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De notícias e não notícias faz-se a crônica

A frase que dá título a esse texto veio de uma coletânea de Carlos Drummond de Andrade, lançada em 1974, a partir das produções em prosa do poeta mineiro no Jornal do Brasil. De notícias & Não Notícias Faz-se a Crônica – não poderia haver definição mais precisa, em tom jornalístico e a leve ironia do “e” comercial a costurar as duas pontas. A crônica brasileira, que viveu o apogeu nos anos 1970 e 1980, andou um pouco sufocada – talvez tenha sido atropelada pela velocidade do mundo imposta pelas redes sociais, ingloriamente trocada por tuítes de poucas letras.

Ela precisa renascer, e de algum modo tem renascido, a meio caminho entre romances pesadões e o nada imposto pelo tatibitate da internet. Uma crônica é hoje como um aceno para o português bem escrito, a ideia bem pensada, como quem pega a mão do cidadão e diz: “venha, vamos ler”. Não é fácil rabiscá-la, porque já sempre o risco de ficar vazia ou piegas. Mas quando dá certo, que beleza. É o caso do magnífico acabou, mas continua, do jornalista e escritor Luis Cosme Pinto, de 63 anos, carioca de Vila Isabela hoje radicado em São Paulo. O livro é uma seleção de 25 crônicas engraçadas e líricas, emocionantes e concisas – parecem ter nascido para virar roteiro de filme ou série de televisão, a realidade vista por uma lupa delicada, que vê o que ninguém vê.

O jornalista e escritor Humberto Werneck, autor de Viagem no País da Crônica (Editora Tinta-da-China Brasil) vai direto ao ponto, ou quase, porque não há como ir direto quando se trata de definir uma modalidade de literatura que sai por aí rindo e chorando sem estilo, ou com todos os estilos. “O abrasileiramento do folhetim francês haveria de se consumar a partir da década de 1930, com Rubem Braga. O gênero nunca mais seria o mesmo. ‘Rubem Braga lançou o grito da Ipiranga e a crônica se libertou´, creditou Paulo Mendes Campos em entrevista a Beatriz Marinho para O Estado de S. Paulo, em 1985. ‘Assumiu sua condição de mãe solteira e desaparafusa, tornando-se um pretexto literário, amplo, rico e difuso’. Mas que diabo, afinal, vem ser a crônica. ‘Se não é aguda, é crônica’, esquivou-se o Braga certa vez que alguém lhe perguntou.”

Luis Cosme Pinto é filho dileto dessa turma precursora. Lê-lo é uma delícia e privilégio, saber que nem tudo é efêmero como um storie de Instragram que no dia seguinte vai-se embora para nunca mais.

Eis algumas pequenas joias (agudas) extraídas do olhar atento, de elegante prosa, do autor em acabou, mas continua:

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Da cabeça aos pés: “A pose é a de um time de futebol de salão, três de pé com o peito estufado e uma dupla sentada na frente. É fácil ver as mudanças que os mais de quarenta anos trouxeram nos cabelos, nas cinturas, nos olhares. Porém, um detalhe, talvez sem importância, cutuca minha memória. Um deles está de sandália havaiana. Eu conheço aquele pé. Aliás, conheço todos os pés da foto”.

De rabo a cabo: “Aprendi a ler jornal com meu pai. Edgar abria as páginas e traduzia as manchetes:

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Inflação quer dizer que os preços subiram e o dinheiro de hoje vale menos que o de ontem.

Imposto é aquilo que ninguém gosta de pagar.

Transamazônica é a estrada que vai cortar a maior floresta do mundo.

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A vida é melhor para quem lê jornal, dizia convicto.”

acabou, mas continua será lançado nesta terça-feira, 14 de outubro, a partir das 17h30, na Livraria da Vila, nos Jardins, em São Paulo, na alameda Lorena, 1501

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