A pressão por eficiência no setor de logística e entregas é enorme. A equação é simples: se uma empresa consegue transportar uma carga em menos tempo e por um custo menor que as rivais, não há por que o consumidor fazer outra escolha. Nas regiões mais rentáveis do país, essa empresa quase nunca é os Correios. A estatal tem um longo histórico de má gestão e de incapacidade de inovar para se adaptar diante da evolução do mercado. Mas em nenhum outro momento esses problemas foram tão evidentes quanto no atual governo. No primeiro semestre deste ano, os Correios registraram um prejuízo de 4,4 bilhões de reais. Em comparação, no ano de 2024 inteiro o resultado negativo foi de 2,6 bilhões de reais. A empresa é a responsável pela maior parte do déficit de 18,5 bilhões de reais registrado pelas estatais federais desde o início do terceiro mandato de Lula (o dado não inclui Petrobras e bancos públicos). Nunca antes na história deste país as estatais foram tão mal geridas.
A lista de empresas públicas mais deficitárias é comumente composta por aquelas cuja operação já pressupõe uma ajuda do Estado. São as chamadas “dependentes” do Tesouro. Os Correios, mesmo não fazendo parte desse grupo — era de esperar que suas receitas garantissem uma autossuficiência —, figuram em primeiro lugar no ranking (veja o quadro). Diante do abismo, a direção da empresa agora negocia um empréstimo de cerca de 20 bilhões de reais em condições camaradas junto ao Tesouro Nacional, ou seja, tendo os pagadores de impostos como fiadores. Como Emmanoel Rondon, que assumiu o cargo de presidente da estatal de entregas há pouco mais de um mês, não apresentou nenhum plano com uma reformulação no modelo de negócios para tornar a empresa rentável, é alto o risco de que os recursos pedidos venham a escorrer pelo ralo. “Tudo indica que estão enxugando gelo ou protelando uma crise ainda mais grave”, diz Diogo Carneiro, consultor e professor da Fipecafi, faculdade em São Paulo que é referência nacional em ciências contábeis.
O que impede os Correios e outras estatais de serem geridas de forma eficiente é o fato de que, para os governos do PT, elas servem antes de mais nada como uma engrenagem da máquina político-eleitoral do partido. Desde o início do terceiro mandato de Lula, foram criados quase 300 novos cargos de indicação política nas estatais federais. Para isso, o governo contou com uma providência do atual ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, quando integrava o Supremo Tribunal Federal (STF). Em março de 2023, ele suspendeu restrições na nomeação de apadrinhados previstas na Lei de Estatais. O STF, em decisão colegiada, só derrubou a liminar de Lewandowski mais de um ano depois. O objetivo de Lula era usar a distribuição de cargos para agraciar grupos que o apoiaram nas eleições e conseguir sustentação no Congresso. O presidente dos Correios antes de Rondon, por exemplo, era Fabiano Silva, membro do Prerrogativas, grupo de advogados ligado a Lula.

Entre as estatais que mais sofrem com a farra dos cargos está a usina binacional de Itaipu. Quatro ministros de Estado e uma secretária nacional do PT compõem o conselho de administração de Itaipu, com remuneração de quase 34 000 reais para participar de uma única reunião a cada dois meses. Rui Costa, da Casa Civil, Fernando Haddad, da Fazenda, Alexandre Silveira, de Minas e Energia, e Esther Dweck, da Gestão, são os ministros na folha da usina. “A razão é puramente política, sabe-se muito bem disso”, disse a VEJA um ex-diretor-geral de Itaipu. Ele alerta para a negligência com a operação: “Desprovidos de tempo para se dedicar de maneira apropriada, eles podem chegar na reunião sem as informações necessárias para tomar decisões embasadas”.

Menos mau se as indicações políticas tivessem como norte colocar profissionais com indiscutível capacidade de gestão em posições-chave nas estatais e com autonomia para realizar um bom trabalho. Ocorre que, mesmo quando têm qualificação técnica, os nomeados esbarram na necessidade de atender a um dos aspectos mais nefastos da instrumentalização político-eleitoral das estatais: a ideia de que elas devem servir como indutoras de desenvolvimento e promoção de justiça social, não importando se isso as desvia de sua atuação central. A Petrobras, a maior empresa do país, está justamente vivendo esse dilema — pela enésima vez. A presidente da estatal de capital misto, Magda Chambriard, tem tentado convencer o governo da necessidade de reduzir os investimentos nos próximos anos. Com uma queda acentuada do preço do petróleo desde janeiro, está cada vez mais difícil bancar os 111 bilhões de reais em aportes planejados até 2029. Se fosse uma empresa privada, a decisão seria óbvia: colocar o pé no freio em face da nova realidade do mercado. “O potencial de financiamento do plano está em risco, mas cortar seria muito difícil politicamente”, disse a VEJA um conselheiro da Petrobras. Na cúpula da empresa, já há quem considere provável a manutenção do plano às custas de um aumento do endividamento e, portanto, da credibilidade da companhia. Outra opção seria a redução dos dividendos aos acionistas, o que culminaria no mesmo problema.
Sob o guarda-chuva do governo federal estão 44 empresas estatais de controle direto e outras 78 subsidiárias. Não faltam casos de companhias mais conhecidas por ingerências políticas, troca de favores e politicagem do que pelo serviço que prestam à sociedade. Foi decepcionante — mas nada surpreendente — que uma das primeiras ações de Lula, imediatamente após sua posse, em 2023, tenha sido retirar sete empresas do Programa Nacional de Desestatização, entre as quais os Correios. Está mais do que evidente que a estatal tem trazido ônus demais à sociedade e que privatizá-la seria o melhor caminho. “Poderia ser feito o mesmo que ocorreu com o saneamento em São Paulo, ou seja, uma privatização vinculada a metas de universalização do acesso ao serviço”, diz Sérgio Lazzarini, professor do Insper e autor do livro A Privatização Certa. O custo da gestão petista das estatais foi dado quando o presidente dos Correios pediu o socorro de 20 bilhões de reais ao Tesouro. Não é justo que a população pague mais essa conta.
Colaborou Luana Zanobia
Publicado em VEJA de 24 de outubro de 2025, edição nº 2967
