A crise diplomática entre China e Japão não deu sinais de arrefecimento nesta terça-feira, 18, após Tóquio lançar um alerta para seus cidadãos em solo chinês e Pequim desaconselhar viagens ao território japonês. As duas maiores economias da Ásia vêm escalando uma guerra verbal desde que a recém-empossada primeira-ministra do Japão, Sanae Takaichi, fez comentários explosivos sobre Taiwan, a ilha democrática que a China reivindica como sua.
No início deste mês, Takaichi provocou o mais sério conflito diplomático em anos com Pequim ao declarar que, perante o Parlamento, se um ataque chinês a Taiwan ameaçar o Japão, isso pode desencadear uma resposta militar de seu país.
De acordo com o porta-voz do governo japonês, Minoru Kihara, um alto funcionário do governo Takaichi se reuniu com diplomatas em Pequim nesta terça para tentar amenizar a tensão, mas sem avanços iminentes. O Ministério das Relações Exteriores da China afirmou ter exigido que a premiê se retratasse durante a reunião, mas Kihara descartou a possibilidade.
Os comentários “não alteraram a posição atual do governo”, disse ele em coletiva de imprensa, acrescentando que o governo espera que as questões relativas a Taiwan sejam resolvidas pacificamente por meio do diálogo.
A China reivindica o território taiwanês como seu e não descartou o uso da força para assumir o controle da ilha. Taipei rejeita as reivindicações de Pequim.
Escalada
Na semana passada, uma diplomata chinesa no Japão respondeu às declarações de Takaichi sobre Taian publicando um comentário ameaçador direcionado a ela nas redes sociais. Isso gerou forte repreensão de Tóquio, enquanto a mídia estatal chinesa passou a circular matérias virulentas contra a premiê do país vizinho.
Takaichi invocou os “demônios militaristas” do Japão, disse a agência de notícias oficial Xinhua nesta terça-feira.
Em resposta, a embaixada do Japão em Pequim fez um alerta de segurança aos cidadãos, na segunda-feira, afirmando que devem respeitar os costumes locais enquanto estiverem em solo chinês e tomar cuidado ao interagir com locais. A orientação é que viajantes estejam atentos ao seu entorno quando estiverem ao ar livre, não fiquem sozinhos e tenham cautela extra ao acompanhar crianças.
“Se você vir uma pessoa ou grupo que pareça minimamente suspeito, não se aproxime e saia da área imediatamente”, disse a embaixada.
A cúpula do G20 desta semana na África do Sul poderia ajudar a aliviar a tensão, mas a China já disse que seu primeiro-ministro não tinha planos de se encontrar com Takaichi. Ela, por sua vez, disse que nada foi decidido sobre reuniões bilaterais durante a cúpula, mas reiterou que o Japão permanece aberto a manter “vários diálogos” com Pequim.
Impacto econômico
A China, por sua vez, desaconselhou viagens ao Japão. Mais de 10 companhias aéreas chinesas, como Air China, China Eastern Airlines e China Southern Airlines, ofereceram reembolsos para voos com destino ao Japão até 31 de dezembro, enquanto a Sichuan Airlines cancelou os planos para a rota Chengdu-Sapporo até pelo menos março, informou a mídia estatal.
Isso pode prejudicar a economia japonesa. Os chineses representam a maior parcela de turistas estrangeiros por lá — quase um quarto do total, segundo dados oficiais. As ações de empresas japonesas ligadas ao turismo despencaram com a notícia.
Distribuidoras também suspenderam a exibição de pelo menos dois filmes japoneses na China, a animação “Crayon Shin-chan the Movie: Super Hot! Scorching Kasukabe Dancers” e o filme baseado no mangá “Cells at Work!“, uma medida que a emissora estatal CCTV elogiou na segunda-feira como “prudente”.
Além do turismo, o Japão depende da China para o fornecimento de minerais críticos usados em itens que vão de eletrônicos a automóveis.
“Se dependermos demais de um país que recorre à coerção econômica no momento em que algo o desagrada, isso cria riscos não apenas para as cadeias de suprimentos, mas também para o turismo”, disse a ministra da Segurança Econômica do Japão, Kimi Onoda, em uma coletiva nesta terça. “Precisamos reconhecer que é perigoso sermos economicamente dependentes de um lugar que apresenta tais riscos”, acrescentou.
O ministro do Comércio do Japão, Ryosei Akazawa, disse que ainda não houve mudanças significativas nas medidas de controle de exportação da China sobre terras raras e outros materiais. Os chefes das três federações empresariais japonesas se reuniram com Takaichi na segunda-feira e pediram diálogo para resolver a tensão diplomática. “A estabilidade política é um pré-requisito para o intercâmbio econômico”, disse a repórteres Yoshinobu Tsutsui, presidente da Keidanren, a maior associação empresarial do país.
Tensão
Taiwan está localizada a pouco mais de 110 km do território japonês e as águas ao seu redor são rota marítima vital para o comércio de Tóquio. O Japão também abriga o maior contingente militar dos Estados Unidos no exterior.
No domingo, navios da Guarda Costeira chinesa navegaram pelas águas ao redor de um grupo de ilhas do Mar da China Oriental controladas pelo Japão, mas reivindicadas pela China. Embora Washington não reconheça o arquipélago como parte do território japonês, seriam obrigados pelo tratado de segurança Japão-EUA, de 2014, a defender a região no caso de ataque.