O leitor tem um sentimento de vergonha quando lê certas manifestações, especialmente dos apologistas do amor que se deixam devorar pelo ódio? Não está sozinho. A política americana, obviamente predominante também sobre países menos influentes, vive momentos de surto além até do padrão tristemente normalizado. Vejamos o que disse o governador de Illinois, JB Pritzker, enfurecido com Donald Trump pelo envio de tropas da Guarda Nacional a Chicago: “Este é um homem que está sofrendo de demência”.
“Este é um homem que tem alguma coisa enfiada na cabeça. Não consegue tirar isso da cabeça. Ele não lê. Ele não sabe nada atualizado. É só alguma coisa no recesso de seu cérebro”.
É, obviamente, uma linguagem imprópria e constrangedora – mesmo que Pritzker, da bilionária família dona da rede de hotéis Wyatt, tenha o hábito dos muito ricos de falar o que lhe vem à cabeça.
Trump, obviamente, sofre do mesmo destempero verbal e disse que o governador, além do prefeito de Chicago, Brandon Johnson, deveriam ser presos por não darem proteção a agentes da imigração, serviço conhecido como ICE, no exercício de suas funções. O prefeito rapidamente sacou a carta racial da manga: “Não é a primeira vez que Trump tenta prender um homem negro injustamente”.
FILHO MORTO NOS BRAÇOS
Outro político negro, Jay Jones, chocou até mesmo os mais cínicos observadores políticos com declarações que fez a respeito de um adversário na política estadual de Virgínia. O adversário, Todd Gilbert, presidente do legislativo estadual, havia elogiado um democrata centrista recentemente falecido. Bastou para Jones, candidato a procurador-geral, um cargo eletivo nos estados americanos, sugerir via mensagem a uma interlocutora que, se tivesse um revólver com duas balas e estivesse diante de Gilbert, Hitler e Pol Pot, dispararia ambas contra a cabeça do presidente da Câmara.
A interlocutora, uma delegada partidária republicana, ficou chocada com a violência simplesmente inacreditável, ainda mais à sombra do recente assassinato com um tiro na garganta de Charlie Kirk. Jones então ligou para “explicar” e foi mais adiante ainda: disse que gostaria de ver a mulher de Gilbert chorando com um filho morto nos braços, para que sofresse como os pais de crianças mortas por atiradores.
É difícil imaginar que Jay Jones, um homem altamente instruído que já foi deputado estadual, filho de juízes e neto de professores universitários, continue com sua candidatura depois dessas atrocidades. Mas desejar a morte de adversários da maneira mais hedionda não está tão fora do espectro assim. Até na cultura popular, um filme como Uma Batalha Depois da Outra, com Leonardo DiCaprio, glorifica assassinatos, desde que praticados contra os fascistas maus que estão no governo.
A realidade pode ser mais surreal ainda: o líder direitista britânico Nigel Farage está processando um imigrante clandestino afegão, Fayaz Khan, que fez postagens com ameaças, gestos imitando armas com as mãos e barulhos onomatopeicos de tiros. Detalhe: Khan tem um fuzil AK-47 tatuado no rosto e também é influencer.
VÍRUS DA VIOLÊNCIA
É o tipo de caso que reforça o nível desesperador de rejeição à imigração descontrolada que assola a Grã-Bretanha. Este é o principal motivo do quase inacreditável avanço de Farage nas pesquisas, superando largamente os dois partidos tradicionais, o Trabalhista, atualmente um fiasco no poder, e o Conservador. O sucesso, obviamente, torna Farage uma das pessoas mais vulneráveis do mundo – momento escolhido pelo governo trabalhista para diminuir seu esquema de segurança,
A imigração ilegal também alimentou a reeleição de Trump e agora está provocando situações perigosas de conflito em cidades governadas por democratas, como Chicago.
Num mundo político em que um agente racional e qualificado como Jay Jones defende reiteradamente que seu modesto adversário bateria Hitler e Pol Pot como candidato a levar duas balas na cabeça, os valores mais básicos da convivência civilizada não apenas são ameaçados, mas funcionam como baliza para indicar que todos devem condenar atrocidades assim nem nenhuma conjunção adversativa.
É o nosso futuro como sociedade que está em jogo. O governador Pritzker pode até receber aplausos de correligionários por dizer que Trump está com demência, mas é o vírus da violência política que envenena a todos. Um assassinato como o de Charlie Kirk tetricamente “normaliza”que o mesmo aconteça à esquerda do espectro político – e aí estamos todos lascados.
Será que a esplêndida oportunidade do acordo de paz em Gaza poderia desarmar espíritos também nos Estados Unidos? Será este o momento fugaz em que pode haver uma guinada? Quem esperar algo assim é garantidamente um candidato à frustração. Os adversários de Trump estão com mais raiva ainda porque ele obteve um sucesso formidável – e ele, claro, responde à altura.