O sucesso estrondoso de Tremembé, série inspirada no livro de Ullisses Campbell sobre o “presídio dos famosos”, reacendeu um debate incômodo: até que ponto o true crime pode transformar tragédias reais em espetáculo? Com trilha sonora típica de comédias e cenas de fetiche e violência, a produção da Prime Video flerta com o absurdo ao tornar crimes que chocaram o país – como os de Suzane von Richthofen e Elize Matsunaga – em entretenimento pop.
O autor, no entanto, nega qualquer tentativa de suavizar os assassinos. “As pessoas continuam vivendo, trabalhando, fazendo sexo… Eles cometeram crimes, mas continuam humanos, por incrível que isso possa parecer. O que faz as pessoas ficarem chocadas é descobrirem que eles vivem romances, que se apaixonam. Eu digo que são humanizados e não romantizados”, defende Campbell, em conversa com a coluna GENTE.
Um dos pontos mais polêmicos é a representação de Daniel Cravinhos, vivido por Felipe Simas, cujo arrependimento interpretado beira ao vitimismo. “O arco do Daniel é baseado nos laudos psicológicos que usei para o livro. Ele tem uma culpa enorme por ter envolvido o irmão num crime que era dele”, pontua o escritor. Vale lembrar que Daniel e o irmão, Cristian Cravinhos, mataram a pauladas os pais de Suzane, Manfred e Marísia von Richthofen.
Apesar de sustentar sua narrativa, Ullisses reconhece os limites éticos ao revisitar a dor das famílias. Ao comentar a recusa de Ana Carolina Oliveira, mãe de Isabella Nardoni, em assistir à série, ele admite: “Tenho muito respeito por ela. Não somos amigos, mas temos uma relação cordial. Entendo completamente a decisão. Se eu fosse parente de uma vítima, também não assistiria. Mexe com lugares delicados”. Ainda assim, o autor defende a proposta de Tremembé com convicção: “Levei para a sala de roteiro o compromisso com a verdade. Embora seja ficção, a série também é documental. Os diálogos mais comentados são exatamente como aconteceram. É um híbrido e talvez por isso seja tão perturbadora”, conclui.