A deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) foi presa nesta terça-feira, 29, em Roma, na Itália, e poderá ser extraditada ao Brasil para cumprir a pena de dez anos de prisão a que foi condenada pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal por financiar o hacker Walter Delgatti Neto para que ele invadisse os sistemas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e tentasse provar a vulnerabilidade do sistema judicila brasileiro.
A decisão foi tomada pelo STF no dia 19 de maio, mais de dois anos após VEJA revelar detalhes da criminosa parceria entre a parlamentar e o programador. Além da prisão, Zambelli foi sentenciada à perda do mandato parlamentar, medida que ainda precisa ser referendado pela Câmara dos Deputados. Já Delgatti, que ficou célebre por ter divulgado conversas em aplicativos de mensagens entre integrantes da Operação Lava-Jato, no episódio que ficou conhecido como ‘Vaza-Jato”, foi sentenciado a oito anos e três meses de cadeia.
No dia 4 de junho, após a informação de que Zambelli havia saído do país, o ministro Alexandre de Moraes determinou a sua prisão imediata e a inclusão do seu nome na lista vermelha da Interpol, a polícia internacional. Pouco mais de uma semana depois, o magistrado rejeitou os últimos recursos da parlamentar, que considerou apenas protelatórios, e declarou o caso transitado em julgado — a decisão foi referendada pela Primeira Turma.
O crime pelo qual Zambelli foi condenada por revelado em matéria publicada em 6 de fevereiro de 2023 por VEJA. Nela, o próprio Delgatti relatou ao repórter Reynaldo Turollo Jr. que Zambelli o havia procurado em 2022, antes das eleições presidenciais, e questionado se conseguiria detectar falhas de segurança nas urnas eletrônicas. Segundo o hacker, a parlamentar articulou reuniões entre a dupla e o então presidente Jair Bolsonaro para discutir a possibilidade de violar os dispositivos e usar as brechas para invalidar o resultado eleitoral, caso o capitão fosse derrotado.
Veja parte da conversa do hacker com a reportagem:
Ao menos dois encontros entre Zambelli, Delgatti e Bolsonaro ocorreram naquele ano. O primeiro deles, realizado em agosto, também foi revelado com exclusividade por VEJA, que flagrou o hacker entrando e saindo do Palácio do Alvorada, em Brasília. A segunda reunião ocorreu em setembro, também no Alvorada — segundo Delgatti, o presidente lhe teria pedido que assumisse a autoria de um grampo ilegal que seria implantado nas comunicações do ministro Alexandre de Moraes, do STF, à época presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
‘Publique-se e faz o L’
Outro episódio também mostrou à época que o hacker esteve todo o tempo a serviço do bolsonarismo golpista. No início de janeiro de 2023, veículos de imprensa noticiaram que alguém entrou nos sistemas do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e expediu um falso mandado de prisão assinado por Moraes contra ele mesmo. “Sem me explicar, porque sou como um deus do Olimpo, defiro a petição inicial. […] Publique-se, intime-se e faz o L”, dizia a falsa ordem de prisão introduzida por Delgatti no sistema do CNJ. O texto também fazia menções a uma “vontade extraordinária de ver Lula na presidência” e afirmações como “o Estado somente EU”.
Em depoimento à Polícia Federal, Delgatti assumiu que foi dele a ideia de implantar o mandado falso como forma de demonstrar a fragilidade da segurança cibernética do Judiciário. O hacker, porém, declarou que recebeu o texto pronto de Zambelli e limitou-se a fazer “algumas correções gramaticais”.