No maior berçário de quelônios de água doce do mundo, localizado no Vale do Guaporé, na fronteira entre Rondônia e a Bolívia, as primeiras contagens da temporada de 2025 indicam um retorno de filhotes após a forte redução registrada no ano anterior.
Segundo dados preliminares do Ibama, entre os dias 11 e 15 de dezembro foram contabilizados cerca de 60 mil filhotes de tartarugas‑da‑Amazônia e outras espécies que surgiram dos ninhos sob monitoramento ambiental.
A contagem inicial representa um cenário mais promissor em comparação com 2024, quando o número de nascimentos despencou; estimativas internacionais sugerem uma redução de até 50% em relação a anos anteriores, atribuída às mudanças climáticas que alteraram o ciclo reprodutivo e inundaram ou secaram áreas de desova tradicional.
Autoridades ambientais preveem que o pico de eclosão ocorra nas próximas semanas, com o período de nascimento se estendendo até o fim de dezembro e o início de janeiro.
Ao término das observações, o Ibama e parceiros devem consolidar os dados e divulgar uma estimativa mais completa do total de filhotes nascidos na extensa faixa de praias que compõem o berçário.
Impacto das mudanças climáticas
Técnicos envolvidos no Programa Quelônios do Guaporé informam que a desova deste ano começou com atraso de cerca de duas semanas, em parte por causa de chuvas intensas e baixas temperaturas registradas em outubro, quando o Rio Guaporé ainda não havia recuado o suficiente para expor as praias arenosas necessárias à postura dos ovos.
Especialistas alertam que episódios extremos de chuva e seca, ambos associados à crise climática, têm alterado o regime hidrológico da região, dificultando a sincronização do ciclo reprodutivo das tartarugas com as janelas ideais de desova.
Relatórios de conservação registram que essas variações prolongadas no nível dos rios e no padrão de chuvas alteram tanto a disponibilidade de praias quanto a temperatura da areia, um fator crítico para o desenvolvimento dos embriões.
Esforço de conservação e ameaças históricas
O Programa Quelônios do Guaporé, coordenado pelo Ibama em parceria com a Associação Quilombola e Ecológica do Vale do Guaporé (Ecovale) e apoiadores privados como o Grupo Energisa, tem mais de uma década de atuação contínua.
O objetivo é elevar a taxa de sobrevivência das espécies ameaçadas pela caça predatória e pelo consumo de ovos e carne, que nos anos 1990 quase levou algumas populações à beira da extinção.
O trabalho envolve monitoramento comunitário das praias, resgate de ovos em áreas de risco e soltura assistida dos filhotes no rio, além de ações de educação ambiental junto às comunidades ribeirinhas.
Nos últimos anos, iniciativas de ciência colaborativa e uso de tecnologia, como rastreamento por satélite e drones para contar ninhos e indivíduos, também têm sido ampliadas para aprimorar o monitoramento da espécie.
Desafios continuam
Apesar das boas notícias iniciais, pesquisadores ressaltam que nem todos os filhotes sobreviverão até a fase adulta, um componente natural da dinâmica ecológica desses quelônios, e que a continuidade de eventos climáticos extremos pode continuar a exercer pressão sobre a reprodução.
O trabalho de contagem e monitoramento deve seguir até o início de janeiro, quando o Ibama e seus parceiros deverão divulgar um balanço consolidado da temporada.