Nem mesmo um resultado um pouco acima das expectativas mudou o cenário projetado pelos especialistas. Freada pelos juros altos, a economia brasileira entrou em rota de desaceleração. Diversos indicadores já vinham sinalizando a perda de fôlego, agora confirmada pelos dados do Produto Interno Bruto (PIB) do segundo trimestre. De abril a junho, a atividade econômica avançou apenas 0,4% em relação aos três meses anteriores, bem menos que o crescimento de 1,3% registrado no primeiro trimestre. A maioria dos analistas estimava expansão de 0,2% ou 0,3%, mas a surpresa levemente positiva não mudou o fato de que o ritmo de crescimento foi reduzido a menos da metade. Em relação ao mesmo período do ano passado, o PIB subiu 2,2%, o resultado mais baixo desde 2022.
A perda de vigor da economia traz, ao mesmo tempo, uma boa e uma má notícia. Pelo lado positivo, ganha força o quadro de um “pouso suave”, expressão usada pelos economistas para descrever o fim de um ciclo de crescimento sem a ocorrência de uma recessão brusca, mas sim de uma acomodação gradual. Na prática, significa que as vendas podem perder intensidade e que empresas adiem investimentos e planos de expansão, mas não há sinais de uma onda de demissões ou de forte queda na renda. “As vendas não vão bombar, mas devem apenas crescer menos nos próximos meses”, afirma Juedir Teixeira, presidente do conselho de varejo da Associação Comercial do Rio de Janeiro. Para a maioria dos economistas, o PIB deve avançar perto de 2% neste ano e em torno de 1,8% em 2026.

A má notícia é que o Brasil retorna ao padrão de crescimento fraco ao qual se acostumou – e, ressalte-se, muito abaixo do necessário para superar suas deficiências históricas. “O país não enfrenta seus problemas estruturais e não consegue crescer acima de 2% sem gerar desequilíbrios”, afirma José Ronaldo Souza, sócio da Leme Consultores e pesquisador da produtividade brasileira. “Para nos tornarmos uma nação desenvolvida, precisaríamos crescer bem mais, mas não avançamos e, na comparação internacional, estamos ficando para trás.” Os números confirmam essa percepção. Projeções do Fundo Monetário Internacional indicam expansão de 3% para o PIB global neste e no próximo ano e de 4% para os países emergentes. Nesse cenário, portanto, voltamos a figurar entre os países de desempenho mais baixo.
Os sinais de que a economia força um crescimento acima de sua capacidade – e, portanto, insustentável – estão cada vez mais nítidos. O primeiro deles é a inflação, que se mantém em torno de 5%, ainda distante da meta oficial de 3%. Outro alerta vem das contas externas, que mostram o quanto o país precisa importar para suprir sua demanda. O resultado é o pior em uma década: o déficit em transações correntes mais do que dobrou em um ano e alcançou 75 bilhões de dólares nos 12 meses até julho. Trata-se de um rombo equivalente a 3,5% do PIB e a maior proporção desde 2015. Esses desequilíbrios pressionam o Comitê de Política Monetária do Banco Central a elevar os juros, seja para conter a alta dos preços, seja para evitar uma crise cambial.
O desfecho dessa equação é a Selic estacionada em 15% ao ano, um nível que funciona como um freio de mão para qualquer economia. “Os setores mais dependentes de crédito sofrem mais e, desta vez, os sinais de desaceleração estão bem mais evidentes do que em outros períodos recentes”, afirma Gabriel Couto, economista do banco Santander. A indústria de transformação, a construção e os investimentos em capital fixo, como maquinário e infraestrutura, são frentes que já apareceram com o sinal negativo no PIB do segundo trimestre. As vendas do varejo, acompanhadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, estão em queda há três meses, enquanto a inadimplência bate recorde: 78 milhões de brasileiros – quase metade da população adulta – têm ao menos uma conta em atraso, segundo o birô Serasa Experian.
A situação só não se agrava de forma generalizada porque, em contrapartida, a renda das famílias – por ora – continua em alta. Ela é sustentada tanto pelos gastos públicos, que se expandiram desde a pandemia, quanto por um mercado de trabalho surpreendentemente resiliente, com a taxa de desemprego em mínimas históricas e sem sinais de cortes significativos no horizonte. “O mercado de trabalho brasileiro está passando por mudanças estruturais que o tornaram mais flexível e ajudam a manter o desemprego baixo”, afirma Bruno Imaizumi, economista da consultoria 4intelligence. Entre essas mudanças, ele cita a reforma trabalhista de 2017 e o avanço das atividades autônomas ligadas a aplicativos, que vêm garantindo ocupação a uma parcela crescente da população.
Do lado fiscal, os estímulos recentes incluem a ampliação do Bolsa Família, os reajustes acima da média para o salário mínimo e a criação de um novo crédito consignado para trabalhadores formais. Essas medidas elevam os gastos públicos, complicam a missão do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de equilibrar as contas e, ao mesmo tempo, pressionam o consumo em uma economia já perto do limite da oferta. “O crescimento veio de estímulos fiscais à demanda, mas sem avanço significativo na capacidade produtiva ou na produtividade”, diz José Ronaldo Souza, da Leme Consultores. O resultado é uma conta pesada: dívida pública em alta, mais impostos para financiá-la, juros elevados para conter a inflação e, agora, uma taxa de crescimento em desaceleração. Não há pouso suave que torne esse quadro positivo.