A ONG californiana Carbon Plan, em parceria com o Washington Post, divulgou um estudo inédito que projeta um salto dramático no número de dias de calor extremo em Belém até meados do século.
A capital paraense, que hoje enfrenta cerca de 50 dias anuais de calor elevado, poderá chegar a 222 dias perigosamente quentes por ano por volta de 2050 — um aumento de 344%.
O avanço é o maior entre todas as grandes cidades analisadas.
Em escala global, apenas cenários como o de Pekambaru, na Indonésia, se aproximam da gravidade: a cidade deve alcançar 344 dias anuais de calor insalubre, tornando-se o epicentro mundial das altas temperaturas.
Já Phoenix, no Arizona, deve viver um terço do ano acima dos 40°C, enquanto Dubai caminha para cerca de 189 dias de canícula.
As projeções fazem parte de um panorama mais amplo: até 2050, cinco bilhões de pessoas estarão expostas ao menos a um mês de temperaturas potencialmente letais, mais que o dobro do registrado no início dos anos 2000.
A estimativa leva em conta o chamado “bulbo úmido”, indicador que combina temperatura, umidade, radiação solar e vento. Acima de 32°C de bulbo úmido, equivalentes a cerca de 48°C de sensação térmica, mesmo adultos saudáveis podem sofrer superaquecimento em poucos minutos ao ar livre.
Belém, porém, enfrenta fatores adicionais que ampliam o desconforto térmico. Apesar da fama dos túneis verdes formados por mangueiras no centro, a cidade sofre com baixa arborização quando se considera o conjunto da área urbana: são cerca de 2,5 árvores por metro quadrado para cada morador.
É muito abaixo do parâmetro de 9 a 12 defendido pela Organização Mundial da Saúde. O déficit é ainda mais evidente nas periferias, onde o verde rareia e a sensação térmica dispara.
O calor se intensificou nos últimos anos e que até a tradicional chuva da tarde, antes quase certa entre 14h e 16h, deixou de ser frequente.
O estudo reforça a urgência climática que estará no centro das discussões da COP30, em Belém. Entre os temas mais esperados estão adaptação urbana ao calor extremo, financiamento climático para cidades vulneráveis, mecanismos de proteção às populações periféricas e metas mais ambiciosas para conter a escalada das temperaturas nas próximas décadas.
A COP30 pode marcar uma virada de chave entre promessas e a implementação efetiva das metas climáticas. A conferência deve concentrar esforços em mitigar emissões de gases de efeito estufa, ampliar a adaptação aos impactos já em curso.
Especialmente em regiões mais vulneráveis e destravar o financiamento climático para países em desenvolvimento. Também estarão no centro das negociações a proteção de florestas tropicais, oceanos e biodiversidade, além de uma governança climática mais inclusiva.
Como país-sede, o Brasil assume o protagonismo político e técnico da conferência. A Amazônia, especialmente por Belém estar no coração da floresta, ganha centralidade como símbolo e laboratório da ação climática global.
O governo brasileiro defende que o mundo avance menos em novas promessas e mais no cumprimento das metas já assumidas, acelerando a entrada em vigor de medidas concretas.
O país também quer destacar temas próprios, como clima e saúde, sistemas alimentares sustentáveis e combate ao desperdício de alimentos.
Esse papel de liderança, porém, convive com tensões. Projetos de exploração de petróleo na Amazônia e outras contradições da política energética brasileira têm sido apontados por analistas como potenciais fragilizadores da credibilidade do Brasil como referência climática.
A discussão da COP30 dialoga diretamente com o cenário de Belém, que deverá enfrentar um aumento extremo no número de dias de calor perigoso nas próximas décadas.
A cidade é exemplo das urgências que a conferência pretende enfrentar: adaptação urbana, financiamento para infraestrutura em regiões vulneráveis e políticas de proteção da floresta que atuem também sobre o microclima urbano.
Os resultados do encontro terão impacto direto sobre a capacidade de Belém, e de outras cidades tropicais, de responder ao avanço do calor extremo.