Preso preventivamente nesta terça-feira, 16, o desembargador Macário Ramos Judice Neto, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, foi alvo da segunda fase da Operação Unha e Carne, que apura o vazamento de informações sigilosas ao crime organizado. A ação é desdobramento do inquérito, relatado no Supremo Tribunal Federal pelo ministro Alexandre de Moraes, que prendeu ainda o presidente da Assembleia do Rio, Rodrigo Bacellar (União). Com histórico de afastamentos e acusações na carreira, Macário Neto chegou a ser aposentado de maneira compulsória no TRF-2, acusado de envolvimento com caça-níqueis no Espírito Santo, seu estado de origem. A punição, contudo, foi depois suspensa pelo Conselho Nacional de Justiça.
A prisão desta terça coloca o magistrado no centro de uma enredada investigação, que tem origem na prisão do deputado estadual do Rio Thiego Raimundo dos Santos, o TH Joias. Preso acusado de ligação com o Comando Vermelho, o parlamentar foi alvo de operação da Polícia Federal em setembro deste ano. Quando os agentes chegaram em seu endereço, contudo, ele não estava mais lá. TH Joias foi detido pouco depois, em meio a suspeitas de que ele teria sido avisado da ida dos agentes ao seu endereço.
Já no início de dezembro, foi a vez do presidente da Assembleia do Rio, Rodrigo Bacellar (União), virar alvo da PF. Ele foi preso acusado de vazar informações a TH Joias sobre a operação de setembro, após determinação de Moraes. Depois de votação na Alerj que decidiu pelo relaxamento de sua prisão, Bacellar foi solto, mas é monitorado com tornozeleira eletrônica e tem de cumprir uma série de medidas cautelares. Ele também pediu uma licença de seu mandato na Alerj.
Macário Ramos Judice Neto, por sua vez, foi designado como o relator do processo de TH Joias no TRF-2. E, diante de sua prisão nesta terça, ele passa também a integrar o rol de investigados pelo vazamento de informações ao crime organizado, tema do inquérito conduzido no STF por Alexandre de Moraes. Um dos endereços das buscas cumpridas pela PF, inclusive, está no Espírito Santo, estado de origem do desembargador.
Currículo polêmico
Acusado em 2005 pelo Ministério Público Federal de participar de um esquema de venda de sentenças e favorecimento ao jogo do bicho e máquinas caça-níqueis no Espírito Santo, Macário permaneceu afastado de suas funções por quase 18 anos. Por consequência dessa denúncia, na época o magistrado também foi alvo de um processo administrativo disciplinar (PAD) na Justiça Federal, o que contribuiu para que permanecesse tanto tempo sem atuar.
Em 2022, tal inquérito foi revogado por decisão do Conselho Nacional de Justiça. Na época, o colegiado entendeu por maioria de votos que o prazo para análise do processo disciplinar aberto contra ele havia sido extrapolado. Em maio de 2023, ele conseguiu nova decisão favorável no próprio TRF-2, permitindo que voltasse à titularidade como juiz federal na 3ª Vara Federal Cível de Vitória.
A promoção ao cargo de desembargador federal veio pouco depois. No mês de junho de 2023, Macário Neto tomou posse no Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) por ser o mais antigo na lista de magistrados federais que atuavam na jurisdição, que engloba os estados do Rio e do Espírito Santo. “Venho para somar e multiplicar; nunca para diminuir ou dividir”, afirmou, na cerimônia.
Nascido em 21/1/1966, em Cachoeiro de Itapemirim, sul do Espírito Santo, o magistrado graduou-se em Direito pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Foi aprovado no II Concurso do TRF da 2ª Região para o cargo de juiz federal substituto e sua nomeação ocorreu em 26/3/1993.
Conexões na Alerj
Incluído no mesmo inquérito que o presidente da Alerj, Macário Neto é casado com Flávia Ferraço Lopes Judice. Ela trabalhou em um cargo comissionado na diretoria-geral da Assembleia durante dois anos e meio.
Flávia Judice ficou no cargo de 26 de abril de 2023 a 1º de novembro de 2025, com salário líquido de 8.231,31 reais. A hipótese investigada pela Polícia Federal é a de que o desembargador do TRF2 teria antecipado a Bacellar que TH Joias seria alvo de uma operação policial antes de sua deflagração, e o então presidente da Alerj teria repassado a informação ao ex-colega.
O próprio Bacellar sofreu novas buscas nesta terça, inclusive em um endereço na Avenida Atlântica, na orla de Copacabana, que não era conhecido inicialmente. A operação desta terça foi autorizada pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF.
Defesa
Em manifestação enviada ao ministro Alexandre de Moraes, a defesa de Macário Neto afirmou não ter recebido cópia da decisão que decretou a prisão do desembargador. “Tal proceder viola frontalmente os princípios constitucionais do contraditório, da ampla defesa e da publicidade dos atos processuais, que norteiam processo penal”, diz o documento. Os advogados Fernando Augusto Fernandes e Guilherme Lobo Marchioni solicitaram ainda acesso aos autos do processo.
A defesa sustenta ainda que nada foi encontrado nas buscas e apreensões nos endereços relativos ao desembargador, que está neste momento na sede da Polícia Federal. E que irá encaminhar ao ministro Alexandre de Moraes o pedido de soltura de Macário Neto, assim que tiver acesso à decisão.
O processo que investiga TH Joias no TRF-2 será redistribuído.