O governo da China anunciou um novo conjunto de regras que passa a proibir o compartilhamento de material classificado como “obsceno” até mesmo em mensagens privadas na internet. A medida pode atingir práticas consensuais como o sexting — o envio de mensagens, fotos ou vídeos de teor sexual por celular, redes sociais ou outros meios digitais — e amplia o controle estatal sobre a vida online no país.
Embora o alvo declarado da revisão seja o combate à disseminação de pornografia e de imagens exploratórias, sobretudo aquelas que envolvem menores de idade, especialistas alertam que a redação das normas permite interpretações amplas. Na prática, isso pode abrir espaço para que trocas íntimas consensuais entre adultos também sejam enquadradas como infração.
As regras entram em vigor em 1º de janeiro e reforçam punições já previstas na legislação chinesa. Segundo as autoridades, a atualização transforma o tema não apenas em uma questão legal, mas também de “moralidade”, em sintonia com a política do Partido Comunista Chinês de impor padrões rígidos de comportamento no ambiente digital. As restrições se aplicam a plataformas amplamente utilizadas no país, como o WeChat, e estabelecem atenção especial a casos envolvendo crianças e adolescentes.
A pornografia é ilegal na China há décadas, mas o governo afirma que a revisão busca fechar “lacunas regulatórias” diante das novas formas de circulação de conteúdo sexual online. Com as mudanças, as penalidades passam a incluir detenções de até 15 dias e multas de até 5.000 yuans (cerca de 700 dólares), valor superior ao teto anterior.
O endurecimento ocorre após uma série de episódios que expuseram a circulação de imagens íntimas sem consentimento. Em julho, a imprensa estatal revelou a existência de um grupo no Telegram chamado MaskPark, no qual mais de 100.000 usuários, em sua maioria homens chineses, compartilhavam fotos explícitas de mulheres obtidas clandestinamente, muitas vezes por meio de câmeras escondidas. O caso provocou indignação nas redes sociais e reacendeu o debate sobre o machismo estrutural na sociedade chinesa.
Apesar do discurso oficial de proteção, ativistas pelos direitos das mulheres enfrentam repressão crescente no país. Sob o comando do presidente Xi Jinping, o governo intensificou o cerco a movimentos feministas, com prisões de ativistas e restrições à atuação de organizações civis. Atualmente, não há nenhuma mulher entre os 23 integrantes do Politburo do Partido Comunista Chinês.
A reação às novas regras foi dividida nas redes sociais. Enquanto parte dos usuários apoia o combate a abusos e crimes sexuais online, outros criticam a ampliação da vigilância estatal sobre conversas privadas e ironizam o contraste entre a repressão a interações íntimas e as campanhas oficiais para estimular casamentos e elevar a taxa de natalidade, hoje em queda no país.