Os Estados Unidos anunciaram neste domingo, 17, que classificarão o Cartel de los Soles — que, segundo a Casa Branca, é liderado pelo presidente da Venezuela, Nicolás Maduro — como uma Organização Terrorista Estrangeira (FTO, na sigla em inglês). A decisão ocorre em meio à escalada das tensões entre Washington e Caracas, reflexo do envio de tropas americanas ao Caribe e Pacífico em suposto cerco ao narcotráfico.
“O Departamento de Estado pretende designar o Cartel de los Soles como uma Organização Terrorista Estrangeira (FTO)”, escreveu o secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, no X, antigo Twitter. “Liderado pelo ilegítimo Nicolás Maduro, o grupo corrompeu as instituições governamentais da Venezuela e é responsável pela violência terrorista perpetrada por e em conjunto com outras FTOs designadas, bem como pelo tráfico de drogas para os Estados Unidos e a Europa.”
Os EUA acusam Maduro de comandar o cartel e oferecem uma recompensa de US$ 50 milhões por informações que levem à captura do chefe do regime chavista. O presidente da Colômbia, Gustavo Petro, também foi acusado de ser “líder do tráfico de drogas” e “bandido”. No final de outubro, o presidente americano, Donald Trump, revelou que havia autorizado a CIA a conduzir operações secretas dentro da Venezuela, aumentando as especulações de que Washington quer derrubar Maduro. Analistas têm dúvidas, contudo, de que o Cartel de los Soles exista.
“Eles (EUA) sabem que isso não existe”, disse Phil Gunson, analista da ONG Internacional Crisis Group em Caracas, que definiu o cartel “fictício” como “uma forma conveniente de representar” a influência de Maduro no mundo do crime.
“É claro que há pessoas nas forças armadas envolvidas com tráfico de drogas. É claro que o governo permite que o façam e lhes concede impunidade para mantê-los do seu lado. Mas não existe um cartel propriamente dito. Não há organização. Não é como se Maduro estivesse no topo dessa pirâmide organizacional dirigindo o tráfico e dizendo: ‘Enviem cinco toneladas de cocaína para os EUA este mês, isso ajudará a derrubar o governo Trump’”, acrescentou ele ao jornal britânico The Guardian.
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Tensão no Caribe
O maior porta-aviões do mundo, o USS Gerald R. Ford, destróieres com mísseis guiados, caças F-35, um submarino nuclear e cerca de 6.500 soldados foram despachados para o Caribe, enquanto Trump intensifica o jogo de quem pisca primeiro com o governo venezuelano. Em paralelo, intensificam-se os ataques a barcos de Organizações Terroristas Designadas no Caribe e Pacífico, com 83 mortos, em atos considerados “execuções extrajudiciais” pela Organização das Nações Unidas (ONU).
Os incidentes geraram alarme entre alguns juristas e legisladores democratas, que denunciaram os casos como violações do direito internacional. Em contrapartida, Trump argumentou que os EUA já estão envolvidos em uma guerra com grupos narcoterroristas da Venezuela, o que torna os ataques legítimos. Autoridades afirmaram ainda que disparos letais são necessários porque ações tradicionais para prender os tripulantes e apreender as cargas ilícitas falharam em conter o fluxo de narcóticos em direção ao país.
Dados das Nações Unidas enfraquecem o discurso de caça às drogas. O Relatório Mundial sobre Drogas de 2025 indica que o fentanil — principal responsável pelas overdoses nos EUA — tem origem no México, e não na Venezuela, que praticamente não participa da produção ou do contrabando do opioide para o país. O documento também aponta que as drogas mais usadas pelos americanos não têm origem na Venezuela — a cocaína, por exemplo, é consumida por cerca de 2% da população e vem majoritariamente de Colômbia, Bolívia e Peru.
Uma pesquisa Reuters/Ipsos divulgada na última sexta-feira, 14, revelou que apenas 29% dos americanos apoiam o uso das Forças Armadas dos Estados Unidos para matar suspeitos de narcotráfico, sem o devido processo judicial, uma crítica às ações de Trump. Em um sinal de divisão entre os apoiadores do presidente, 27% dos republicanos entrevistados se opuseram à prática, enquanto 58% a apoiaram e o restante não tinha opinião formada. No Partido Democrata, cerca de 75% dos eleitores são contra as operações, e 10% a favor.