protagoniza uma guerra civil contra o Exército sudanês desde 2023, foram acusadas de executarem mais de 2 mil civis. De acordo com avaliação de um laboratório da Universidade de Yale, nos Estados Unidos, emitida nesta terça-feira, 28, os assassinatos em massa têm motivações étnicas.
Em um comunicado divulgado nesta terça, as Forças Conjuntas – uma coalizão de grupos rebeldes de Darfur que se aliaram ao Exército sudanês na guerra – acusaram as RSF de terem executado mais de 2 mil civis desarmados nos últimos dias.
Os paramilitares das RSF capturaram a cidade em Darfur na semana passada, assumindo o controle sobre todas as cinco capitais estaduais da região, uma marca significativa na guerra. Após o avanço, ativistas locais divulgaram um vídeo mostrando um combatente, já conhecido por executar civis, atirando à queima-roupa contra um grupo de sudaneses desarmados sentados no chão.
Outras imagens compartilhadas por ativistas pró-democracia mostram o que aparentam ser dezenas de pessoas mortas no chão ao lado de veículos incendiados.
As informações não foram confirmadas por órgãos ou observadores independentes. No entanto, o Laboratório de Pesquisa Humanitária da Universidade de Yale, que monitora o conflito no Sudão usando inteligência de código aberto e imagens de satélite, já havia afirmado na segunda-feira 27 ter encontrado evidências consistentes com supostos assassinatos em massa.
“Limpeza étnica”
Nesta terça, o laboratório de Yale afirmou que El Fasher “parece estar em um processo sistemático e intencional de limpeza étnica das comunidades indígenas não árabes Fur, Zaghawa e Berti, por meio de deslocamento forçado e execução sumária”. Isso incluiu o que pareciam ser “operações de limpeza porta a porta” na cidade, completou o órgão.
As RSF afirmaram no domingo 26 que capturaram a principal base do Exército em El Fasher e divulgou um comunicado dizendo que havia “ampliado o controle sobre a cidade, que estava sob o domínio de mercenários e milícias”.
O chefe do exército sudanês, general Abdel Fattah al-Burhan, afirmou na segunda-feira que suas forças haviam se retirado de El Fasher “para um local mais seguro”, reconhecendo a perda da cidade.
Guerra civil e cerco a El Fasher
O Sudão vive uma sangrenta guerra civil entre o grupo paramilitar RSF e as Forças Armadas desde abril de 2023, fruto de uma disputa de poder entre os dois lados. Mais de 150 mil pessoas foram mortas e pelo menos 14 milhões foram deslocadas devido aos combates. O Exército foi completamente expulso de um terço do território sudanês, algo que, segundo especialistas, levanta a possibilidade do país ser dividido.
Nas últimas semanas, aumentou a preocupação com a segurança de dezenas de milhares de civis sitiados há 18 meses pelas RSF em El Fasher. De acordo com as Nações Unidas, mais de 1 milhão de pessoas fugiram de lá desde o início da guerra e cerca de 260 mil civis, metade deles crianças, permanecem no local, famintos. Muitos precisaram recorrer a ração para animais para se alimentar.
Há sérios temores de uma repetição dos massacres da RSF na capital do estado de Darfur Ocidental, Geneina, após a cidade ser capturada pelos paramilitares em 2023. Na época, cerca de 15 mil civis – a maioria de grupos não árabes – foram assassinados.
O Alto Comissário de Direitos Humanos das Nações Unidas, Volker Türk, declarou na segunda-feira que havia um risco crescente de “violações e atrocidades com motivação étnica” na cidade sudanesa. Seu gabinete afirmou estar “recebendo vários relatos alarmantes de que as Forças de Apoio Rápido estão cometendo atrocidades, incluindo execuções sumárias”.
O Escritório de Direitos Humanos das Nações Unidas afirmou haver relatos de “execuções sumárias de civis que tentavam fugir, com indícios de motivações étnicas para os assassinatos”, bem como vídeos mostrando “dezenas de homens desarmados sendo baleados ou mortos, cercados por combatentes das Forças Revolucionárias da Síria (FSR), que os acusam de serem soldados (do exército sudanês)“. De acordo com a ONU, após a captura de El Fasher no domingo, mais de 26 mil pessoas fugiram de lá, a maioria rumo a Tawila, a 72 km de distância.
Informações de dentro da cidade são difíceis de obter. O Sindicato dos Jornalistas Sudaneses afirmou que as comunicações, incluindo as redes de satélite, foram cortadas na região devido a um apagão.