O planeta ultrapassou o primeiro grande ponto de inflexão climática: o colapso generalizado dos recifes de corais de águas tropicais já está em curso.
O alerta vem do Relatório Global sobre Pontos de Inflexão Climática, coordenado pela Universidade de Exeter e divulgado nesta segunda-feira (13), às vésperas da COP30, que será realizada no Brasil em 2026.
Segundo o estudo, os ecossistemas de coral, essenciais para a alimentação e o sustento de cerca de um bilhão de pessoas, caminham para um declínio irreversível, mesmo que o aquecimento global seja estabilizado em 1,5°C acima dos níveis pré-industriais.
“Entramos em uma nova realidade planetária”, resume o documento. Ele estima que mais de 99% dos recifes tropicais podem desaparecer se a temperatura média não recuar em direção a 1°C.
Assinado por 160 cientistas de 87 instituições em 23 países, o relatório adverte que a humanidade está “perigosamente próxima” de acionar outros pontos de colapso do sistema terrestre, como o derretimento das calotas polares, o colapso das principais correntes oceânicas e o declínio acelerado da Floresta Amazônica.
“Estamos nos aproximando rapidamente de múltiplos pontos de inflexão que podem transformar o planeta, com consequências devastadoras para pessoas e ecossistemas”, afirmou o professor Tim Lenton, diretor do Instituto de Sistemas Globais de Exeter.
“Isso exige ação imediata e sem precedentes dos líderes na COP30.”
Nos últimos dois anos, mais de 80% dos recifes do planeta foram atingidos pelo pior episódio de branqueamento de corais já registrado — fenômeno causado pelo estresse térmico dos oceanos, que faz com que os corais percam suas cores e morram.
Outros limites à vista
O estudo alerta que outros pontos de virada podem ser atingidos entre 1,5°C e 2°C de aquecimento global, incluindo o colapso da Amazônia e o derretimento acelerado das calotas polares.
Os autores afirmam que os atuais sistemas de governança internacional não estão preparados para lidar com mudanças abruptas e irreversíveis, pedindo cortes imediatos de emissões, remoção em larga escala de carbono e o incentivo a “pontos de inflexão positivos” — como a adoção em massa de tecnologias limpas.
Apesar do diagnóstico sombrio, o relatório também aponta sinais de esperança.
Fontes renováveis como solar e eólica, veículos elétricos e armazenamento em baterias já ultrapassaram seus próprios pontos de virada e avançam por força de mercado. Políticas coordenadas que integrem energia limpa e transporte sustentável poderiam gerar “efeitos cascata positivos” no sistema global.
“Que os recifes de águas quentes estejam ultrapassando seu limite térmico é uma tragédia para a natureza e para os povos que dependem deles”, disse Mike Barrett, diretor científico do WWF e coautor do relatório.
“Se não agirmos agora, perderemos também a Amazônia, as geleiras e as correntes oceânicas.”
Amazônia em risco e mudanças nos oceanos
Os cientistas alertam que o limiar de colapso da Amazônia pode ser ainda mais baixo do que o estimado — possivelmente a partir de 1,5°C de aquecimento global. Mais de 100 milhões de pessoas dependem da floresta, e seu futuro pode depender de “pontos de inflexão sociais positivos”, como o fortalecimento da governança indígena e a recuperação de áreas degradadas.
Outra preocupação é o enfraquecimento da Circulação Meridional do Atlântico (AMOC) — sistema de correntes que regula o clima global. Seu colapso, abaixo de 2°C, poderia interromper monções na África e na Ásia, mergulhar a Europa em uma nova era glacial e ameaçar a segurança alimentar mundial.
Modelos indicam que, nesse cenário, o mar do Norte voltaria a congelar, Londres teria três meses de inverno por ano e Edimburgo poderia registrar temperaturas de -30°C — enquanto o verão traria ondas de calor extremas.
Cada fração de grau importa
O relatório reforça que limitar o excesso de aquecimento acima de 1,5°C nos próximos anos é essencial. Cada décimo de grau e cada ano além desse limite aumentam os riscos de mudanças irreversíveis.
Em 2024, a temperatura média global atingiu 1,5°C, com tendência de longo prazo de 1,4°C — tornando quase inevitável a superação desse patamar ainda nesta década.
Para Manjana Milkoreit, da Universidade de Oslo, os pontos de inflexão “exigem reformas institucionais e novas abordagens de governança”.
“Prevenir esses colapsos requer mitigação antecipada, que minimize o pico de aquecimento e o tempo acima de 1,5°C”, afirmou.
Já o brasileiro André Corrêa do Lago, presidente designado da COP30, disse que o relatório traz “uma mensagem ao mesmo tempo sóbria e esperançosa: ainda é possível mudar o rumo e construir um futuro seguro, próspero e justo”.
“O mundo precisa agora inverter sua trajetória, de enfrentar riscos existenciais para aproveitar as oportunidades dos pontos de inflexão positivos”, concluiu o professor Lenton.