Os primeiros eventos ligados à COP 30, em Belém, foram marcados por um clima de alívio e euforia. As previsões pessimistas sobre a infraestrutura da cidade e a logística do evento ficaram para trás. Segundo o colunista Robson Bonin, de Radar, o Pará “entregou o que prometeu” e conseguiu organizar o maior evento climático do planeta “sem fiasco e com forte simbolismo político”.
“A cidade virou a capital do mundo climático, com delegações de todos os continentes. Isso já dá a Lula dividendos importantes, porque ele transformou Belém em vitrine do Brasil ambiental”, avaliou Bonin, no programa Os Três Poderes, da VEJA.
O colunista destacou que, antes mesmo das negociações começarem, o presidente já colheu ganhos políticos internos e externos por sediar a conferência no coração da Amazônia.
O desafio de sustentar dois discursos
A fala de Lula, no entanto, trouxe uma contradição: o presidente defendeu o fim dos combustíveis fósseis, mas o Ibama acabou de liberar a exploração de petróleo na Margem Equatorial, uma das fronteiras mais sensíveis da Amazônia.
“O governo tenta equilibrar o discurso ambiental com as necessidades econômicas. O Brasil quer se afirmar como potência ecológica, mas não pode abrir mão do petróleo, que é uma fonte essencial de receita”, explicou José Benedito da Silva.
Segundo ele, o Planalto aposta em um argumento pragmático: usar os lucros do petróleo para financiar a transição energética. “O problema é convencer o mundo de que isso é coerente”, ponderou.
Amazônia pobre, floresta ameaçada
Para José Benedito, o governo também tenta vincular a pauta ambiental a um discurso de desenvolvimento social. Ele lembrou que 29 milhões de brasileiros vivem na Amazônia, região com baixos índices de renda e altos índices de violência.
“Sem oportunidades econômicas, a população fica vulnerável à criminalidade e à exploração predatória. O petróleo é visto por governadores da região como chance de reverter esse quadro”, disse.
Bonin complementou: “O simbolismo é enorme, mas a COP é famosa por produzir mais declarações do que resultados. O governo precisa transformar discurso em entregas concretas”.
O “bode na sala” da política ambiental
A decisão de explorar petróleo em plena conferência ambiental é, segundo os comentaristas, o “bode na sala” da COP brasileira. O contraste entre a retórica ecológica e a prática econômica deve marcar as próximas semanas do evento.
“Enquanto o governo tenta se vender como mediador global, vai ser cobrado pela contradição interna. É um discurso de transição, mas também de sobrevivência política e fiscal”, avaliou José Benedito.
Para Bonin, o saldo inicial é positivo, mas o desafio de Lula é manter o protagonismo sem se perder entre o idealismo climático e o pragmatismo econômico.
“A COP começou bem para o governo. Belém funcionou, o Brasil virou vitrine. Mas, no fundo, o dilema é simples: o país quer liderar o debate sobre o futuro do planeta — enquanto continua tirando petróleo da terra”, concluiu.